quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Ec 3.1-7 Tempo



Introdução:

Dizem que há tempo para tudo na vida. Se esta afirmação é verdadeira chego à conclusão de que sou único desajustado na vida. Para mim, ao contrário dos outros mortais, meu tempo simplesmente desaparece. Acordo de manhã com uma agenda de coisas para fazer e termino o dia com outra relação de "to do list", completamente cheia, para o dia seguinte. Faz muito tempo que não sei o que é acordar e dizer: "hoje eu não tenho nada para fazer".
O texto bíblico afirma: "Há tempo para todo propósito debaixo do céu". O que isto significa?
Antes de mais nada, é bom observar que o texto não diz que há tempo para tudo, e sim, que há tempo para todo propósito. Em outras palavras: "Se há propósito há tempo". Qual é o propósito da minha vida? Meu tempo será focado nesta direção.

Este texto nos ensina algumas lições:

1. Precisamos discernir o tempo - Aprender a lidar sabiamente com o tempo. Por isto o salmista afirma: "Ensina-nos a contar nossos dias de tal maneira que alcancemos corações sábios". Paulo também afirma: "Remindo o tempo porque os dias são maus".
Tempo é uma moeda cara e rara. Existem pessoas com o tempo tão escasso que tem mais facilidade para doar dinheiro que algumas horas para um projeto social, ou para alguma atividade filantrópica.
Lee Yacocca, que conseguiu reabilitar a falida chrisler corporation afirma que o homem bem sucedido, que não consegue tempo para si, para descansar e fazer as coisas para seu prazer, na verdade é um homem fracassado. Ele mesmo, apesar de uma agenda cheia, organizava sua agenda para encerrar seu expediente na sexta feira as 18 hs, ir para casa, sem trabalhar e sem ligar seu celular para falar com clientes.
Gordon MacDonald, num excelente livro "ponha em ordem seu mudo interior" afirma que fazer e planejar a agenda com antecedência, ajuda a orientar a ação, caso contrário, pessoas fortes do seu círculo de relacionamento, tenderão a fazer agenda e programa para você.
Certo pastor foi procurado por uma senhora que precisava de aconselhamento, porque seu casamento estava em crise. Ele disse que não podia atendê-la, porque tinha um compromisso naquela noite. Ele não disse o que era, mas tratava-se de uma agenda que fizera com sua esposa de ir ao cinema. Então, como combinado, foi para o shopping, e lá, encontrou aquela mulher que, surpresa lhe disse: "O senhor não disse que tinha um compromisso hoje?" E ele respondeu: "De fato, tinha assumido um compromisso de que levaria minha esposa ao cinema e aqui estamos". Muitas pessoas não consideram importante uma agenda com o filho, familiares, esposas e amigos, se você não organizar sua agenda, outros o farão por você.

2. O texto não diz, tempo para tudo, mas tempo para todo propósito. O que significa isto?
Muitas pessoas dizem: "Não te liguei porque nao tive tempo". Ora, todos sabemos que uma ligação não deixa de ser feita por ausência de tempo, mas porque outras coisas mais importantes, assumiram aquele lugar.

Considere o seguinte:

Se você estiver no final de uma defesa de tese, quando o tempo esta para lá de escasso, e encontrar a namorada pela qual você espera a vida inteira, você vai ou não vai abrir espaço na sua agenda para entrar em contato com ela? E se tiver um “negócio da China?”, uma grande oportunidade financeira? Você acredita que não vai encontrar tempo? Mesmo que sacrifique seu sono ou seu lazer, mas o fará, porque um propósito maior foi encontrado...
Quando dizemos que não temos tempo para ir a igreja, orar, ler a Bíblia, buscara a Deus, na verdade estamos dizendo que estas coisas, estão sendo obscurecidas por propósitos maiores e prioritários em nossa agenda..
Quando a Bíblia fala de propósitos, está se referindo ao foco que é dado. Coloque-o, portanto, no lugar certo. Qual é o seu propósito?
Um conhecido pastor, convidado para conferencias e cuja agenda sempre foi lotada, certo dia conheceu aquela que seria a sua futura esposa. Ele havia sido convidado para pregar na igreja daquela cidade e não aceitou porque não podia assumir mais compromissos, mas por ter começado a namorar aquela garota, naquele ano, mesmo com a agenda lotada, pregou 7 vezes naquela cidade.

3. Este texto de Eclesiastes 3, também nos ensina que os tempos mudam, as estações refletem diferentes tonalidades, e que precisamos a aprender a lidar com tais situações. Há tempo de plantar, tempo de colher; tempo de abraçar, e tempo de afastar-se; tempo de nascer e tempo de morrer... Em outras palavras, a vida tem altos e baixos.
Perdas fazem parte do crescimento... Existe tempo de celebração, e tempo de luto.
Leonardo Boff, no seu excelente artigo, "sobre lutos e perdas", relata a dolorosa experiência de perder uma irmã, com aneurisma, aos 34 anos de idade, dando aulas para alunos do ensino médio. A tragédia atingiu sua família em cheio, mas estando com  a agenda muito cheia de compromissos, resolveu continuar sua vida no mesmo ritmo de atividades, mas depois deste incidente começou a ter desmaios, sem qualquer razão aparente, até que um médico amigo lhe disse que ele não tivera tempo para o luto.
Por esta razão, Jesus fala sobre não andarmos ansiosos por cousa alguma. Existem diferentes estações na vida. Não devemos nos assustar com os dias maus, mas entendermos que existem dias em que vamos ganhar, outros que vamos perder. "Qual de vós, por ansioso que esteja pode acrescentar um côvado ao curso de sua vida?" Há tempo de plantar e tempo de arrancar o que se plantou.
Certa fábrica inglesa de casacos coloca na sua etiqueta uma filosofia de vida da companhia: "Estamos há 120 anos no mercado, já experimentamos de tudo, ganhamos muito dinheiro e estivemos à beira da falência por duas vezes, passamos por duas grandes guerras e enfrentamos a Grande depressão econômica de 1929-1932. Se vocês perguntarem porque ainda estamos no mercado diremos que não podemos  perder o próximo capitulo.

