Introdução
Hoje a homilia não será expositiva, mas
temática.
Em geral, prefiro a exposição bíblica que o
estudo de temas, embora não haja nada errado com estudos desta natureza. Acho,
entretanto, que a exposição nos ajuda a entender e aprofundar em um texto, e
desta forma a comunidade aprende a estudar a Bíblia. Estudos temáticos podem se
tornar associações gerais que permitem tendências que nem sempre são bíblicas e
por isto não refletem o propósito de Deus. Texto fora do contexto pode se
tornar pretexto.
É conhecida a história de um homem que
resolveu pregar um texto aleatório da Bíblia e quando a abriu, leu o seguinte
versículo: “Foi Judas e enforcou-se”. Assustado, abriu o texto seguinte que
dizia: “Vai tu e faze o mesmo!”, ainda mais apavorado, leu outro texto que
complicou ainda mais sua situação: “O que tem que fazer, faça-o logo”. Estudos
temáticos podem se tornar formas manipulativas da Bíblia, por outro lado, as
correlações são necessárias, porque o melhor intérprete da Bíblia é ela mesma,
e textos obscuros podem ser clarificados quando lidos à luz de textos claros.
Feitas estas considerações, vamos adiante.
O ponto que quero frisar hoje é que, Deus não
ouve apenas orações. Existem outras coisas que chegam ao seu trono celestial de
onde tudo é julgado (Ap 4.1) com a mesma veemência de sinceras e profundas
orações. O Deus que tudo vê sabe o que os homens fazem às escondidas, mas
diante de dele não se esconde nada, de bom ou de ruim. Deus vê, ele ouve.
Tira a Rebeca do castigo!
Moisés é colega de ministério em Goiânia, e um
dia me contou a surpreendente história com sua filha de apenas 3 anos. Ela
havia desobedecido, resmungado e como bom pai, ele a disciplinou e a colocou de
castigo. Ela deveria ficar assentada na cama de seu quarto até que se
comportasse e mostrasse nova atitude. Ela ficou ali, mas logo em seguida a
impaciência começou a tomar conta. Enquanto seu pai estava na sala de TV, ela
choramingando perguntou ao pai:
-“Quando o Senhor ora, Deus fala com o
Senhor?”
- “fala sim”, foi sua resposta.
- “E o Senhor ouve o que Deus fala?”
- Ele, sem querer dar muita conversa
respondeu: “-Sim!”
Ela então raspou a garganta e disse tentando
imitar uma voz grave e masculina:
- “Moisés, tira a Rebeca do castigo!”
Deus ouve as orações
Deus ouve as orações. Não tenha dúvidas disto.
A confiança nesta verdade muda radicalmente a
nossa história, nosso estilo de vida, quem somos e para onde estamos indo.
Assistindo a um episódio de House of cards, há um diálogo
entre um homem alcoólatra e ateu, afirmando que não cria em nada: nem em forças
superiores, Deus, demônios ou entidades, e o outro replicou: “Eu não estou
dizendo que você deveria crer em Deus, e sim que você não deveria descartar
possibilidades”.
Orar é uma grande fonte de inspiração e benção,
e alguns chamam a oração de “A terceira fonte do saber”, não aprendemos apenas
pelo intelecto e intuição, mas também pela dimensão mística e sobrenatural. A
oração abre janelas para uma dimensão transcendente da vida.
Mas o Deus das Escritura Sagradas não
ouve apenas orações.
Deus ouve gemidos, dores, sussurros,
angústias, opressão, maldade, e é sobre estas coisas que Deus afirma ouvir e
ver na Bíblia, que estamos falando deste tema: Deus ouve, não
apenas, orações.
“A voz do sangue de teu irmão, clama da terra a mim”
A primeira vez que vemos um relato sobre este
assunto surge em Gn 4.10. Logo após o assassinato de Abel, Caim tenta se
distanciar da “cena do crime”, e tenta transparecer que as coisas estão dentro
da normalidade. Deus se aproxima dele indagando: “Onde está Abel, teu irmão? E ele respondeu: Não sei; acaso sou eu tutor
de meu irmão?” (Gn 4.9).
