“Ninguém aparecerá diante de mim
com mãos vazias”
Introdução
No início do ano 2000, o conselho da
Igreja Presbiteriana (PCA) de Raleigh, NC, por causa dos abusos que normalmente
os evangélicos cometem em relação ao dinheiro, decidiu que em todos levantamento de oferta ou entrega de dízimos as
pessoas que quisessem contribuir deveriam fazer suas transferências online ou
colocarem suas ofertas nos gazofilácios na entrada do templo. Surpreendentemente,
um grupo de jovens daquela igreja questionou a decisão do conselho, afirmando
que ela não era bíblica, e a liderança daquela igreja, depois de estudar a
Palavra de Deus sobre o assunto, revogou sua decisão, entendendo que,
teologicamente, aqueles jovens estavam certos.
Repetidas vezes encontramos nas
Escrituras a exortação divina: “Ninguém
aparecerá diante de mim de mãos vazias” (Ex 23.15; 34.20). Iahweh exigia do
seu povo que, no ato de culto, de virem à sua presença, deveriam adorá-lo com
seus recursos, e isto em todos os cultos regulares diante de Deus. Estritamente
falando, não havia culto bíblico, sem ofertas. Muitos destas ofertas tinham
propósitos diferentes. Havia os dízimos das primícias, os sacrifícios da
gratidão, as ofertas, os holocaustos pelos pecados e as ofertas pacificas. O
povo de Deus, ao se apresentar diante do Senhor, trazia do melhor de seu
rebanho, das primícias de suas colheitas, e os apresentava em ato de culto a Deus.
Não havia culto sem a entrega de bens, alguns deles onerosos.
Desta forma, não havia culto com mãos
vazias.
O adorador judaico entendia isto. Sem
custo não há culto! O importante não era o montante, mas a proporcionalidade.
Algumas destas ofertas feitas por famílias pobres, custava valores ínfimos, mas
o que importava era a atitude do adorador. José e Maria, quando vieram ao
templo para consagrar seu pequeno filho, por serem pobres, trouxeram como
oferendas, duas rolas ou dois pombinhos, segundo o que estava escrito na Lei do
Senhor (Lc 1.22-24). Culto sem entrega e doação, não é culto bíblico.
Isto pode escandalizar alguns e
assustar outro, mas é inequívoca e absolutamente claro nos relatos do
pentateuco e na experiência religiosa do povo de Deus, tanto no Antigo quanto
no Novo Testamento.
A contribuição seguia alguns
princípios:
Primeiro, as primícias.
Deus exigia que os primeiros frutos
das colheitas fossem trazidos em adoração. Quem já morou em fazenda, sabe como
são aguardados os primeiros frutos de uma determinada safra, a primeira manga
no pé, os brotos do feijão, mas este alimento era para ser ofertado, como sinal
de gratidão e louvor a Deus, as pessoas não deviam comê-lo mas deveriam oferta-lo
a Deus. A oferta não era daquilo que sobrava, ou do final da colheita, do
restolho. Deus exigia os primeiros frutos. Ao trazer suas ofertas o adorador
precisava entender que o melhor que ele possuía era para se apresentado a Deus.
Deus exigia e queria o melhor. O primeiro fruto, não o último; o melhor da
colheita, não o pior.
Segundo, regularidade e periodicidade
As ofertas precisavam ser regulares,
apresentadas de forma constante de acordo com as festas determinadas pela lei.
Elas aconteciam algumas vezes no ano, na festa dos pães asmos, festa da sega e
das primícias, da páscoa e em todas elas, trazia-se ofertas voluntarias e
sacrifícios pelos pecados. Tais atos de adoração deveriam ser acompanhados de
contribuições e doações. “Ninguém aparecerá diante de mim com mãos
vazias”. Muitos adoradores residiam longe de Jerusalém, e alguns
viviam até fora do país, e traziam dinheiro para comprar animais para o
sacrifício. Esta prática, infelizmente, se tornou escandalosa nos dias de
Jesus.
Este mesmo princípio encontra-se na
recomendação paulina: “No primeiro dia da semana, cada irmão ponha de
parte, segundo a sua prosperidade” (1 Co 16.2). Paulo estabelece dois
princípios: Regularidade: “No primeiro dia da semana”; e proporcionalidade: “de
acordo com suas posses”. As pessoas não deveriam deixar de
contribuir de forma regular, porque os sacerdotes e levitas, que vivam das
oferendas trazidas ao templo dependiam disto, e deveria ser feita
proporcionalmente. Uma pessoa que ganhasse muito deveria dar muito, os pobres
podiam trazer ofertas tão simples quanto um par de rolas ou dois pombinhos (Lc
1.24).
Terceiro, não poderia ser levedado
nem animais defeituosos
Os pães deveriam ser asmos, as
ovelhas sem defeitos e manchas (Lv 22.19-22, 24). Qual o significado disto. Fermento
na Bíblia traz ideia de contaminação e impureza. Ele altera a massa dando ideia
mentirosa sobre a essência do trigo. “Um
pouco de fermento leveda toda massa” (Gl 5.9). Assim como a massa deveria
ser integral, os corações e culto prestado a Deus também devem ser íntegros, “Lançai fora o velho fermento, para que
sejais nova massa, como sois, de fato, sem fermento. Pois também cristo, nosso
Cordeiro pascal, foi imolado. Por isso celebremos a festa na com o velho
fermento, nem com o fermento da maldade e da malicia, e sim com os asmos da sinceridade
e da verdade” (1 Co 5.7-8). Por causa
da simbologia do fermento, os pães não poderiam ser levedados.