4. Prioridades corretas multiplicam nosso tempo - Se há tempo para todo "propósito", precisamos estabelecer prioridades para alcançá-los. A palavra chave é foco.
Gordon MacDonald afirma que tempo não planejado perde-se no universo de pessoas de tem influência sobre nós. Em outras palavras, se você não faz sua agenda, outras pessoas farão...
Nesta semana, recebi a visita de um jovem empresário no meu escritório. Um dos problemas mais sérios dele é procrastinação. Ele tende a deixar para última hora, e atrasa sempre seu calendário. O resultado é cobrança, descrédito, desconfiança, ineficiência e perda preciosa de tempo e recursos. Ele viu na minha mesa uma estratégia que tenho adotado desde que aprendi com um colega de trabalho quando ainda estava nos Estados Unidos. Ele fazia um "to do list", e todos os dias ele buscava resolver cada um destes itens. Se não conseguisse, passava para o dia seguinte. Este empresário, então, resolveu adotar a mesma estratégia, e o resultado estava sendo, segundo sua avaliação, impressionante. O simples fato de fazer uma lista o ajudava agora a perseguir seus alvos de forma mais eficiente.
Por não termos foco, perdemos facilmente metas e propósitos. Eu tenho defendido uma tese bastante controvertida, de que pastores deveriam trabalhar apenas 44 horas, e assim seriam mais eficientes. Mas durante este tempo eles teriam que estar no escritório da igreja, sem abrir internet, para estudar a bíblia, orar, fazer ligações para os membros de sua igreja e preparar estudos e sermões. Certo tempo deveria ser destinado a visitação e atividades externas.  O simples fato de ter um tempo para o foco que se deseja, orienta melhor a agenda e nos faz pessoas mais eficientes nas metas. Nossa avaliação deveria ser feita não em termos de tempo, mas em termos de resultados. Isto mudaria sensivelmente nossas atividades.
Obviamente serei criticado por ser pragmático, e sei que também existem variáveis bem complexas para avaliar, mas certamente tal reflexão poderia ser muito positiva para nós e para o reino de Deus.

Ec 3.16-4.3 Inquietações


 

Introdução:

 

Meu filho tinha apenas 14 anos quando resolveu namorar uma garota que não temia a Deus, mas era uma das mais bonitas de sua sala. Quando tentamos explicar que porque ele não deveria levar adiante tal relacionamento, ele ficou revoltado e disse: “It’s not fair!” (não é justo!) E passou a defender seu ponto de vista dizendo que Deus não poderia fazer isto, afinal, se ele não podia namorar uma garota por quem estava se sentindo atraído, porque Deus então havia permitido este sentimento?

A reação de meu filho reflete muito bem outras inquietações muito maiores e desafiadoras.

Como lidar com grandes tensões filosóficas que mexem com nossa mente?

Você nunca se sentiu perplexo quando teve que lidar com grandes questões que pareciam não ter respostas lógicas?

 

O texto abaixo, do Pr. Ricardo Gondim, parece tocar nesta questão:

Quem Deus ouviu primeiro?
Ricardo Gondim

No domingo, 26 de dezembro, cantamos Noite Feliz, Noite de Paz. A igreja lotada com cerca de duas mil pessoas, se comovia com o coral de homens e mulheres sorridentes, vestidos de batas prateadas. Celebramos uma autêntica noite de paz. Um holofote de luz azulada se refletia nas roupas colorindo todo o ambiente de uma penumbra bucólica. Apesar do verão em nosso hemisfério, um frio tímido e gostoso nos envolvia, dando a falsa impressão de um natal europeu. Em pé, cantamos que Deus é supremo e afirmamos, de olhos úmidos, que não há outro além do Senhor.

Naquele mesmo momento, na Ásia, os primeiros raios da madrugada da segunda-feira, dia 27, iluminavam o rosto inchado de crianças boiando em charcos de lama. O domingo terminara sem nenhum coral perfilado e sem cultos em nenhuma igreja. Só ressoavam gritos de mulheres, milhares delas, que mesmo acostumadas à miséria, nunca aprenderam a aceitar a morte. Na Índia, Sri Lanka, Tailândia, Indonésia, não houve noite de paz e ninguém “dormiu em derredor”.

Deus ouvia quem? Nosso culto intimista ou o caos asiático? Ele conseguia se manter atento à nossa gratidão pela mesa farta que devoramos dois dias antes, ou se curvava ao clamor dos órfãos do tsunami? Deus percebeu nossos olhos comovidos pelo presépio improvisado por nossos filhos ou atentava ao choro da viúva solitária? Será que o Senhor considerou ridículo o sermão do pastor que naquele momento prometia, um ano novo de prosperidade e que o Todo Poderoso cumpriria os desejos de um auditório egocêntrico? Será que Deus pode ser tão perfeito que consiga separar tão perfeitamente momentos simultâneos?

Não consigo dormir faz três dias. Permaneço em estado de choque pelo que vi. Não esqueço aquela cena das pessoas num ponto de ônibus, agarradas umas às outras, gritando desesperadas por um socorro que não veio. Chorei quando a televisão mostrou o desespero de um pai desmaiado por haver presenciado o resgate do corpo de seu filho de um monturo de lixo. Não me considero um exemplo de sensibilidade, e nem minha empatia pela sorte dos desvalidos serve de modelo para a humanidade. Se eu que sou mau, não consigo continuar impassível diante de cenas tão chocantes, Deus conseguiria?

Admito que esses meus questionamentos não ajudam a dar respostas sobre uma teodicéia convincente. Sei o que os filósofos e teólogos perguntam: “Se Deus é onipotente e bom, como pôde acontecer tamanha tragédia? Se Ele é onipotente e nada fez, resta-nos pensar que não é bom. Se é bom e não tomou nenhuma iniciativa, temos que deduzir que não é onipotente”.