Deus afirma que o sangue de Abel clamava.
A violência humana, conspira contra a
santidade da vida, contra a vida e contra o Deus que dá a vida. Por isto
eliminar alguém através de ódio ou vingança é algo tão pesado, mesmo para
pessoas que “se acostumaram a matar”.
Quando Adolf Eichmann formulou “a solução
final” enviando milhares de judeus à câmara da morte, ele o fez porque alegava
que era muito dura a rotina diária daqueles que eram obrigados a atirar, de
sangue frio, na cabeça das pessoas que precisavam ser exerminadas. A câmara de
gás, além de mais barata e efetiva, não obrigava aqueles insensíveis soldados a
continuarem exterminando. Eles, na verdade, não estavam mais suportando a
tarefa de execução, ainda que justificada pela ideologia e pela deontologia.
“A terra clama” diante da violência.
Nações violentas sentem o peso do sangue
derramado. No Brasil em 2016 foram assassinadas 64 mil pessoas, e em todo o
mundo, 540 mil pessoas. Isto equivale a 11% de todo mundo. Se Alagoas fosse um
pais, seria o país mais violento do mundo. O sangue de inocentes, vítimas,
execuções sejam pelos motivos que forem, chegam em forma de clamor diante do Deus
santo. Isto traz peso para a sociedade. O homicídio agride a santidade de Deus.
Fere o propósito de Deus ao criar a humanidade.
“Descerei
e verei, se de fato, o que tem praticado corresponde a esse clamor que é vindo
até mim”
Aqui nos deparamos com a segunda situação.
Trata-se da maldade corporativa de uma nação. Deus vê a forma injusta que uma
nação e seus lideres tratam o povo, a injustiça social clama aos céus. Deus
ouve a gravidade do pecado de um povo.
Pecado não tem apenas uma dimensão individual
e pessoal, mas pode ter natureza sistêmica e coletiva. A maldade de Sodoma e
Gomorra, cidades cujos habitantes eram “maus
e grandes pecadores contra o Senhor” (Gn 13.13) chegaram ao trono do santo
juiz. Deus viu o mal que aquela nação praticava e a julgou severamente e por
isto vem, pessoalmente, observar “se de
fato, o que tem praticado corresponde a esse clamor que é vindo até mim”
(Gn 18.21).
O mesmo se deu com Nínive. “Dispõe-te, vai a grande cidade de Nínive e
clama contra ela, porque a sua malicia subiu até mim” (Jn 1.2). A violência de Nínive, cidade sanguinária,
cheia de mentiras e de roubo, que gerava massa de cadáveres e mortos sem fim e
que tropeçava sobre os mortos chegou ao trono santo de Deus (Naum 3.1-4) e foi julgada
por Deus: “Não há remédio para a tua ferida, a tua chaga é incurável” (Naum
3.19).
Nações violentas sofrem por séculos o efeito
de sua violência, em forma de culpa corporativa e desestrutura psicológica
social. Nações corruptas e desumanas são julgadas por Deus. Estas coisas não
passam desapercebidas pelo Deus santo. Ele ouve o clamor e a dor de uma
sociedade massacrada, marcada pela injustiça e opressão. Deus não é alheio!
A maldade de uma nação, tem o poder de persegui-la por anos a fio, às vezes por séculos
A maldade de uma nação, tem o poder de persegui-la por anos a fio, às vezes por séculos
Um estudo sobre as primeiras posições na lista dos países considerados pela revista Forbes (2016) como os “mais felizes do mundo”, bem como os seus índices de suicídio revela que, nos 10 países, no ano do estudo, eram, por ordem de primeiro a décimo, a Noruega, a Dinamarca, a Finlândia, a Austrália, a Nova Zelândia, a Suécia, o Canadá, a Suíça, os Países Baixos e os Estados Unidos. Por sua vez, esta lista se baseava no chamado “Índice de Prosperidade”, elaborado pelo Instituto Legatum, de Londres, que classifica 110 países.As conclusões do estudo indicaram que os países mais destacados na “lista da prosperidade” eram, ao mesmo tempo, os que apresentavam os índices mais altos de suicídio.
