Ingratidão
e injustiça.
Gn 40.23
Introdução:
Existem algumas palavras que começam com a
letra “i” e que são “insuportáveis”, por causa de seus resultados. São elas:
“Imposição, inveja, ignorância, intolerância, invasão, indiscrição”. José
experimentou algumas coisas bem duras na sua história: Ingratidão, injustiça e
indiferença. Ele teve que lidar com estas coisas não apenas uma vez.
Sofreu a indiferença dos seus irmãos quando o
venderam como escravo para os Amalequitas, que posteriormente o revenderam aos Egípcios;
Sofreu a injustiça na casa de Potifar, quando
foi condenado mesmo tendo sido fiel;
Experimentou a ingratidão do copeiro chefe,
que apesar do pedido de José, o ignorou completamente, e só se lembrou dele por
causa de um incidente que veio dois anos depois, com o sonho de Faraó, caso
contrário, continuaria no mesmo lugar.
O problema é que todas estas atitudes têm o
poder de nos neutralizar para sempre:
Se formos vitimados pela indiferença dos
outros e nos abatermos por isto, corremos o risco de morrer existencial, sermos
incapazes de amar; Se formos vitimados pela injustiça e não superarmos o que
nos fizeram, nos tornarem vítimas do infortúnio e eternamente amargos; Se a
ingratidão nos abater, corremos o risco da tristeza e do ressentimento.
Ao olharmos a vida de Jose, vemos que ele
experimentou tudo isto, no entanto, soube responder a todas estas provocações
de forma madura. Ele conseguiu sair livre, no meio de todas estas amargas
experiências. Como ele fez isto?
- José perdoou seus
ofensores
– Sua maior dor, sem dúvida, foi a de ter sido vendido, ainda adolescente,
pelos seus próprios irmãos. Fico imaginando que sonhos pode ter alguém com
17 anos. Seus planos e fantasias de ser alguém na vida, certamente já
haviam passado pela sua mente. Talvez já estivesse observando alguma
garota de uma aldeia vizinha. Todos os seus planos são desfeitos e jogados
no lixo. Ele é vendido, sem qualquer direito, perde o nome da família,
suas referências pessoais, distancia-se do pai e dos confortos de uma vida
doméstica. Agora é levado como animal, exposto numa feira para ser
avaliado e negociado como boi.
José tinha todas as razoes do mundo para ser
uma pessoa eternamente desgraçada, remoendo-se na sua amargura. Ele, no
entanto, optou por perdoar. Talvez imaginasse que nunca mais os veria, mas a
dinâmica da vida os trouxe a este inquietante reencontro.
Muitos acham difícil perdoar, mas considere o
risco de não perdoar. As perdas que o perdão traz são incomparavelmente menores
que as perdas do “não-perdão”. Muitas enfermidades e dores nos advém pelo fato
de não perdoarmos. Perdoar é liberar
o outro, mas é também nos liberar. Certa mulher que fora traída pelo seu
marido, depois de muita dor, revolta dos filhos e desestrutura familiar, disse
ao seu marido: “eu preciso perdoar prá gente continuar vivendo”.
Quando nasceu o primeiro filho de José, ele
colocou um nome sugestivo: “Manassés”, cujo significado é “Deus me fez esquecer de todos os meus trabalhos e de toda a casa de
meu pai” (Gn 41.51). Ao colocar este nome, ele estava fazendo uma
declaração de alforria e libertação de sua alma.
- José relacionou
os eventos desconexos de sua história à soberania de Deus – Muitas vezes não
somos capazes de superar a insensibilidade, injustiça e ingratidão, porque
não conseguimos encontrar significado neles. E eventualmente, são tão
caóticos e difusos que realmente somos incapazes de fazer as conexões
necessárias.
Quando não somos capazes de ver o eterno atrás
do temporal, nos perdemos; quando não conseguimos distinguir Deus nos eventos
comuns ou caóticos, a história se torna sem sentido.
Foi isto que aconteceu com Salomão. O início
de seu reinado foi marcado por uma profunda intimidade e dependência de Deus,
mas com o passar dos anos, ele foi se distanciando de Deus, e já na sua velhice
escreveu um texto que tenho chamado de “proto-existencialismo”, porque é o
primeiro texto da história que fala de forma tão cruel de como a vida pode ser
sem significado. Salomão começa o livro afirmando: “Vaidade de vaidades, diz o pregador, vaidade de vaidades, tudo é
vaidade” (Ec 1.2). Quando falamos de vaidade, pensamos na idéia de pessoas
que gostam de se vestir bem, mas a idéia original que estava na mente de
Salomão era de que a vida não possuía um sentido maior. A palavra “hebhel” em
hebraico dá a idéia de falta de significado nas coisas. Este foi o pensamento
que trouxe desespero a toda uma geração de intelectuais na virada do Século XIX
para o Século XX, e que ainda hoje influencia profundamente a forma de pensar
do homem contemporâneo.
A vida tem sentido, existe um significado
maior nas coisas que nos acontecem? Quando não distinguimos Deus nos eventos da
nossa história, nossa vida se torna sem sentido e nossa perspectiva
secularizada. Por esta razão, Riobaldo, personagem central do clássico: “Grande
sertões, veredas”, faz uma afirmação dramática para o caos da sua própria vida:
“Há que se encontrar um norteado prá esta doideira que é a vida”. O que ele
afirma é o que está implícito em nosso coração. Sem Deus, os eventos são
despropositais, e sua história se torna sem qualquer sentido.