Alguns respondem que na sua providência eterna, Ele sabe o que faz e que seus “atos divinos” não podem ser argüidos por nós, meros vasos de desonra; Deus dá vida e mata quem quiser. Confesso que já tentei, mas cheguei à conclusão que não há nenhuma força persuasiva no universo que me convença desses argumentos. Não aceito que Deus, para alcançar seu propósito, produza um sofrimento brutal em tanta gente miserável, que não pediu para nascer na beira de uma praia paupérrima. Outros argumentam que Deus não pode ser responsabilizado por um holocausto, pelos simples fato de que não foi Ele quem colocou as pessoas pobres naquela situação de extrema miséria. Esses afirmam que embora Deus já soubesse todos os desdobramentos do terremoto, não fez nada, porque queria manifestar sua glória a um mundo rebelde. Será que a glória de Deus custa tão caro? Meu coração continua insatisfeito.

Acredito que diante duma tragédia dessa magnitude precisamos repensar alguns conceitos teológicos. Por exemplo: o que significa a palavra Soberania; o que se entende por Onipotência? Conceitos como esses significam o quê dentro dos paradigmas das ciências sociais pós-modernas? Será que não estamos insistindo em ler as Escrituras com as mesmas lentes dos medievais? Não projetamos para a Divindade as mesmas idéias que eles nutriam sobre seus reis déspotas?

Estou convencido que a teologia clássica não responde mais às indagações que nascem diante de eventos fortuitos que matam indiscriminadamente; sequer consegue lidar com a aleatoriedade quântica ou com os movimentos despropositais da natureza. Sinto que a mensagem evangélica utilitária e geradora de sentimentos ensimesmados, perdeu seu sentido, mesmo tendo dominado o cristianismo ocidental por séculos.

Admito que não há respostas fáceis. Eu não saberia como consolar os parentes das mais de sessenta mil pessoas mortas – um terço eram crianças. Porém, estou certo que precisamos rever os alicerces em que montávamos nosso edifício teológico.

Hoje sei que Deus não nos criou com o intuito de micro gerenciar todos os nossos atos. Ele não queria que formássemos sistemas religiosos em que O responsabilizaríamos por triunfos e tragédias humanas. Precisamos tomar cuidado quando afirmamos: Deus é amor! O que essa frase significa em relação à Sua ausência misteriosa? Quais as últimas implicações do Seu desejo de se relacionar com a humanidade? A não-onipotência de Jesus Cristo é semelhante à não-onipotência de Jeová?

Só uma réstia da revelação brilha em minha alma: o Deus da Bíblia soberanamente criou o universo, mas ao formar mulheres e homens, abriu mão de sua Soberania para estabelecer relacionamentos verdadeiros. Ele não se despojou de sua natureza onipotente, que por definição não podia fazer, mas se esvaziou de suas prerrogativas divinas – evidenciadas em Jesus Cristo.

Não, Ele não pôde evitar a catástrofe asiática. Assim, sinto que a morte de milhares de pessoas, machucou infinitamente mais o coração de Deus do que o meu – o sofrimento é proporcional ao amor. O pouco que conheço sobre Deus e sobre seu caráter me indica que há muitas lágrimas no céu.

Mas Deus podia e pode se fazer presente no meio da tragédia. Ele podia ter evitado muitas mortes, se déssemos ouvidos aos seus princípios e verdades e a humanidade usasse o dinheiro gasto em armas e bombas para viver num mundo mais justo. Bastava que um sistema de alarme, construído pelos homens, tivesse soado e muitas vidas teriam sido poupadas. Agora, o rosto de Deus se evidenciará nos pés e nas mãos de cada voluntário que acudir aos que choram.

Continuo perplexo diante de tudo o que nos sobreveio e sem todas repostas, mas espero que minhas intuições estejam me conduzindo no rumo certo.

Soli Deo Gloria

 

Certamente a questão da soberania de Deus tornou-se um ponto de tensão para o autor. A resposta do teísmo aberto ou da teologia relacional, parece resolver algumas coisas, mas trata-se de um equívoco. No entanto, muitas questões e inquietações estão sempre tangenciando áreas de nossa vida, e para as quais não encontramos respostas. Uma pessoa que havia perdido seu namorado num grave acidente de carro, no qual 4 jovens da mesma idade morreram, me perguntou porque, e eu não quis tentar resolver. Não há respostas fáceis em tais situações. Neste caso apenas a abracei e disse: “Eu não sei responder, mas quero participar de sua dor...”

 

O autor de Eclesiastes suscita três questões:

 

  1. A vida não parece ter coerência – “Vi ainda debaixo do sol que no lugar do juízo reinava a maldade e no lugar da justiça, maldade ainda” (Ec 3.16). Para o autor, a vida parecia não seguir um sequenciamento lógico. O mesmo sentimento vemos em outros autores bíblicos:

 

    1. Jó – leia atentamente a forma como Jó lida no meio da sua dor. Algumas questões simplesmente não faziam sentido para o seu coração. “Olhai para mim e pasmai; e ponde a mão sobre a boca; porque só de pensar nisso me perturbo, e um calafrio se apodera de toda a minha carne. Como é, pois, que vivem os perversos, envelhecem e ainda se tornam mais poderosos? Seus filhos se estabelecem na sua presença; e os seus descendentes, ante seus olhos. As suas casas têm paz, sem temor, e a vara de Deus não os fustiga. O seu touro gera e não falha, suas novilhas têm a cria e não abortam. Deixam correr suas crianças, como a um rebanho, e seus filhos saltam de alegria; cantam com tamboril e harpa e alegram-se ao som da flauta. Passam eles os seus dias em prosperidade e em paz descem à sepultura. E são estes os que disseram a Deus: Retira-te de nós! Não desejamos conhecer os teus caminhos. Que é o Todo-Poderoso, para que nós o sirvamos? E que nos aproveitará que lhe façamos orações? (Jó 21.6-15).