https://pt.aleteia.org/2016/03/07/o-grande-paradoxo-indice-de-suicidios-e-maior-nos-paises-considerados-mais-felizes/
“Certamente
vi o clamor do meu povo, que está no Egito, e ouvi o seu clamor por causa de seus
exatores (carrascos): conheço-lhe o sofrimento”
Este é o terceiro aspecto que o Deus de toda
glória ouve, além das orações. Trata-se da opressão social, da injustiça,
lideranças opressivas, governos corruptos. Deus vê e intervém. Este foi o
motivo de Deus enviar Moisés para libertar seu povo. “Certamente vi o clamor do meu povo, que está no Egito, e ouvi o seu
clamor por causa de seus exatores (carrascos): conheço-lhe o sofrimento” (Ex
3.6-9). O sofrimento daquele povo chegava aos céus.
Deus vê o sofrimento. Deus ouve o clamor do
oprimido e daquele que sofre.
A maldade, a violência, agride os céus. O mal
afronta a Deus.
Quando Agar foi expulsa de casa, com seu
filho Ismael ainda pequeno, Deus os encontra no deserto e o texto não diz que Deus
ouviu a oração de Abraão, que poderia ter intercedido a favor de seu filho
neste momento tão estranho, cruel e desumano, nem mesmo de Agar, que estava
definhando e morrendo de sede no deserto, mas Deus envia seu anjo para dizer
que ouviu a voz do menino. “Não temas,
porque Deus ouviu a voz do menino, daí onde está” (Gn 21.17).
Este menino fala pelas crianças violentadas,
estupradas, banidas, órfãs da guerra, da irresponsabilidade de milhões de pais
que geram filhos e os abandonam. Este texto é figura de tantas crianças que não
tem para onde ir, que se perdem no deserto da vida, no ostracismo, abandono e
crueldade.
Este texto fala por Malala Yousafnai, que quando criança ainda recebeu um tiro na face por defender o direito das meninas do sexo feminino irem para a escola no Paquistão, que estava subordinado ao duro regime dos Talibãs. Malala sobreviveu e recebeu o prêmio Nobel da Paz em 2014 (dividido com outra pessoa).
Este texto fala pela criança Síria, que foi encontrada morta na praia depois da tentativa desesperada de seus pais em fugir da guerra do seu país.
Este texto fala pela garota vietnamita, eternizada na chocante foto em que aparece nua, sozinha e desamparada, fugindo da guerra.
Este texto fala pelo garoto carioca, que viu seu pai sendo assassinado na semana passada (Março 2018), na sua frente e que sai do carro onde seu pai estava morto, sem direção, correndo aflito em direção ao policial que lhe dê a mão e o protege.
Este texto fala pelas milhares de crianças colocadas nas câmaras de gás.
Este texto fala pelos milhões de garotos e garotas do Benin, Biafra, e pobres países da África Central, que são entregues à morte pela pobreza, guerra e exploração.
Este texto fala por Malala Yousafnai, que quando criança ainda recebeu um tiro na face por defender o direito das meninas do sexo feminino irem para a escola no Paquistão, que estava subordinado ao duro regime dos Talibãs. Malala sobreviveu e recebeu o prêmio Nobel da Paz em 2014 (dividido com outra pessoa).
Este texto fala pela criança Síria, que foi encontrada morta na praia depois da tentativa desesperada de seus pais em fugir da guerra do seu país.
Este texto fala pela garota vietnamita, eternizada na chocante foto em que aparece nua, sozinha e desamparada, fugindo da guerra.
Este texto fala pelo garoto carioca, que viu seu pai sendo assassinado na semana passada (Março 2018), na sua frente e que sai do carro onde seu pai estava morto, sem direção, correndo aflito em direção ao policial que lhe dê a mão e o protege.
Este texto fala pelas milhares de crianças colocadas nas câmaras de gás.
Este texto fala pelos milhões de garotos e garotas do Benin, Biafra, e pobres países da África Central, que são entregues à morte pela pobreza, guerra e exploração.
Deus vê o grito de milhões de crianças
desamparadas e famintas ao redor do mundo.
