Introdução
Este é
um texto de memórias:
O
apóstolo Paulo escreve esta carta a uma igreja sofrendo graves reveses e lutas.
Ele procura demonstrar como foi a
experiência do povo de Deus no passado, e lhes alerta para evitarem o
procedimento equivocado de seus pais.
O
aprendizado humano acontece por algumas vias.
A. Reflexão - Ao olhar a vida, considerar a natureza, ouvir
as pessoas, fazer leituras, estudar... assim o ser humano vai coletando
informações, pensando nelas, aprendendo a julgar ou a acatar. A reflexão é uma
grande fonte de conhecimento e aprendizado.
B. Imitação ou contraste – Aprendemos vendo como a vida
funciona, na base de erros e acertos. Vemos pessoas errando, tomando decisões
equivocadas, enveredando por caminhos de morte e destruição, eventualmente na
convivência familiar e decidimos fazer o contrário; ou observamos procedimentos
de integridade, retidão, pureza e caráter, e decidimos imitar. Aprende-se por
imitação, fazendo o mesmo que outras pessoas fazem; ou por contraste, deixando
de fazer o que os outros fazem. Imitação ou contraste. Vemos pessoas fazendo as
coisas certas e queremos imitá-las, ou vemos pessoas fazendo as coisas erradas
e procuramos nos afastar delas.
C. Experiência – Esta é a pior
forma de aprendizado. Ignoramos todos os sinais e advertências, todas as
bandeiras vermelhas, e decidimos fazer do nosso jeito. Já viram adolescentes
dizendo: “Deixe eu viver a minha vida e errar também”. Isto é burrice, não
precisamos sofrer as mesmas consequências desastrosas de outras pessoas,
podemos evitar o perigo e o sofrimento.
Às vezes não aprendemos nada, de
ninguém. A Bíblia chama tais pessoas de insensatas
ou néscias.
Uma lição da história: Belsazar
Este rapaz é um exemplo disto que
estamos falando.
Ele é filho de um famoso
imperador, Nabucodonozor (Babilônia), que invadiu Jerusalém (587 a.C.). Este
conquistador, se tornou arrogante e prepotente, o poder tomou conta de seu
coração, e no auge de sua glória teve um surto esquizofrênico que durou 7 anos,
vivendo como animal, isolado do palácio e das pessoas.
Belsazar viu seu pai passar por
toda esta situação, mas não aprendeu nada... ele não entendeu que aquilo era
juízo de Deus contra a arrogância de um homem que achava que tinha o poder nas
mãos. Daniel o confronta por não ter aprendido as lições da história: “Tu Belsazar, que és seu filho, não
humilhaste o teu coração, ainda que sabias tudo isto” (Dn 5.22).
Em outras palavras: viu, mas não
aprendeu...
O que Paulo tenta fazer neste
texto é evocar algumas lições da história para advertir a igreja a não andar
pelo mesmo caminho pecaminoso. Todas estas exortações possuem relação com o
livro de números, que registra a conquista de Canaã, a terra prometida.
Algumas exortações:
1. Não cobicemos as coisas más que eles cobiçaram - (1 Co 10.6). Em Nm 11.5 vemos como o povo de Deus cobiçou
a antigo estilo de vida que tinham quando ainda estavam no Egito. “Lembramo-nos dos peixes que, no Egito,
comíamos de graça; dos pepinos, dos melões, dos alhos silvestres, das cebolas e
dos alhos”.
Eles desejavam coisas que não
tinham.
O décimo mandamento é a cobiça, e
pensamos na cobiça ligada ao adultério, mas a cobiça possui um leque bem mais
abrangente.
“Não cobiçarás a casa do teu próximo. Não cobiçarás a mulher do teu
próximo, nem o seu servo, nem a sua serva, nem o seu boi, nem o seu jumento,
nem coisa alguma que pertença ao teu próximo” (Ex 20.17)
Cobiça é o desejo doentio de ter
o que o outro tem. Não só sua mulher, mas suas posses, seus animais, ou qualquer
coisa, como sucesso, dinheiro, talento. O problema é que a cobiça é sempre
mordaz e voraz – Ela sempre deseja o lugar do outro e o transforma em
concorrente.
2. Não vos façais idólatras – (1 Co 10.7). No livro de números vemos como a idolatria
sempre fascina o povo de Deus. Por definição, ídolo é tudo aquilo que ocupa o
lugar de Deus: pessoas, posses, riquezas, saúde, filhos.
