Introdução:
Vimos no estudo anterior que o zelo é insuficiente (Gl
1.14), e a tradição é inoperante (Gl 1.14). Ao estudarmos este texto, outras
verdades se tornam evidentes:
- Estratégias humanas são falíveis – “... mas em particular, aos que pareciam
de maior influência” (Gl 2.2). Paulo, como bom obreiro, fez alguns
planos, estabeleceu metas, apenas para descobrir posteriormente, que
apesar de todas elas parecerem tão bem estruturadas, ele estava na direção
errada. Ele achava que se alcançasse as pessoas de maior influência no
campo missionário, seu ministério seria mais produtivo. Lamentavelmente
não foi o que aconteceu.
No vs 6 ele diz:
“E, quanto àqueles que pareciam ser de maior
influência (quais tenham sido, outrora, não me interessa; Deus não aceita a
aparência do homem), esses, digo, que me pareciam ser alguma coisa, nada me
acrescentaram” (Gl 1.6).
Sua estratégia
estava absolutamente errada.
Seus planos se
mostraram inconsistentes e equivocados.
Não é assim que
tantas vezes acontece conosco?
- As opiniões humanas são equivocadas – Paulo sofre neste texto uma pressão do grupo, dos seus colegas
de ministério e membros da igreja. Ao chegar em Jerusalém, um grupo de
cristãos judaizantes estavam pressionando os novos crentes a circuncidarem,
provavelmente uma referência a Tito, que era grego.
A grande tentação
dos irmãos da Galácia foi acrescentar novos elementos ao evangelho, adicionar
um novo elemento litúrgico, teológico ou ético. Não é assim ainda hoje? Não é
raro encontrarmos pessoas querendo validar o Evangelho mas estabelecendo
algumas condições que o Evangelho nunca impôs, quanto a usos e costumes,
alimentos, bebidas, etc.
Veja como estes
elementos são comuns ainda hoje:
·
Se você não é batizado no Espírito Santo, com evidências
de falar em outras línguas, ainda não é crente...
·
Se você não leu a confissão de fé de Westminter você
ainda não sabe o que é Evangelho...
·
Ritos externos: se você cortar o cabelo... usar calça
comprida... assistir TV.
·
Se você não participa do G12...
·
Comportamentos religiosos: lista de coisas por fazer:
vir à igreja, trazer os dízimos, ler a bíblia diariamente, jejuar...Deus não
pode amar você se não tem estes hábitos, dizem estes...
·
Quebra de maldição hereditária: Se você teve um
ancestral envolvido com feitiçaria ou mediunidade, você precisa participar de
um ritual de quebras de maldição para sair do poder do diabo, caso contrário
esta maldição antiga pode ainda estar dominando sua vida e você ainda pode
estar dominado por sua herança espiritual.
Sobre isto é bom
considerar:
o
Maldição e benção são termos jurídicos, tem a ver com
a lei. É uma declaração forense. “...porventura
tendo ele prometido não o fará? Ou, tendo falado, não o cumprirá? Eis que para
abençoar recebi ordem; ele abençoou, não o posso revogar” (Nm 23.19,20).
o
Não creio em maldição hereditária para crentes, pois a
Palavra afirma: “Aquele que está em
Cristo, nova criatura é; as coisas antigas se passaram, eis que tudo se fez
novo” (2 co 5.17). Portanto, uma pessoas que se encontra coberto pelo
sangue de cristo, regenerada, lavada pelo sangue do cordeiro, não pode abrigar
maldição, pois isto seria uma contradição.
o
É perigoso atribuir este pensamento mágico e atribuir
poderes a determinados “super crentes” que possuíam determinadas prerrogativas
de quebrar as maldições. Isto nos faz depender de alguma coisa, além da cruz e
do Evangelho.
Muitas atitudes
são importantes, outras se parecem muito espirituais, mas elas não nos levam ao
Evangelho, e podem distorcê-lo e até nos levar a desviar (Col 2.20-23). Estas
ideias normalmente constrangem a igreja de Cristo, como fizeram a Paulo, pela
atitude incisiva, intensidade e ênfase (Gl 2.3) e podemos ter a impressão de
que estamos fazendo algo errado, mas Paulo afirma que tais pessoas estavam
intrometendo em suas vidas, para novamente reduzi-los à escravidão da lei (Gl 1.4),
e que se fizessem isto, a verdade do Evangelho perderia a força em suas vidas
(Gl 1.5). Por que? Porque a partir deste momento passariam a depender destes
rituais ao invés de depender da graça de Deus que vinha da cruz.