 

    1. Asafe- Este músico cristão, também enfrenta enormes tensões na sua vida. Veja o seu desabafo: “Com efeito, Deus é bom para com Israel, para com os de coração limpo. Quanto a mim, porém, quase me resvalaram os pés; pouco faltou para que se desviassem os meus passos. Pois eu invejava os arrogantes, ao ver a prosperidade dos perversos. Para eles não há preocupações, o seu corpo é sadio e nédio. Não partilham das canseiras dos mortais, nem são afligidos como os outros homens. Daí, a soberba que os cinge como um colar, e a violência que os envolve como manto. Os olhos saltam-lhes da gordura; do coração brotam-lhes fantasias. Motejam e falam maliciosamente; da opressão falam com altivez. Contra os céus desandam a boca, e a sua língua percorre a terra. Por isso, o seu povo se volta para eles e os tem por fonte de que bebe a largos sorvos. E diz: Como sabe Deus? Acaso, há conhecimento no Altíssimo? Eis que são estes os ímpios; e, sempre tranqüilos, aumentam suas riquezas. Com efeito, inutilmente conservei puro o coração e lavei as mãos na inocência. Pois de contínuo sou afligido e cada manhã, castigado. Se eu pensara em falar tais palavras, já aí teria traído a geração de teus filhos. Em só refletir para compreender isso, achei mui pesada tarefa para mim; até que entrei no santuário de Deus e atinei com o fim deles. Tu certamente os pões em lugares escorregadios e os fazes cair na destruição. Como ficam de súbito assolados, totalmente aniquilados de terror! Como ao sonho, quando se acorda, assim, ó Senhor, ao despertares, desprezarás a imagem deles. Quando o coração se me amargou e as entranhas se me comoveram, eu estava embrutecido e ignorante; era como um irracional à tua presença” (Sl 73.1-13).

 

    1. Habacuque – Este profeta ora para que Deus livre o seu povo da invasão dos caldeus, e Deus simplesmente afirma que aquela ordem havia sido dada por ele mesmo. Então o profeta se perde nas suas inquietações: “Tu és tão puro de olhos, que não podes ver o mal e a opressão não podes contemplar; por que, pois, toleras os que procedem perfidamente e te calas quando o perverso devora aquele que é mais justo do que ele? Por que fazes os homens como os peixes do mar, como os répteis, que não têm quem os governe?” (Hab 1.13-14).

 

Estas são as mesmas questões que a serpente levantou no paraíso: “ Será que faz sentido isto tudo?”…  “As ordens de Deus não fazem sentido: Pode pecar que não ha juízo”. A vida é incoerente e não ha como resolver tais  contradições…

§  Justos a quem sucedem coisas ruins…

§  Velhos “precisando” e continuando vivos, enquanto jovens e crianças tem suas vidas ceifadas na flor da idade.

 

  1. Animais e homens parecem ter a mesma essência – Esta é a terceira tensão que inquieta o coração de Salomão:  “Porque o que sucede aos filhos dos homens sucede aos animais; o mesmo lhes sucede: como morre um, assim morre o outro, todos têm o mesmo fôlego de vida, e nenhuma vantagem tem o homem sobre os animais; porque tudo é vaidade. Todos vão para o mesmo lugar; todos procedem do pó e ao pó tornarão. Quem sabe se o fôlego de vida dos filhos dos homens se dirige para cima e o dos animais para baixo, para a terra?” (Ec 3.19-20).

 

Quem diz que existe alguma diferença entre a morte de um cão e a de um homem? Eu me recordo da minha infância, quando sempre ouvi este mesmo argumento de meu tio que era pagão.

Estranhamente, é este mesmo autor que levanta tais inquietações, que posteriormente concluirá de forma completamente diferente a sua ideia, ao afirmar em Ec 12.7: “O pó volte a terra como era, e o espírito volte a Deus, que o deu”. Por ser espiritual, tal homem deverá se apresentar a Deus e dar conta de sua vida.  

Esta é uma visão bem clara da bíblia:

    1. 2 Co 5.10 – “Porque importa que todos nós compareçamos perante o tribunal de Cristo, para que cada um receba segundo o bem ou o mal que tiver feito por meio do corpo”.
    2. Hb 9.27 –“E, assim como aos homens está ordenado morrerem uma só vez, vindo, depois disto, o juízo”.

 

No entanto, neste momento, o autor de Eclesiastes está sendo absorvido por estas inquietações que ele não sabe muito responder.

 

  1. A vida parece ser uma sucessão de acasos: “Vi ainda todas as opressões que se fazem debaixo do sol: vi as lágrimas dos que foram oprimidos, sem que ninguém os consolasse; vi a violência na mão dos opressores, sem que ninguém consolasse os oprimidos. Pelo que tenho por mais felizes os que já morreram, mais do que os que ainda vivem; porém mais que uns e outros tenho por feliz aquele que ainda não nasceu e não viu as más obras que se fazem debaixo do sol” (Ec 4.1-3).

O pregador vê a vida na perspectiva do nihilismo. A vida não possui qualquer consistência, por isto, morrer se torna uma opção filosoficamente muito mais plausível.

O verbo “ver”, conjugado na primeira pessoa, aparece aqui 3 vezes. O que ele vê?

§  Opressão - sem que alguém faça a defesa do oprimido.

§  Lágrimas – sem que alguém enxugue e console.

§  Violência – sem que alguém proteja, sem socorro.

 

O autor, na sua inquietação, chega à conclusão de que vivemos ao “deus-dará”. Entregues ao acaso e desmandos da própria incoerente e contraditória vida humana.

Quando ele se depara com tais situações, chega a conclusão de que “”viver é náusea”(vs. 2), uma linguagem certamente bem mais apropriada a Nietzsche, mas que agora é assumida pelo autor sacro.

