Introdução:
O Evangelho não é romântico!
Os seguidores de Jesus nunca
foram enganados por falsas promessas de uma vida paradisíaca. Na verdade, seu
chamado é até mesmo repulsivo:
“Sereis minhas testemunhas”, cuja palavra no grego é martirion. Os discípulos de Cristo foram
chamados para a morte. Que chamado poderia ser menos atraente que este?
Noutro lugar Jesus diz: “Se alguém quiser vir após mim, negue-se a si
mesmo, tome a sua cruz e siga-me”. Somos uma geração que luta pela
afirmação do eu, da supremacia do ego, para o empoderamento. Quem poderia se
sentir atraído para negar o eu?
Os falsos pregadores da teologia
da prosperidade, vendem um falso evangelho, que gera uma vida de mentira. Jesus
não chama discípulos para uma vida de vitória a todo tempo, para recompensa
imediata, mas para o sacrifício, doação, entrega e, se necessário morte. Os
pregadores da auto ajuda, pouco entendem da mensagem da cruz, do
arrependimento, da confissão e do chamado cristão.
Mais uma vez, Jesus fala neste
texto, com grande realismo, sobre a vida em si: “Estas coisas vos tenho dito para tenhais paz em mim. No mundo passais
por aflições, mas tende bom ânimo; eu venci o mundo” (Jo 16.33).
Deste texto aprendemos algumas
lições:
Primeira, Ninguém está isento de aflições: “No mundo passais por aflições...”
Crentes e descrentes passam por
grandes lutas. A vida é uma batalha. Os inimigos são visíveis e invisíveis,
reais e imaginários, temos luta por dentro e por fora, batalhas concretas e
distorções de leitura. Ninguém está isento da tribulação.
As aflições podem ser de natureza
espiritual. A Bíblia descreve Satanás como adversário das nossas almas. Embora
não consigamos identificar e discernir todas as lutas que enfrentamos, muita
depressão, angústia e medo, estão relacionados a ações malignas.
Muitas aflições são de natureza
física. Vivemos num mundo caído, e a possibilidade de enfermidades, doenças,
patogenias, são presentes a todo tempo. Recentemente acompanhei a história de
uma pessoa, com 46 anos de idade, que teve uma infecção na boca, foi levado ao
hospital, e esta infecção causou uma espécie de septicemia, também conhecida
como sepse, uma resposta exagerada a uma infecção no corpo, que causa
disfunção orgânica, acompanhada de febre, diminuição da pressão arterial,
respiração acelerada e confusão. Poucas horas depois ele não resistiu e
morreu.
Muitas aflições são emocionais. O
quadro é imenso: Depressão, ansiedade, angústia, síndrome de pânico, distúrbios
neurológicos e psiquiátricos, fobia, culpa, solidão.
Temos ainda as aflições de
natureza relacional. Sofremos por causa de problemas familiares, conflitos
intermináveis, famílias quebradas, acusações, traição, injustiça, infidelidade.
O aumento de divórcio tem deixado marcas terríveis no coração das pessoas,
dores nos filhos que não sabem como lidar com a fragmentação da família,
depressões em adolescentes. Há muito sofrimento causado por causa de
relacionamentos malfadados e mau resolvidos.
As aflições podem estar
relacionadas às finanças. Pessoas que enfrentam o desemprego, contas para
pagar, boletos que não são quitados. Muitos sofrem por serem desequilibrados e
gastarem mais do quem ganham, por não fazerem planejado adequado para situações
de emergência, e quando as parcelas do cartão, e os financiamentos vão chegando
sem terem provisão para quitação, isto traz acusação, culpa e irritabilidade.
Quando Jesus estava encerrando o Sermão
da Montanha, ele falou das duas casas, com fundamentos distintos: uma
construída sobre a rocha, outra sobre a areia. Em ambas, “caiu a chuva, transbordaram os rios, sopraram os ventos e deram com
ímpeto”. Se você ler atentamente observará, que não há diferença entre o
que acontece numa e noutra casa (Mt 7.24-27). Ambas sofrem com a violência da natureza.
O que fez a diferença foi o fundamento. A que estava construída sobre a rocha,
subsistiu; a que estava sobre a areia, ruiu.
As aflições vem sobre justos e
injustos. Ninguém está isento da dor. A fé cristã não elimina a dor, embora
ilumine a dor. A presença de Cristo no barco, não nos livra do temporal, ainda
que nos leve a lugar seguro. Apesar de Lázaro ser amigo de Cristo, isto não
impediu que ele morresse, embora ressuscitasse posteriormente. As irmãs de
Lázaro, sofreram a dor do luto do irmão ainda jovem, que provavelmente era o
provedor da casa.
Ninguém está isento de aflições.
Não podemos nos esquecer, porém, que a aflição é cheia de lições graciosas.
Deus usa as aflições para revelar o que se passa em nosso coração (Dt 8.2-5).
Deus sempre revela sua graça, conforto e consolação na aflição. “ainda que eu ande pelo vale da sombra da
morte, não temerei mal nenhum, porque tu estás comigo”, e acima de tudo,
devemos lembrar que sofrimento é uma coisa passageira. O apóstolo Pedro afirma
que podemos “por breve tempo, sermos
contristados por várias provações” (1 Pe 1.6). Por isto, na aflição, devemos nos voltar para
Deus, exercitar nossa fé, descansar em Deus.
Segunda, Aflições devem ser enfrentadas com coragem e fé - “No
mundo passais por aflições, mas tende bom ânimo”.
Jesus exorta seus discípulos a
terem “bom ânimo”, quando enfrentassem as provações. Não é muito fácil termos
“bom ânimo”, quando as circunstâncias e as pessoas tiram de nós o ânimo e o
entusiasmo.
