terça-feira, 23 de outubro de 2012

Mc 15.1-5 Meu nome é Pilatos


Sou um governador biônico, preposto do Império romano, e assumi o cargo político da Judéia, assumindo o lugar que era de Arquelau, sendo portanto, o V governador romano na Judéia, nomeado pelo imperador Tibério.

Assumir o meu trabalho aqui não foi algo muito fácil. Enviei um destacamento de soldados que entrou na cidade à noite, temendo reação da população, e eles levavam minha insígnia de governador, que foi considerado uma afronta para a liderança judaica. Constavam elas de águias de prata e pequenas imagens do imperador, que muito escandalizaram os judeus. No meu mandato mandei construir o aqueduto que trazia água à Jerusalém, uma obra monumental, mas estava sempre em rota de colisão com a liderança local. Certa ocasião, quando ainda estava me preparando para a mudança, fui visitar a cidade, e houve um grande tumulto em frente ao local onde me encontrava. Para conter a rebelião, enviei soldados disfarçados para o meio da população, e aos poucos eles foram localizando os amotinados e começaram a matança, dispersando a multidão.

Eu sabia que minha tarefa seria árdua, por isto me tornei uma pessoa dura, de disposição inflexível e obstinado. Era violento no meu gênio. Certa vez, enfurecido, mandei matar um grupo de amotinados galileus e mandei os soldados misturarem o seu sangue com o sangue dos sacrifícios. Eu fui colocado para fazer

Eu sou daquele tipo de líder que se promove, não pelos méritos, mas pelos conchavos e negociatas. Eu geralmente entro numa reunião com alvos definidos, negocio qualquer coisa pelo sucesso, por um cargo político ou por uma posição social. Vou me mantendo pela pusilanimidade do caráter, participando de festas e programações que me promovam. Eu estou sempre negociando.

Agora, no cargo que tenho, pensava em viver uma vida de mordomias, já que estou numa região bem longe de Roma, e das intrigas palacianas. O povo judeu é complicado, mas já aprendi lidar com sua cultura, religião e costumes. Estava indo muito bem na sua função, mas recentemente fui confrontado com questões que me abalaram profundamente, porque envolvem questões espirituais, com as quais nunca me preocupei. Me trouxeram para o julgamento um homem estranho, sereno, mas acusado pelo Sinédrio, o Supremo Tribunal Religioso de Israel, por afirmar que é o Messias e que também é Filho de Deus. Honestamente, não queria estar nesta questão, meramente política. Mas minha função exigia meu parecer final e conclusivo.

Você já esteve numa situação como esta? Sabe o que é certo, mas a pressão é muito forte, e de repente, dá parecer apenas para agradar os outros, não considerando princípios, valores e consciência?

Deixe-me falar um pouco sobre minha trajetória política:

Eu me tornei governador romano na Judéia no ano 26 d.C. Estamos ainda no meu 7º ano de meu mandato. Como magistrado e governador, eu legislo em nome de Roma. Apenas eu, tenho o poder de pronunciar sentenças capitais.

Recentemente me trouxeram um homem chamado Jesus, que se apresenta como Messias. Ele é um homem muito querido das classes populares, milhares de pessoas o seguem, falam de coisas extraordinárias sobre ele. Muitas pessoas já foram curadas, inclusive alguns oficiais romanos de grande respeito entre nós. Apesar disto tudo, movido por inveja, os líderes religiosos o acusaram de blasfêmia, e queriam matá-lo. Isto seria resolvido facilmente em outros tempos, porque pela lei judaica, alguém sob esta acusação, seria levado para a praça pública e apedrejado, mas desde que Roma governa sobre esta província, a pena capital só pode ser proferida pela magistratura, e esta é uma tarefa que está nas minhas mãos. Só eu tenho competência para julgar. Só eu tenho poder para condenar e absolver.   Por isto os líderes judaicos disseram-me: “a nós não é licito matar ninguém”(Mc 15.10), e eles estavam certos. Eu sabia que por inveja os principais sacerdotes o haviam entregado. Bastava o meu veredito e ele seria absolvido (Mc 15.10).

Mas precisamente aí se encontra o meu dilema. Eu teria que tomar posição firme contra o povo judeu, e receber pressão política de todos os níveis, ou matar este pobre homem. Entre minha consciência e minha popularidade, optei pela segunda.

Eu tentei argumentar com os líderes, e mesmo com a multidão, que insuflada pelo Sinédrio gritava tresloucadamente: crucifica-o! crucifica-o! Eu não consigo entender: Na semana passada esta cidade foi tomada por uma manifestação e muitas destas pessoas cantavam pelas ruas: “Hossana ao que vem em nome do Senhor!”, e jogavam palmas, e até mesmo roupas, para que este Jesus, montado em um jumentinho, pudesse passar.