 

Conclusão: Diante de tais afirmações, gostaria de tirar 3 conclusões práticas para nossa vida:

  1. Inquietações filosóficas afetam tiram nosso prazer e entusiasmo pela vida – Por isto temos que ter cuidado em saber anda nossa mente e que conclusões temos feito da vida. A sua mente é um campo de batalha, e por ser uma área estratégica, Satanás deseja de toda forma assumir seu controle. Quais pensamentos tem rondado sua vida, e que percepções você tem construído na história. Um pensamento secularista pode destruir sua cosmovisão cristã; uma vida constantemente elaborada em torno de pensamentos depressivos, pode ser fatal. M. Loyd Jones afirma que “auto análise é boa, mas a introspecção e mórbida...
  2. Inquietações filosóficas afetam nossa confiança em Deus- Asafe começa o salmo 73 dizendo: “com efeito, Deus é bom para Israel”, mas por causa da sua crise ele diz: “Quanto a mim, quase me resvalaram os meus pés”. Sua compreensão teológica de Deus precisa deve ser traduzida numa compreensão pessoal.

  1. Se nossas questões filosóficas não forem resolvidas elaboradas de forma profunda nunca seremos firmes em nossa vida espiritual: ,
    1. Asafe revela que teve que entrar no santuário de Deus. Encontrar-se com Deus, e resgatar os fundamentos de sua fé, foram essenciais para sua sobrevivência espiritual. Se não estivermos convencidos de que o cristianismo bíblico, ao ser levado às ultimas consequências, é coerente e faz sentido para nossa mente, nunca seremos bons cristãos.  
    2. A vida só encontra sentido quando achamos o sentido maior. A vida é muitas vezes paradoxal e contraditória. Se olharmos as pessoas ao nosso redor, as circunstancias e paradoxos, nunca encontraremos razão de viver. Somente em Deus, as coisas realmente farão sentido. O coração humano anseia por um significado eterna. Sem Deus, a vida é realmente caótica.

 

Em hebraico, existem vários nomes para Deus: Jeová-Jiré (O Deus da provisão); Jeová Tsebaoth (O Deus dos exércitos); El Shaddai (O Deus Todo poderoso); Curiosamente, no livro de Eclesiastes, o autor prefere Elohim, o Deus criador. O termo Iawé que se refere a um Deus pessoal, o Deus do pacto, não é usado sequer uma vez. O autor tem a concepção de um Deus grande, poderoso, mas não relacional; Criador, mas não pessoal. Não é, portanto, sem razão, que ele enfrenta estas graves inquietações no seu coração.

O profeta Isaias afirma: “Diz o Soberano Senhor, o Santo de Israel: "No arrependimento e no descanso está a salvação de vocês, na quietude e na confiança está o seu vigor, mas vocês não quiseram. Vocês disseram: ‘Não, nós vamos fugir a cavalo’. E fugirão! Vocês disseram: ‘Cavalgaremos cavalos velozes’. Velozes serão os seus perseguidores! Mil fugirão diante da ameaça de um; diante da ameaça de cinco todos vocês fugirão, até que vocês sejam deixados como um mastro no alto de um monte, como uma bandeira numa colina. Contudo, o Senhor espera o momento de ser bondoso com vocês; ele ainda se levantará para mostrar-lhes compaixão. Pois o Senhor é Deus de justiça. Como são felizes todos os que nele esperam!”(Is 30.15-18).

Nossa alma só encontra descanso, quando mergulha na abençoada dimensão da quietude e confiança que só pode ser encontrada no Senhor.

Ec 3.9-15 Eternidade


 

 
 Deus pôs a eternidade no coração do homem

 Se no estudo anterior, o autor considera a tempo com suas variacoes de humor e situações distintas, agora ele se volta para refletir sobre a vida adentrando os portais da eternidade. Esta declaração acima é clássica e muito conhecida. Apesar de não gostarmos de falar sobre a eternidade, a verdade é que, como afirmou C.S.Lewis: “Tudo que não é eterno é eternamente inútil”, e portanto “Se encontro em mim um desejo que nenhuma experiência desse mundo pode satisfazer, a explicação mais provável é a de que fui criado para um outro mundo".

 

Esta afirmação nos leva a tirar algumas conclusões:

 

  1. O homem foi feito para a Eternidade – Não fomos feitos apenas para viver de forma transitória e temporal, a vida que agora desfrutamos é apenas uma passagem. Somos peregrinos e forasteiros, habitando nossa temporalidade. Somos temporais aguardando a eternidade, e eternos habitando um curto espaço de tempo da história. Daqui a 100 anos, pouco vai interessar se você foi rico ou pobre. Pouca ou nenhuma memória haverá de ti, o que você fez, seus amores, dores e paixões.

A morte é um “acidente de percurso”. O homem não foi feito para morrer. Deus o advertiu que a desobediência o mataria, “No dia em dele comerdes, certamente morrereis”, mas o homem preferiu ouvir a serpente. “é certo que não morrereis” e assim a morte entrou no mundo. Por ser anti-natural, a Bíblia afirma que “O último inimigo a ser destruído é a morte” (1 Co 15.26). Morte é “inimiga”, um chiste, uma invasora. Entrou no mundo de Deus de forma clandestina, através do viés da independência humana. Por isto a morte sempre agride, e por mais que a esperemos, ela é sempre uma violência. 

A grande verdade é que nesta curta temporada da nossa existência, precisamos lembrar das palavras de Heráclito: “Tudo flui, nada permanece”. "Não somos seres humanos passando por uma experiência espiritual, somos seres espirituais passando por uma experiência humana..."

 

Quando estava perto de morrer, Steve Jobs confidenciou a seu biografo Walter Isaacson, (Biografia de Steve Jobs): “Sobre acreditar em Deus sou mais ou menos meio a meio. Durante a maior parte de minha vida achei que deve haver algo mais na nossa existência do que aquilo que vemos. Gosto de pensar que alguma coisa sobrevive quando morremos. É estranho pensar que a gente acumula tanta experiência, talvez um pouco de sabedoria, e tudo simplesmente desaparece. Por isso quero realmente acreditar que alguma coisa sobrevive, que talvez nossa consciência perdure. Mas por outro lado, talvez seja apenas como um botão: liga.Desliga. Clique! E a gente já era! Talvez seja por isso que eu jamais gostei de colocar botões liga.desliga nos aparelhos Apple”.