A resposta de Paulo:
A atitude de
Paulo foi direta.
Ele decidiu não
aceitar estas pressões porque elas desviavam seus olhos do Evangelho e da plena
suficiência da cruz. Paulo diz: “nem por
uma hora” (Gl 2.5) Porque se você ceder, ainda que em pequena escala, terá
a impressão de que realmente precisa delas.
As armadilhas da Lei:
A partir de
então, Paulo passa a demonstrar que a lei possui alguns fascínios, e tais
coisas podem ser verdadeiras armadilhas para nossa vida. “Ó gálatas insensatos! Quem vos fascinou a vós outros, ante cujos olhos
foi Jesus Cristo exposto como crucificado?” (Gl 3.1). Por ter esta “atração fatal” é que a
Lei está sempre nos fazendo retroceder e esquecer do poder do Evangelho.
Paulo demonstra
algumas destas armadilhas aqui neste texto:
- É mais fácil entender a lei de forma mental que na prática- A Igreja de Jerusalém e seus líderes mais importantes, foram
solícitos quando Paulo falou do plano missionário. Ele foi até mesmo
encorajado. Tiago, Cefas e João, reputados colunas, estenderam a destra de
comunhão, e lhe deram a benção para seguir adiante no projeto (Gl 2.9). Aparentemente tudo estava certo. Veja o
exemplo dos apóstolos, a visão do ministério e da missão, quando souberam
que a graça havia sido estendida aos gentios (Gl 2.7). Nenhuma dúvida, Deus
os estava enviando...
Entretanto vamos
observar que tal conhecimento era meramente intelectual.
Eles não sabiam
quão difícil isto seria, na prática teológica, trazer os gentios para o meio deles.
Quando tiveram que lidar com a realidade recuaram de forma grotesca e anti
cristã, e não conseguiram traduzi-la para a vida. “Quando, porém, Cefas veio a Antioquia, resisti-lhe face a face, porque
se tornara repreensível” (Gl 2.11). Quando vieram para a “prática da graça”, esta “inclusividade”
(termo que uso com muito cuidado por causa dos seus desdobramentos teológicos
atuais), se lhes tornou escandalosa, e eles voltaram aos rudimentos religiosos,
achando que havia certa superioridade religiosa, cultural ou moral dos judeus,
porque eram uma nação eleita.
Aplicação:
Isto tem
desdobramentos enormes na nossa atual teologia.
A tradição
religiosa está fincada no princípio do mérito e da retribuição. Pessoas
religiosas acreditam, num nível bem profundo, que a salvação tem a ver com
méritos e justiça pessoal. Se fizermos algo Deus vai se agradar de nós... Temos
que dar algo para sermos aceitos... Precisamos fazer coisas para Deus para
sermos amados por ele...
Na prática,
É mais fácil
entender o evangelho mentalmente, que emocionalmente.
2. A lei e o peso da tradição – Outro ponto pesa
é a tradição. Como ela é forte sobre nossas vidas... Antes de chegarem os
irmãos de Jerusalém, gentios e judeus viviam em plena comunhão. Não havia
crise, mas bastou que um grupo viesse de lá, para que a atitudes deles mudasse
radicalmente.
Pedro foi o
primeiro.
Paulo trata esta
realidade de forma dura: “Quando, porém,
Cefas veio a Antioquia, resisti-lhe face a face, porque se tornara
repreensível”. (Gl 2.11)
O que levou
Paulo a tomar uma posição e admoestar Pedro tão severamente?
Muitas vezes não
entendemos o que está acontecendo no texto bíblico, mas a realidade é que
“Paulo jogou duro com Pedro”.
O que tornou
Pedro sujeito a tão severa repreensão, “feita assim na cara”?
Pedro retrocedeu
para pior.