“Eis
que o salário dos trabalhadores que por vós foi retido com fraude, está
clamando, e seu clamor subiu ao Senhor dos Exércitos”
Este é o quarto elemento que Deus ouve... além
de nossas orações. Deus vê a forma como os trabalhadores são tratados por
instituições gananciosas e inescrupulosas, que querem ter lucro a despeito e às
custas daqueles que são contratados.
Isto é uma exortação forte aos cristãos que
possuem recursos. Tratem com bondade e justiça os seus funcionários! Deixem as
ameaças! Deus é o “Deus dos órfãos e das viúvas”, das pessoas oprimidas em
sistemas injustos. Deus é o Deus dos estrangeiros, pessoas sem terra, sem
raízes, arrancadas de suas origens por causa da escassez econômica, perseguição
politica ou religiosa.
Todos sabemos que funcionário só é bom se é
produtivo. Por isto os contratamos. Entretanto, devemos ser liberais ao ponto
de considerar que eles também precisam ganhar, recompense-os pelo seu esforço e
por gerarem lucros. Dê salário compatível, “não amordaces o boi que debulha”,
como prescreve a Lei Judaica.
“Os
que tinham sido por mortos por causa do testemunho que sustentavam, clamavam em
grande voz dizendo: Até quando, ó Soberano Senhor, santo e verdadeiro, não
julgas o nosso sangue dos que habitam sobre a terra”
Devo confessar que hesitei em tratar deste
quinto aspecto, por se tratar de um texto enigmático e simbólico, do livro de
Apocalipse. Mas o que este texto está afirmando, é que além das orações que os
habitantes da terra fazem, existe um grupo de mártires, que já se encontra nos
céus, debaixo do altar do grande Deus, que foram mortos por causa do testemunho
da palavra, por serem fieis a Jesus, e que clamam diante do Deus soberano (Ap
5.9).
Jacques Ellul defende a ideia de que as
orações dos santos, é a quinta força que move a história da humanidade, porque
ela é descrita como o quinto selo, logo depois da aparição dos quatro cavalos,
que são as forças que impulsionam e mudam o curso da história.
A verdade é, que o sangue dos mártires tem
profundo impacto na história da humanidade. Grandes transformações politicas e
sociais aconteceram depois de trágicas situações de massacres contra o povo de
Deus. Martírio é como um holocausto de aroma suave a Deus. Não sem razão Jesus
afirmou que daria poder aos seus discípulos para serem suas testemunhas, e a
palavra grega que surge em Atos 1.8 literalmente refere-se a “mártires”.
O clamor dos que foram mortos por causa do
testemunho, encontra-se constantemente diante de Deus. E o que eles pedem? Que
Deus julgue o sangue dos que habitam a terra.
Conclusão
Não poderia deixar de falar sobre o efeito da
cruz diante do Pai.
Não são apenas as orações que chegam aos céus,
mas a oferta maravilhosa que seu Filho amado fez de si mesmo ao Pai, para
expiar a culpa da humanidade.
O que Deus ouve de seu Filho?
A.
“Pai, perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”. Deus ouve o clamor
de seu filho a favor daqueles que o esmagam, que zombam dele, que o desprezam.
Na cruz, o Filho intervém a nosso favor. Ele clama ao Pai que nos perdoe. Ele
nos defende judicialmente diante do Pai.
B.
“Tudo está pago!” Esta é outra profunda afirmação que o Filho faz ao
Pai, e que chega a Deus como uma declaração de que toda a dívida dos nossos
pecados foi perdoada, ele rasgou a duplicata que nos fazia devedor, entrando
ele mesmo em nosso lugar, realizando um sacrifício perfeito. Deus Pai aceita a
oferenda do Filho. “tudo está pago!”.
Os céus ouvem o que o Filho realizou e o que
ele pediu e afirmou!
Não são apenas orações que chegam aos céus...
diante de Deus, o próprio Filho assume o nosso lugar, como sacrifício pleno e
perfeito.
Você está sendo benção em minha vida e ministério.
ResponderExcluirDeus continue lhe sustentando. Forte abraço!
Lamartine Santana.
bencao!!!
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