 

  1. O homem tem anseio pelo Eterno – “Deus pôs a eternidade no coração do homem”(Ec 3.11). Você foi criado para ir além da matéria, por isto o homem abriga em seu coração este senso de vazio e incompletude. Esta noção da eternidade faz parte do inconsciente coletivo da raça humana, sendo um dos arquétipos na concepção Jungiana. A única sociedade que insistiu em negar Deus e a eternidade foi a Moderna. Todas as religiões primitivas construiram seus templos e altares, fizeram seus cultos e deuses, mas o homem moderno resolveu decretar a morte de Deus (Nietzsche). O novo movimento da história, que se convencionou chamar de Pós-Modernidade, retoma esta espiritualização dos processos espirituais em formas muitas vezes estranhas, com o resgate das religiões orientais, novas formas e adoração baseadas em antigos modelos religiosos.

Riobaldo, o herói de Grande Sertão: Veredas, de Guimarães Rosa, em sua luta para ter fé, dizia que algum "norteado" tem de existir no mundo. "Se não, a vida fica sendo sempre o confuso dessa doideira que é". Os que possuem convicções religiosas consolam-se imaginando não a desordem, mas uma ordem misteriosa, mesmo quando esta parece misteriosa. "Creio porque é absurdo", dizia Tertuliano. A ausência de significado e compreensão do eterno, deixa um rastro de desespero. Quem não tem fé fica só com a desordem e o caos.  “Pertencem, inexoravelmente, à condição humana as perdas e o luto. Todos somos submetidos à férrea lei da entropia: tudo vai lentamente se desgastando; o corpo enfraquece, os anos deixam marcas, as doenças vão nos tirando irrefreavelmente nosso capital vital. Essa é a lei da vida que inclui a morte” (Leonardo Boff, teólogo e professor).

 

  1. Jesus veio nos orientar sobre eternidade – Sua vida foi sempre vivida na dimensão da sobrenaturalidade.
    1. Sua ressurreição foi uma declaração de vitória sobre a morte – Na 1 Carta aos Coríntios, lemos o seguinte: “Porque é necessário que este corpo corruptível se revista da incorruptibilidade, e que o corpo mortal se revista da imortalidade. E, quando este corpo corruptível se revestir de incorruptibilidade, e o que é mortal se revestir de imortalidade, então, se cumprirá a palavra que está escrita: Tragada foi a morte pela vitória. Onde está, ó morte, a tua vitória? Onde está, ó morte, o teu aguilhão? O aguilhão da morte é o pecado, e a força do pecado é a lei. Graças a Deus, que nos dá a vitória por intermédio de nosso Senhor Jesus Cristo” (1 Co 15.53-57).

A Bíblia, na verdade, faz aqui uma sátira da morte. “Onde está, ó morte, o teu aguilhão?”. Aguilhão é aquele ferrão usado para cutucar o boi. O texto nos diz que a morte, antes da ressurreição de Cristo, era uma espécie de esporão para ferir as pessoas, mas que depois da obra de Cristo seu poder foi desmistificado e minimizado.

 

    1. A ressurreição de Cristo foi o anúncio de um novo tempo – “Mas, de fato, Cristo ressuscitou dentre os mortos, sendo ele as primícias dos que dormem (1 Co 15.20). Primícias são os primeiros frutos de uma colheita, apontando para a realidade de que o tempo do júbilo está chegando. O lavrador vivia o ano todo cultivando a terra, e quando as primícias surgiam, era o sinal de que o tempo da espera havia enfim chegado.

É interessante notar, que a ressurreição de Cristo foi diferente de todas as demais ressurreições que vemos na Bíblia. O Filho da viúva de Naim foi ressuscitado por Jesus, mas voltou a morrer. Lázaro, da mesma forma. Mas Jesus não “voltou” da morte, mas “passou” pela morte. Ele nunca mais morreria. Sua vitória sobre a morte anuncia um novo tempo para o povo de Deus.

 

    1. A ressurreição de Cristo destruiu o poder da morte –  A ressurreição de Cristo ainda teve outra implicação: Retirou da morte o poder que ela tinha de nos fustigar e nos manter debaixo do pavor da eternidade. Visto, pois, que os filhos têm participação comum de carne e sangue, destes também ele, igualmente, participou, para que, por sua morte, destruísse aquele que tem o poder da morte, a saber, o diabo, e livrasse todos que, pelo pavor da morte, estavam sujeitos à escravidão por toda a vida” (Hb 2.14-15). A morte era um instrumento de opressão,  mas com a vitória de Cristo ela perdeu seu poder sua efetividade de nos apavorar.

 

    1.  Porque o poder da morte foi relativizado, somos convidados a experimentar a presente vida com contentamento e alegria –

 

                                                    i.     Aprender a desfrutar da criação de Deus – “Tudo fez Deus formoso no seu devido tempo” (Ec 3.11). A vida possui vários ciclos, como vimos no texto anterior. Há tempo para chorar, e tempo de rir, tempo de plantar e tempo de colher, tempo de ajuntar e tempo de espalhar. Precisamos aprender a desfrutar de cada uma destas estações da vida. Nossa infância, juventude, namoro, casamento, chegada dos filhos, netos, velhice, etc. “Este é o dia que o Senhor nos fez, regozijemo-nos e alegremo-nos nele”.

                                                   ii.     Aprender a desfrutar do trabalho – O autor de Eclesiastes nos faz pensar nas oportunidades que temos quando produzimos com as nossas mãos. O trabalho não é apenas aflição, mas traz também suas recompensas.

 

  1. Porque a Eternidade é uma realidade, devemos adentrar o mistério da vida – “Deus pôs a eternidade no coração do homem”. Para que? Para penetrar no mistério da vida. A vida não é só materialidade e concretude, a vida também é imaterial e espiritual. Mesmo que o homem não possa “descobrir as obra que Deus fez desde o princípio até o fim” (Ec 3.11).