Ele voltou atrás
na compreensão do Evangelho. Paulo é ainda mais incisivo ao dizer que eles
dissimularam e não estavam mais andando “corretamente,
segundo a verdade do Evangelho” (Gl 2.14). A ausência da graça o tornara
repreensível. A lei e o peso da tradição
ainda estavam presentes.
A ausência da
lei nos torna repreensível e neste caso, por isto Paulo repreende a Pedro de
forma tão severa.
3 A
lei e o problema da aparência – “Com
efeito, antes de chegarem alguns da parte de Tiago, comia com os gentios;
quando, porém, chegaram, afastou-se e, por fim, veio a apartar-se, temendo os
da circuncisão” (Gl 2.12).
O resultado
espiritual é trágico: Hipocrisia, cinismo, e dissimulação.
Se o Evangelho
não está ocupando o centro da vida, passo a viver constantemente preocupado com
o julgamento das pessoas e o que dirão a meu respeito, e isto me torna dissimulado.
Dissimulação é viver
dando impressão de que somos uma coisa quando somos outra. Dissimulação não nos
permite fraqueza, quebrantamento e arrependimento. O que passa a interessar é a
opinião das pessoas, e não o que Deus diz a meu respeito.
O Pastor Glênio
Paranaguá contou a experiência de uma conhecida pregadora nordestina, ardorosa
defensora da confissão positiva no Brasil, uma linha teológica que afirma que a
palavra da fé cura, e que precisamos rejeitar a doença, entendendo que o crente
verdadeira não pode ficar doente, porque Deus não tem este propósito para seu
povo. Uma dia, porém, enferma, foi levada ao hospital e internou-se com um nome
falso. Quando um médico cristão a reconheceu ela afirmou que fez isto para não ser
incomodada pelas pessoas, mas que, na verdade ela não podia admitir, para seus próprios
seguidores, que ela estava enferma e precisava de cuidados médicos.
Uma teologia
equivocada traz graves efeitos colaterais, porque suas afirmações não são sustentáveis...
4. A lei e o
desencanto da alma – “...a ponto de o próprio Barnabé ter-se deixado levar pela dissimulação deles”. Este texto revela o desencanto, frustração e tristeza de Paulo ao ver
que até seu discipulador, aquele homem que foi seu referência na vida cristã e
no ministério, não resistiu a pressão da lei e se enveredou pelo fascínio da
lei e da admiração externa, passando a viver de forma que negava o Evangelho.
5. A lei precisa
ser questionada constantemente pelo Evangelho – “Quando, porém vi, que não procediam
corretamente segundo a verdade do evangelho” (Gn 2.14).
Uma outra tradução
afirma que eles estavam “perdendo o evangelho”.
É fácil perder o
evangelho.
A Igreja da
Galácia tinha apenas 30 anos de existência, mas já estava se desvirtuando e
passando da graça de cristo para outro evangelho (Gl 1.6). Precisamos sempre estar perguntando: “O que o evangelho
ensina sobre este assunto”?
Não são apenas
os descrentes que rejeitam a graça de Deus, mas o povo de Deus costumeiramente também
o faz.
O problema é
grave, porque se eu esquecer a essência do Evangelho, isto é, a graça de Cristo
sobre minha vida, e que nada mais pode ser acrescentado a isto, transformo
Cristo em ministro do pecado (Gl 2.17) e ignoro o poder de sua morte (Gl 2.21).
Conclusão:
- Não aceitar a pressão da lei – “nem por uma hora”. Não há espaço para concessões.
- Não se iludir com a aparência - Entender
que precisamos do favor de Deus antes que o dos homens, e que não atitude
viver e fazer as coisas exteriormente. Para Deus não conta apenas o que
fazemos, mas porque fazemos o que fazemos.
- Esteja alerta! A lei possui um
enorme poder de sedução, e por isto pode facilmente nos atrair e nos pegar
novamente... cuidado para não voltar aos rudimentos. “Para a liberdade foi que Cristo nos libertou, permanecei, pois, firmes
e não vos submetais, de novo, a jugo de escravidão” (Gl 5.1).
Samuel Vieira
Chácara do Billy Fanstone - Anápolis, Go
31. jan 2003
Refeito em 2017
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