Um incidente bizarro, e assustador também me aconteceu: Minha mulher, normalmente recatada e que não interfere em assuntos do meu governo, enquanto eu julgava este Jesus, mandou-me um recado por um dos meus criados de confiança dizendo-me: “Não te envolvas com este justo; por hoje, em sonho, muito sofri por seu respeito”(Mc 27.19). Isto me abalou profundamente. Seria algo sinal dos céus? Alguma divindade queria me mandar alguma mensagem? Assim tenho vivido e agonizado em dor por este homem, que sequer conheço.

O meu drama por ser sintetizado assim:

1.      Não agi por princípios, nem por minha consciência, antes por desejo de aclamação e reconhecimento público.

2.      Eu temi as consequências políticas de meu ato. Oh! Como somos tolos. Não agimos por princípios, mas por impulsos; nem por convicções, mas por reputação. Eu sabia que eles mentiam, mas deram cunho político ao evento. Disseram que ele estava pervertendo a nação, vedando pagar tributo a César, e afirmando ser Ele o Cristo, o rei. Quando a nossa legislação romana afirma que só César pode ser chamado de rei.

3.      Minha sentença foi de absolvição: “Não vejo nele crime algum”(Lc 23.4); mas minha atitude foi de condenação. Eu disse àquela liderança inescrupulosa: “Tome, aqui está o o vosso rei!” Eu sabia qual a consequência disto. Eu matei um justo, eu fui responsável direto pela sua execução, apesar de ter feito um drama ali. Hipocritamente lavei minhas mãos numa bacia, e disse que estava livre do sangue deste justo! Na verdade não estava: Eu podia fazer algo e não fiz. Eu podia livrá-lo, e o condenei. E ainda por cima ordenei que o espancassem.

4.      Encontrei uma brecha legal: Ao saber que era Galileu, portanto, da jurisdição de Herodes; eu, que nem sequer conversava com este político hediondo, o conduzi ao julgamento. Herodes, que não vale a roupa que veste, mau caráter e inescrupuloso; teve mais escrúpulo que eu, porque não quis assumir a responsabilidade sobre sua vida. E lá estava eu, mais uma vez, com este homem.

5.      Quando retornou do encontro com Herodes, quis novamente arrazoar com os líderes judaicos, considerando que não via nele qualquer razão para que o mesmo fosse condenado. Aqui está o meu grande dilema: Eu tinha que optar, eu tinha que assumir a vida deste homem, eu tinha que tomar uma decisão, mas optei pelo que julgava a linha menos comprometedora. Como eu estava enganado!

Nada, porém, me assustou tanto, quanto ouvir daquele homem, humilde, sereno e firme, olhar nos meus olhos e dizer:

O meu reino não é deste mundo. Se o meu reino fosse deste mundo, os meus ministros se empenhariam por mim, para que eu não fosse entregue aos judeus, mas o meu reino não é daqui” (Jo 18.36). Isto penetrou profundamente na minha alma, afinal, de que reino estava falando. Pelo que entendi, eu não fazia parte deste reino. E se este reino realmente existir?

Finalmente este homem adentrou um universo de ideias que eu nunca havia cogitado. Ele se declarou “Filho de Deus!”. Ao ouvir tal declaração, fiquei atônito e fui consumido de um imenso temor reverente (Jo 19.7-8). Mas a minha pusilanimidade, não me permitiu tomar qualquer posição firme.
 
No ano 36 d.C., agi, como sempre fazia em situacoes assim, com muita violência num caso que envolvia um lunático fazendo promessas para seguidores de Moisés em volta do Mte Gerizim, enviei meus soldados para a região, dando ordem para matar quem não se submetesse, e foi o que aconteceu. Muitos foram barbaramente assassinados. diante disto, enviaram uma carta a Tibério César, pedindo para que eu deixasse a minha jurisdição, e outra pessoa me substituísse. Tibério aceitou o requerimento, e retornei para Roma, mas enquanto voltava, Tibério subitamente morre.
 
Ao chegar em Roma, meus vínculos políticos se tornaram frágeis demais, e sem alianças necessárias, me auto exilei em Viena.
Ali, na minha solidao e abandono político, dei cabo da minha vida.
Mas, a questão que sempre me perseguiu e ecoava na minha mente foi aquela que fiz à multidao: "Que farei de Jesus, chamado Cristo?" Morri sem saber quem ele foi de fato, mas com a sensação de que, minha omissão, e a incapacidade de saber o que fazer de Jesus, foram os maiores equívocos da minha vida. Na minha vida, estas coisas espirituais nunca foram muito claras, mas eu sempre tive a impressão de que aquele erro jamais poderia ter sido cometido. Eu estava lidando com verdades eternas...

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