Na trajetória da vida, existem muitos mistérios. Muitas questões jamais serão respondidas. O universo e a ciência possuem enigmas indecifráveis. “As coisas encobertas pertencem ao SENHOR, nosso Deus, porém as reveladas nos pertencem, a nós e a nossos filhos, para sempre, para que cumpramos todas as palavras desta lei” (Dt 29.29). Nunca iremos entender determinados aspectos da criação. Nunca conseguiremos explicar porque uma criança morre tão cedo, porque homens ímpios e injustos parecem prosperar e se dar bem na vida, enquanto pessoas respeitáveis e honoráveis parecem enfrentar tantas lutas.

Quando lidamos com o inominável, duas conseqüências devem surgir:

 

    1. Assombro e Admiração – Ao passarmos por momentos em que não somos capazes de responder as questões da vida, devemos nos silenciar. Às vezes tentamos responder o irrespondível, o indecifrável, o mistério. Certa pessoa me perguntou porque seu filho de 18 anos tinha morrido num acidente de carro, eu disse que não sabia. Em silencio a abracei, deixando que sua dor e nossas lagrimas pudessem ser compartilhadas, sem que tentássemos explicar o acontecido. Os amigos de Jó que tentaram explicar o mistério do sofrimento que ele enfrentava, foram chamados de “consoladores molestos” (Jó 16.2).  

 

    1. Temor e suspense – Ao lidar com a eternidade, com a limitação humana, podemos nos tornar revoltados e nos rebelarmos contra Deus, ou podemos buscar o misterio que envolve tais situações. O autor deste texto afirma: “...Isto faz Deus para que os homens temam diante dele” (Ec 3.14). “Se alguém te perguntar o que quiseste dizer com um poema, pergunta-lhe o que Deus quis dizer com este mundo...” (Mário Quintana). O mistério nos faz silenciar e dá maior reverência à vida.

Ruben Alves afirma:A proximidade da morte ilumina a vida. Aqueles que contemplam a morte nos olhos vêem melhor, porque ela tem o poder de apagar do cenário tudo aquilo que não é essencial.[1]



[1].  Alves, Ruben - Morte, ed. Papirus, Campinas, ano 2000, pg. 8
 

Gn 4.17 A Igreja e o desafio urbano


 

 

Introdução:

 

Um dos grandes desafios da igreja é seu relacionamento com a cidade. José Comblin, teólogo católico indaga os motivos por detrás do silêncio da teologia cristã sobre a cidade. Para ele, não a igreja não refletiu muito sobre o assunto porque boa parte de nossa teologia tenha sido escrito por homens que viveram em pequenas cidades. Um exemplo que pode ser citado ‘e o de Calvino. Quando ele escreveu as Institutas, e aos 27 anos já havia terminado seu trabalho, Genebra tinha apenas 17 mil habitantes. Era do tamanho de Rialma.

A Bíblia não começa na cidade, mas num jardim, num campo. Deus o colocou neste jardim para cultivar e guardar. No entanto, há uma progressão nesta caminhada, e ela termina com a visão da cidade celestial: A Jerusalém que desce dos céus.

Peguy afirma que devemos estudar a questão da cidade, não por oportunismo, mas por vocação e mística.

A origem da cidade na Bíblia não é muito animadora. Este texto afirma que a primeira cidade a ser construída foi uma idéia de Caim, que foi um assassino. Isto, a princípio, pode nos levar a pensar na cidade com uma idéia de resistência e ate mesmo repulsa. Caim tinha 2 motivos declarados neste texto ao construí-la.

 

A.     Ele a construiu para sua defesa própria – A cidade surge como uma necessidade de proteção de pessoas com um histórico ruim. Por esta razão, a questão da segurança, controle político, luta pelo poder, está presente em todos movimentos históricos de aglutinação;

B.      Caim deu o nome de seu filho à cidade – Demonstra com isto, que a cidade tem o potencial para a auto promoção, personalismo e vaidade. Caim chamou esta cidade de “Enoque”, que era o nome de seu filho.

 

Portanto, ao lermos as primeiras linhas da Bíblia, podemos fazer um pré-julgamento sobre a cidade. No entanto, a bíblia inteira fala da necessidade do povo de Deus ter os olhos postos sobre as cidades, mesmo aquelas que resistem a orientação de Deus. Um dos textos mais dramáticos que lemos nas Escrituras ‘e o chamado de Jonas e sua resistência para pregar a uma cidade, Nínive, que era conhecida por sua maldade. A cidade, porem, que personifica o mal em toda Bíblia é Babilônia. Por outro lado, Jerusalém é simbolicamente a cidade amada.

A palavra “polis” aparece 45 vezes, apenas nos escritos lucanos (Lucas e Atos). Jesus várias vezes demonstra seu foco de ministério apontando para as cidades (Lc 10.1) e chora por Jerusalém ao perceber seu fechamento para a mensagem da redenção (Mt 23.37-38), e se entristece pelas cidades impenitentes como Corazim, Betsaida e Cafarnaum pela sua incredulidade e dureza de coração (Mt 11.20-23).

No seu ministério, Jesus andava de “cidade em cidade” (Lc 8.1) e enviou seus discípulos a pregaram nas cidades, por onde ele planejava andar (Lc 10.1). Uma das frases mais impactantes para demonstrar como a igreja pode ser positiva para uma cidade é descrita em At 8.8: “E houve grande alegria para aquela cidade”. Isto aconteceu quando o ministério dos seguidores de Cristo começou a atingi-la, trazendo libertação e cura para seus habitantes e os espíritos imundos eram desmascarados.

As cidades, com sua complexidade social, cultural, econômica, política e espiritual tornam-se um grande campo para atuação da igreja. Linthicum escreveu um excelente livro com o título “Cidade de Deus e cidade de Satanás”, afirmando que na cidade ocorrem grandes lutas entre as forcas do inferno e a obra de Deus.