Talvez porque a idolatria seja uma
propensão pecaminosa do coração humano, o primeiro mandamento, é “Não terás outros deuses diante de mim”. O
que acontece com o ídolo? Você começa a pensar que não pode viver sem ele,
achar que nem Deus é tão interessante, mas o objeto de meu desejo, sim. Uma
paixão pode se tornar idolátrica, já que dá a impressão de que não se pode
viver sem o que se deseja. A Bíblia afirma que “a avareza é idolatria”. Você pensa que não pode viver sem o
dinheiro, por isto retém, não doa, não desfruta dele, não é abençoado.
Para você detectar os falsos
deuses do seu coração, pergunte a si mesmo: “O que eu amo, desejo, temo, anseio, mas que a Deus?” Este
substituto de Deus é ídolo.
3. Não pratiquemos imoralidade – (1 Co 10.8). Vivemos dia de moral frouxa e valores em
crise. De forma curiosa e diabólica, somos encorajados à infidelidade,
estimulados a dar vazão aos desejos carnais e aspirações pecaminosas.
Antes de Caim matar seu irmão
Abel, Deus se aproximou dele para tratar do seu coração. Algo estava errado. Caim
estava abatido e irado, e isto era perceptível no seu rosto. O que Deus lhe diz
é muito significativo: “Por que andas
irado, e por que descaiu o seu semblante? Se procederes bem, não é certo que
serás aceito? Se, todavia, procederes mal, eis que o teu pecado jaz à porta; o
seu desejo será contra ti, mas a ti cumpre dominá-lo” (Gn 4.7).
Deus tenta demonstrar para Caim
que seu desejo poderia se tornar numa armadilha, como de fato o foi, porque
logo em seguida ele chama seu irmão para o campo e o mata. “Seu desejo será contra ti, mas a ti cumpre dominá-lo”. O seu
grande e obsessivo desejo de hoje, pode se tornar a sua destruição amanhã. Isto
vai desde o desejo por riqueza, taras, paixões, fama, obsessões, etc.
A Bíblia nos desafia a “não praticar imoralidade”, que
originalmente vem da palavra “porneia”, que
tem uma gama muito grande de abrangência.
Paulo se refere à maldição de
Baal Peor. Balaão, famoso macumbeiro da região, não conseguiu sucesso na sua
magia contra o povo de Deus, e então deu uma sugestão maligna. Ele contratou
prostitutas, filhas dos moabitas, para seduzir os “rapazinhos crentes” do
arraial, e estes jovens foram atraídos à imoralidade. Uma praga veio sobre
Israel, algo fatal e contagioso, e 24 mil pessoas morreram por causa disto (Nm
25.1-9).
4. Não ponhamos o Senhor à prova – (1 Co 10.9). Provavelmente uma referência a Nm
20.1-3 e 21.4-7.
Apesar de todas as manifestações
e intervenções de Deus na história daquele povo, eles sempre estavam
insatisfeitos com Deus e queriam pedir a Deus uma prova de seu cuidado.
Este é um perigo atual.
Achamos que Deus precisa ser
testado...
Quando perdemos o controle da situação,
ou algo de errado nos acontece, culpamos a Deus e o ameaçamos de “perder a fé”,
se ele não fizer como esperamos. Ficamos sempre colocando o Senhor à prova.
Se você é deste tipo, deixe-me
ser direto: Deus não precisa provar nada a ninguém. Deus surge na Bíblia sem
uma apresentação. Em Gn 1.1 lemos: “No
princípio criou Deus os céus e a terra”. Ele não se explica, não diz quem
é, nem de onde surgiu, se foi criado ou não, nem apresenta cartão de visitas.
Ele simplesmente se manifesta.
Tomemos cuidado para não
julgarmos constantemente a Deus. A atitude mais certa é de submissão e de
servidão...
5. Não murmureis – (1 Co 10.10). O povo de Deus vivia num constante problema de
murmuração, reclamando daquilo que Deus fazia e contra a liderança de Moisés. O
problema da murmuração é que ela sempre expressa desconfiança e
descontentamento com Deus e é resultante da falta de fé. Em números o povo de
Deus está sempre murmurando:
i.
Murmuração
por causa da insegurança no deserto – “Até
quando me provocará este povo e até quando não crerá em mim, a despeito de
todos os sinais que fiz no meio deles” (Nm 14.11).
ii.
Murmuração
por causa do maná – “Lembramo-nos das
peixes que, no Egito, comíamos de graça; dos pepinos, dos melões, dos alhos
silvestres, das cebolas e dos alhos” (Nm 11.5).
iii.