Assim também com os animais. Trazer animais
defeituosos era uma forma de desprezar a Deus. “Quando trazeis animal cego para o sacrificardes, não é isso mal? E
quando trazeis o coxo ou o enfermo, não é isso mal? Ora, apresenta-o ao teu governador; acaso, terá ele agrado em ti e te será favorável? Diz o Senhor dos Exércitos” (Mal 1.8)..
Nossas ofertas não podem ser levadas,
com o fermento da hipocrisia, mas devem ser oferecidos com corações gratos e
voltados para Deus. Da mesma forma, devemos trazer o melhor de nosso rebanho e
colheita. É assim que Deus espera o culto de seu povo.
A questão motivacional
As ofertas deveriam ser resultantes
de um coração que se movia pela ação interna de Deus. Era o próprio Deus agindo
no coração do adorador. Em Ex 35.29 lemos: “Fala aos filhos de Israel
que me tragam oferta, de todo homem cujo coração o mover para isso, dele
recebereis a minha oferta”. Os
dízimos eram exigidos e determinados por Deus, mas deveriam ser entregues não
por obrigação e constrangimento, mas como ato de adoração. Coração de adorador.
Trazer oferta, como demonstra o texto estava intimamente relacionado aos afetos
provocados pelo próprio Deus no coração de seu povo.
Por isto lemos no Novo Testamento: “Cada um contribua, segundo tiver proposto no
coração, não com tristeza ou por necessidade; porque Deus ama a quem dá com
alegria” (2 Co 9.7).
Num mundo como o nosso, dominado pelo
desejo de posse e acumulo de bens, só poderão ser liberais com seus bens
aqueles que forem movidos pelo próprio Deus. Portanto, dízimos e ofertas estão
conectados com os afetos e desejo de adoração. Por estarem assim conectados, as
ofertas não eram obrigatórias, mas voluntárias. “Além dos sábados do Senhor,
e das vossas dádivas, e de todos os vossos votos, e de todas as ofertas voluntárias
que dareis ao Senhor” (Lv 23.38) Não havia nenhum instrumento legal
para obrigar, cultos devem ser espontâneos. Qualquer obrigatoriedade ou coerção
retira o aspecto litúrgico do adorador que o faz em amor. Ofertas sem o coração
são inúteis e ofensivas e a Deus.
O mesmo se dá ainda hoje. Não há
instrumentos litúrgicos, constitucionais ou coercitivos que obriguem um pastor,
presbítero, diácono ou membro de uma igreja a contribuir. Orienta-se, por uma
questão de lógica e bom senso, que uma pessoa que não contribui, não assuma posições
de liderança na igreja e não tome decisões sobre os recursos de uma igreja e
sua aplicação. Como alguém poderá discutir verbas, orçamentos, envio de
recursos missionários se ele mesmo não investe de seus recursos para a obra de Deus?
Quem não contribui, não deve discutir como o dinheiro será investido, por uma
questão de coerência.
Por isto, o espirito voluntário é
fundamental, pois sem esta liberalidade a oferta seria por constrangimento, o
que não permitiria verdadeira adoração.
“E veio todo homem cujo coração o
moveu e cujo espírito o impeliu e trouxe a oferta ao Senhor para a obra da
tenda da congregação e para todo o seu serviço, e para as vestes
sagradas” (Ex 35.21).
“Os filhos de Israel trouxeram
ofertas voluntarias ao Senhor, a saber, todo homem e mulher cujo coração os
dispôs, para trazerem uma oferta para toda obra que o Senhor tinha ordenado se
fizesse por intermédio de Moisés” (Ex 35.29).
Conclusão
Em todos estes princípios, torna-se
claro a importância das ofertas no ato de culto, por isto os sacrifícios e
oferendas faziam parte do culto judaico e fazem parte da liturgia da igreja primitiva
e das igrejas reformadas.
Nos
Princípios de Liturgia da Igreja Presbiteriana do Brasil, que regulamentam de
forma simplificada e objetiva o culto na Igreja, pode-se observar os seguintes elementos
do culto a Deus.
CAPÍTULO III – CULTO PÚBLICO – Art.7º –
“O culto público é um ato religioso, através do qual o povo de Deus adora
o Senhor, entrando em comunhão com Ele, fazendo-lhe confissão de pecados e
buscando, pela mediação de Jesus Cristo, o perdão, a santificação da vida
e o crescimento espiritual. É ocasião oportuna para proclamação da
mensagem redentora do Evangelho de Cristo e para doutrinação e congraçamento
dos crentes. Art.8º – O culto público consta ordinariamente de
leitura da Palavra de Deus, pregação, cânticos sagrados, orações e
ofertas. A ministração dos sacramentos, quando realizada no culto público, faz
parte dele”.
As
ofertas fazem parte da liturgia tanto quanto a leitura da Palavra, cânticos e oração,
e não há supremacia de um sobre o outro, apesar da Exposição da Palavra estar
no centro do culto reformado.
Ninguém aparecerá diante de mim com
mãos vazias”.
Culto envolve entrega, oferenda,
doação, e implica em custo, não constrangido, liberal e de boa vontade, com
espírito voluntário de quem tem o coração grato e reconhece Deus em todas as
partes de sua vida e por isto traz seu tempo, talento e seu tesouro, para
glorificar a Deus.
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