Muitas vezes nos assustamos e nos
sentimos desencorajados em relação à vida. Sobra-nos o medo, falta-nos coragem.
Uma atitude boa em relação ao problema é o que diferencia a vitória do fracasso
diante dos embates. Jesus pede que mantenhamos o bom ânimo.
Bom ânimo ajuda-nos a ver as coisas
numa perspectiva melhor. Muitos dos nossos problemas são imaginários, ou
maiores do que realmente os consideramos. Às vezes o fato em si é menor do que
os sentimentos projetados sobre eles. Ao lidar com medo e ansiedade, precisamos
colocar os dados sobre a mesa e indagar se, a forma como os vemos é uma
perspectiva real. O Salmista reconhece que sua aflição estava distorcendo os
fatos. “Então disse eu: isto é a minha
aflição; mudou-se a destra do Altíssimo” (Sl 77.10). Uma ótica errônea nos
leva a análises equivocadas.
Paul Meyers afirma que, apesar de
ser um empresário, ele nunca conseguia ficar ansioso, e para vencer sua
ansiedade ele usava três filtros:
1. Todos os fatos estão sobre a
mesa?
2. Eu realmente quero me preocupar
com isto?
3.
É biblicamente aceitável preocupar-se? Em outras palavras,, Deus me
autoriza a ficar ansioso?
A verdade é que “há mais prejuízo
decorrente da preocupação do que o motivo que a causou” (Meyers[1],
pg 258).
Lembre-se, “No mundo passais por aflições, mas tende bom ânimo”.
Terceira, aflições devem passar pelo prisma de Cristo – “Eu venci o mundo”.
Ao fazer esta declaração, Cristo
nos convida a olharmos para sua vida e obra. Ele passou por muitas provações. O
autor aos hebreus afirma que ele foi “tentado
em todas as coisas, à nossa semelhança, mas sem pecado” (Hb 4.16), e por
isto somos lembrados de que, “naquilo que
ele mesmo sofreu, tendo sido tentado, é poderoso para socorrer os que são
tentados” (Hb 2.18).
Apesar de todas as tribulações
sofridas, ele venceu.
Aflições não podem nos derrotar.
A fé e a coragem firmadas em Cristo podem nos fortalecer para enfrentar cada
uma das batalhas que temos diante de nós. Depois da morte vem a ressurreição;
depois do temporal, a bonança; o choro pode durar a noite inteira, mas a alegria
vem pelo amanhecer.
Paulo declara que “em Cristo, somos sempre conduzidos em
triunfo” (2 Co 2.14). Se cremos num Deus soberano, amoroso e poderoso, as
provações e aflições nunca saíram do seu controle. Ele tem um plano para cada
uma destas situações, embora nem sempre entendamos no momento da dor, para que
serve aquele sofrimento. Nossa vida não é conduzida por acasos, nem eventos
descoordenados e caóticos, mas pela mão poderosa de um Deus que, no fim das
contas, “sempre nos conduz em triunfo”. A dor não é fracasso, a aflição não nos
define, somos de Deus, amados por Deus e conduzidos por Deus.
Quando temos esta compreensão, a
dor assume um significado muito maior. Precisamos de uma correta teologia da
dor e da aflição, caso contrário sempre nos sentiremos órfãos e irritados com
Deus por aquilo que passamos.
Conclusão
Antes de falar das provações que
seus discípulos haveriam de enfrentar, Jesus faz uma afirmação interessante: “Estas coisas vos tenho dito para que tenhais
paz em mim. No mundo passais por aflições, mas tende bom ânimo, eu venci o
mundo”.
Observaram a primeira afirmação
de Cristo?
“Estas coisas vos tenho dito para que tenhais paz em mim”.
Antes de entrar na discussão
sobre a realidade implacável das aflições, Jesus desejava ensinar sobre a realidade
maravilhosa da paz.
A Bíblia fala da “paz que excede todo entendimento” (Fp
4.7).
O grande problema vida não são as
aflições que enfrentamos, mas a forma como enfrentamos as aflições. Alguns
enfrentam com coragem a dor e a injustiça, outros entram num quadro de
amargura, murmuração e até mesmo de blasfêmia, diante da dor.
Jesus afirma: “Estas coisas vos tenho dito para que tenhais
paz em mim.” Há uma paz que sobrepuja toda eventual aflição. Ela não tem a
ver com a situação, mas com o coração. Serenidade é um estado de espírito,
desespero também o é. Jesus não queria que seus discípulos ouvissem apenas a
segunda parte deste versículo, mas os convida a refletirem essencialmente sobre
a primeira parte.
A paz de Deus nos dá força para
vencer os medos que se instalam dentro de nós! Não dá para viver com medo, ser
guiado por temores. Toda aflição é momentânea, aquele que está em Cristo passa
pelo vale da sombra da morte, e ainda neste lugar tenebroso, contempla o
horizonte da fé e da graça, porque o Senhor o conduz pela mão. A paz de Jesus
cria condições para a serenidade diante dos conflitos. Nos conflitos, ele
encontra a oportunidade de desenvolver a sua confiança. O socorro sempre virá.
Não estamos sozinhos. A paz de Jesus é a capacidade, dada pelo Espírito Santo,
para lidarmos com os problemas.
“Estas coisas vos tenho dito para que tenhais paz em mim.” Não é uma
paz porque as coisas estão favoráveis, ou porque não há problemas. A paz é
encontrada em Cristo. Ele é a nossa paz. A paz em Cristo não tem nada a ver com
ausência de aflições, mas a presença dele mesmo, por meio do seu Espírito, em
nossas vidas.
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