Murmuração
contra a liderança de Moisés – “Basta!
Pois que toda a congregação é santa, cada um deles é santo!” (Nm 16.3).
Esta murmuração transformou-se na revolta de Coré, Datã e Abirão.
A importância dos exemplos
A própria Bíblia nos ensina
porque os exemplos são importantes: “Estas
coisas lhes sobrevieram como exemplos e foram escritas para advertência nossa” (1
Co 10.11). O objetivo era a nossa instrução.
Três advertências precisam ser
mencionadas:
Primeira, cuidado com a sensação de segurança – “Aquele, pois, que pensa estar em pé, veja que não caia” (1 Co
10.12).
Este alerta é fundamental.
Muitas vezes achamos que os
outros fazem, mas nós não. Somos hábeis em criticar as atitudes do povo de Deus
no deserto, mas temos considerado a possibilidade de estarmos agindo da mesma
forma?
Isto se aplica ainda à facilidade
que temos em julgar pessoas que caíram moralmente. A Bíblia adverte: “Aquele que pensa estar em pé, veja que não
caia!” O povo de Israel não era pior, as pessoas que escorregam na sua vida
espiritual não são piores que nós. Estamos no mesmo nível... cuidado com o
julgamento...
Segunda, Resista à tentação, com a graça de Deus
a.
Nenhuma tentação é irresistível - “Não vos sobreveio
tentação que não fosse humana”. A tentação é sempre uma
experiência pesada, porque ela atinge os desejos humanos que foram corrompidos pela
queda, e tem o poder de despertar o lado mais sombrio e decadente da natureza
pecaminosa. Ed René Kivitz afirma que “tentação é o encontro do pior que há em mim
com o pior de todos os seres”. Suas sombras e trevas mais sombrias podem
desabrochar se a graça de Deus não sustentar.
b.
Deus não permite tentação além de nossas forças - “Deus é fiel e não permitirá que sejais tentados além de vossas
forças” Diante disto, a pergunta é: “Se
não somos tentados além das forças, porque caímos?”. A resposta é: Porque
alimentamos a carne, porque fortalecemos o velho homem e a natureza pecaminosa,
porque não queremos resistir à tentação. “O
seu desejo será contra ti, mas a ti cumpre dominá-lo”.
Isto nos mostra que, em algum
nível, a tentação pode ser neutralizada.
O problema é que ao invés de
“fugirmos da paixões mundanas”, geralmente a nutrimos. “Revesti-vos do Senhor Jesus Cristo e nada disponhais para a carne no
tocante às concupiscências (Rm 13.14). Uma outra tradução deste texto diz o
seguinte: “Não façais provisão para a
carne”.
Ilustração
Sou apaixonado pelos programas
que mostram pessoas tentando sobreviver em ambientes hostis, com parcos
recursos. Às vezes é frio, chuva, neve, solidão, e eles precisam fazer fogo,
entretanto, esta tarefa não é nada fácil. Para isto é necessário que “haja
faísca”, é preciso encontrar “material propício para a combustão”, e “precisam
de lenha para preservar a chama”.
É exatamente assim que acontece
com a paixão, com o desejo, e com a tentação.
Não a alimente...
Não dê faísca...
Não jogue lenha na fogueira...
Não nutra a voracidade de sua
carne e sua concupiscência (desejo estragado ou pervertido), se você nutrir,
sua tentação o dominará por completo.
c.
Deus provê livramento - “Pelo
contrário, juntamente com a tentação vos proverá livramento, de sorte que a
possais suportar” (1 Co 10.13).
O segredo é correr para Deus, se
colocar debaixo de sua cruz, clamar pelo sangue. Admita o pecado do seu
coração, reconheça que você corre risco. Lide com a concupiscência como de fato
ela é “desejo estragado ou mal direcionado”. Reconheça que algo está cheirando
mal, estragou. Pessoas crentes caem quando não percebem o perigo da alma. Só a
graça operando vai nos dar o livramento de sorte que possamos suportar o
pecado.
A cruz de Cristo tem poder.
O Sangue nos liberta.
Deus pode proteger os pés da
queda, livrando-nos do lamaçal, da corrupção do coração, dando horror ao pecado
e desejo de santidade. Se você permitir que suas tentações, aliadas à corrupção
do seu coração tomem forma, você vai tropeçar, machucar, entregar seus anos a
cruéis e ferir a santidade do Deus que habita em você.
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