Um dos incidentes mais marcantes na minha vida se deu quando ainda era pastor nos EUA, na cidade de Cambridge-MA. Certo dia resolvemos fazer um trabalho de rua e levamos o coral para cantar em plena praça, na famosa “Central Square”, onde fica o metro, entre a Harvard e o MIT. Quando ali chegamos, uma pessoa mal vestida e estranha, veio na minha direção, parou cerca de 40 cms de mim e nossos olhos se cruzaram, e ele me afirmou: “I’m the boss here” (eu sou o chefe aqui). Provavelmente ele fosse espiritualmente o dominador daquele lugar. Fiquei pensando naquelas palavras e a resposta tem sido: “A new boss is coming!”. (um novo chefe est’a chegando). A igreja, com sua mensagem e estilo de vida torna-se confrontativo. Uma ameaça ao inferno e aos dominadores deste mundo tenebroso.

Portanto, apesar de Caim ter sido o fundador da primeira cidade mencionada na Bíblia, vemos Deus sempre dando diretriz ao seu povo em relação “a cidade:

 

1. A Bíblia ordena que o povo de Deus ore pela cidade.

               Sl 122.6-9: Orai pela paz de Jerusalém! Sejam prósperos os que te amam. Reine paz dentro de teus muros e prosperidade nos teus palácios. Reine paz dentro de teus muros e prosperidade nos teus palácios. Neste texto vemos o Senhor convocando Israel para orar por Jerusalém.

Jr 29.4-7: Assim diz o SENHOR dos Exércitos, o Deus de Israel, a todos os exilados que eu deportei de Jerusalém para a Babilônia: Edificai casas e habitai nelas; plantai pomares e comei o seu fruto. Tomai esposas e gerai filhos e filhas, tomai esposas para vossos filhos e dai vossas filhas a maridos, para que tenham filhos e filhas; multiplicai-vos aí e não vos diminuais. Procurai a paz da cidade para onde vos desterrei e orai por ela ao SENHOR; porque na sua paz vós tereis paz. Aqui vemos o Senhor pedindo que seu povo ore por uma cidade, que na Bíblia ‘e o símbolo de toda perversão e hostilidade contra Deus.

1 Tm 2.1-3 Antes de tudo, pois, exorto que se use a prática de súplicas, orações, intercessões, ações de graças, em favor de todos os homens, em favor dos reis e de todos os que se acham investidos de autoridade, para que vivamos vida tranqüila e mansa, com toda piedade e respeito. Isto é bom e aceitável diante de Deus, nosso Salvador,

 

Ray Bakke, um dos mais respeitados estudiosos de Missão Urbana, afirma que um dos grandes entraves para a expansão do reino de Deus nas cidades tem sido o fato de que poucas pessoas oram de forma intencional e profunda pela cidade.

 

2. A Bíblia exorta o povo de Deus a construir o bem da cidade.

Cidade é o objeto do amor de Deus. A presença da igreja deve impactar a ordem social da cidade. Vimos isto em At 8.8.

Por isto vemos Jesus chorando pelas cidades impenitentes e por Jerusalém.

Mt 11.20-23) – “Passou, então, Jesus a increpar as cidades nas quais ele operara numerosos milagres, pelo fato de não se terem arrependido: Ai de ti, Corazim! Ai de ti, Betsaida! Porque, se em Tiro e em Sidom se tivessem operado os milagres que em vós se fizeram, há muito que elas se teriam arrependido com pano de saco e cinza. E, contudo, vos digo: no Dia do Juízo, haverá menos rigor para Tiro e Sidom do que para vós outras. Tu, Cafarnaum, elevar-te-ás, porventura, até ao céu? Descerás até ao inferno; porque, se em Sodoma se tivessem operado os milagres que em ti se fizeram, teria ela permanecido até ao dia de hoje. Digo-vos, porém, que menos rigor haverá, no Dia do Juízo, para com a terra de Sodoma do que para contigo”.

 

Mt 23.37-38: “Jerusalém, Jerusalém, que matas os profetas e apedrejas os que te foram enviados! Quantas vezes quis eu reunir os teus filhos, como a galinha ajunta os seus pintinhos debaixo das asas, e vós não o quisestes! Eis que a vossa casa vos ficará deserta”.

 

Vamos analisar alguns resultados da presença da igreja nas cidades:

 

A. Trouxe rebuliço em Jerusalém – O derramamento do Espírito em At 2;  a reação das autoridades em At 4;  A conversão em massa em Jerusalém At 2.41 e 4.4, levou as autoridades a se sentirem preocupados a a prenderem alguns dos apóstolos (At 4).

 

B. Trouxe alegria para Samaria – A frase bíblica é simples, mas direta. “E houve grande alegria naquela cidade”. A cidade foi impactada com uma benção e isto era perceptível no meio do povo.

 

C. Transtonaram Atenas – “Aqueles que estão transtornando o mundo chegaram até aqui” At 17.16. A cidade de Éfeso, nicho idolatra “foi tomada por confusão” (At 19.29);

 

D. A presença da igreja desestruturava as obras malignas – Em Mc 5 vemos Jesus se dirigindo para uma cidade chamada de Decápolis, na região de Gadara. O texto descreve que sua única ação foi a de libertar um homem que vivia oprimido por espíritos malignos. Em seguinda Jesus ‘e expulso da região e nada mais pode fazer.

 

 

Conclusão:

Para concluir, gostaria de sugerir três linhas de ação:

a)- Ore intencionalmente pela sua cidade. Ray Bakke afirma que um dos maiores entraves para o ministério urbano é que existem poucas pessoas orando pela sua cidade. Transforme a oração pelos poderes públicos, executivo, judiciário e legislativo, em uma agenda de sua vida;

b)- Descubra como ajudar sua cidade. Ministério com pobres e necessitados. Inserção comunitária. Participação política, não necessariamente partidária, nem por fisiologismo e conveniência, para trazer propostas de ação eficientes para sua região;

c)- envolva-se em projetos evangelísticos. Plantação de novas igrejas, congregações, eventos. Use cada oportunidade para glorificar a Deus e exaltar seu nome.

 

Que Deus nos ajude!

 

Samuel Vieira