Quando distinguimos Deus na história, mesmo
quando os fatos são desconexos, lembramos que há propósito, sentido e direção
na nossa história, afinal “todas as
coisas, juntamente, cooperam para o bem daqueles que amam a Deus, daqueles que
são chamados segundo o seu propósito” (Rm 8.28). Quando os irmãos de José
estão perplexos com a revelação que José faz depois de mais de 20 anos, é José
que faz os links dos eventos da injustiça, traição, ingratidão. “Vós intentastes o mal, mas Deus transformou
o mal em bem, como hoje vedes” (Gn 50.20).
- José não usou sua
história de injustiça e descaso para punir seus algozes, mas para abençoar
vidas. O
que vemos na sua vida é uma compreensão de que, o uso da vingança e do mal
não é a forma mais sábia. José resolveu seguir o caminho da graça, do
perdão e da reconciliação.
É de Victor Frankl, fundador da logoterapia a
famosa frase: “Não posso decidir o que farão comigo, mas posso decidir o que
farei com aquilo que me fizerem. A regra é simples. Eu não posso determinar o
comportamento dos outros, mas posso decidir qual será o meu comportamento.
É muito importante observar que o mesmo sol
que amolece a cera, endurece o barro. Muitas pessoas quando passam pela dor
nunca mais se recuperam. A dor se dor a explicação da miséria de sua vida,
passam a remoer-se como uma catraca velha e gasta na sua engrenagem, em torno
do problema. A dor se torna o centro de sua vida. Nunca mais se recuperam. Outras
pessoas, no entanto, transformam sua dor em algo construtivo.
Muitas ONGs e associações foram criadas por
causa de uma dor pessoal. Quando pessoas vendo-se injustiçadas, por um sistema
ou determinada estrutura, e transformam sua luta pela libertação por causa da experiência
de dor que viveram. Transformam o sofrimento em caminho para a generosidade e
humanidade. Já viram pessoas que se transformaram em grandes médicos com
destaque em determinadas áreas porque alguém de sua família morreu em decorrência
daquela enfermidade? São pessoas que transformaram a dor em um instrumento, não
para punir e vingar seus algozes, mas
para ser benção na vida de outras pessoas.
Muitos lamentavelmente vivem patinando na sua
dor.
O Sl 84.5,6 afirma: “Bem aventurado o homem cuja força está em ti, em cujo coração se
encontram os caminhos aplanados, o qual, passando pelo vale árido, faz dele um
manancial, de bençãos o cobre a primeira chuva”. O salmista fala de pessoas
que em tempos de aridez, geram vida, que atravessam pela dor e não ficam
lamentando a falta de chuva, a escassez de alimentos nem o terreno que não produz,
pelo contrario, faz deste vale seco, um manancial de bençãos.
O que você faz com sua dor?
Vive em torno dela, se auto martirizando,
reclamando das injúrias, remoendo-se na ingratidão e na injustiça, ou torna-se
uma pessoa que reage no meio das trevas, das cinzas, do deserto e das lagrimas,
transformando o sofrimento em meio para se promover o bem e abençoar o mundo?
Conclusão:
A história de José é a história do Evangelho.
Sua vida aponta para a vida de Cristo. Ninguém sofreu tanta injustiça,
humilhação e indiferença como ele. Como ele reagiu?
A Bíblia diz que Jesus é o “varão de dores”.
Em Hebreus 4.15 lemos que ele foi tentado em todas as coisas, sem pecar. Seu
sofrimento não se tornou mero sofrimento, mas tinha uma intenção clara.
Na hora da ceia, Jesus toma o cálice e ora ao
Pai dando graças e em seguida diz aos seus discípulos: “Isto é o meu corpo que é dado por vós, fazei isto em memória de mim”. Como
agradecer o pão que aponta para seu sofrimento? Como dar graças pelo corpo que
será esmagado? Para Jesus, sua dor não parava na dor, não era dor por dor, mas
possuía intencionalidade.
Sua vida foi de vitória, apesar de aparente
fracasso.
- Ele
perdoou seus algozes: “Pai,
perdoa-lhes, porque não sabem o que fazem”.
- Jesus
relacionou os fatos ao propósito de Deus para sua história. Seu sacrifício
não é vão, é expiação; a cruz não é vitória de Satanás, é propósito de
Deus; sua dor não é mero sofrimento, é redenção. Deus estava realizando
nele seus propósitos na história. Você consegue distinguir o mover de Deus
na sua vida?
- Jesus
viu sua dor como meio, não como um fim em si mesma.
Como você tem lidado com a injustiça e a
ingratidão. Ter os olhos postos em Deus faz toda diferença. “Porque estou bem certo de que nem a morte,
nem a vida, nem os principados, nem as coisas do presente, nem do porvir, nem
os poderes, nem a altura, nem a profundidade, nem qualquer outra criatura
poderá separar-nos do amor de Deus, que está em Cristo Jesus , nosso
Senhor” (Rm 8.38-39).
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