Introdução
Toda virada de ano ouvimos a
mesma expressão: “Que seus desejos possam se realizar no próximo ano”. Uma
famosa música afirma: “Que tudo se realize, no ano que vai nascer. Muito
dinheiro no bolso, saúde prá dar e vender”.
Todo ser humano abriga desejos. O
propósito de Deus na nossa vida é atender nossos desejos? Este é o seu plano
para nossa vida? O ser humano é ávido por desejos, satisfações atendidas.
Neste texto, Jesus pergunta duas
vezes a diferentes pessoas:
ü No vs 21, foi uma conversa com a
mãe de seus discípulos Tiago e João, Filhos de Zebedeu: “Que quereis?”. Ela tinha um desejo no coração, e daqui a pouco
falaremos sobre este desejo, e Jesus a leva a verbalizar seu desejo.
ü No vs 32, agora conversando com
dois cegos de Jericó, Jesus lhes pergunta: “Que
quereis que eu vos faça?”. Eles tinham um anseio profundo na sua alma, e
Jesus os leva a verbalizar.
Se Jesus lhe perguntasse hoje: “O
que você quer que eu te faça?”, o que você responderia? Qual é sua mais
profunda aspiração e desejo?
Este texto nos ensina algumas
coisas importantes sobre nossos desejos e aspirações:
Primeiro, nem todo desejo e aspiração é legitimo. Nossos desejos podem estar
contaminados.
Temos aqui duas pessoas diferentes
expressando seus desejos:
De um lado, a mãe de Tiago e
João.
É até mesmo assustador seu pedido
narcisista, egoísta e auto-centrado.
Aparentemente sua atitude foi espiritual,
porque antes de pedir, diz o texto que ela o adora: “adorando-o, pediu-lhe um favor” (Mt 20.20). Isto demonstra que
mesmo nossas orações travestidas de piedade e uma atitude correta diante de
Deus, podem nos levar a fazermos solicitações absurdamente vaidosas.
O que ela pede:
“Manda que, no teu reino, estes meus dois filhos se assentem, um à tua
direita, e o outro à tua esquerda” (Mt 20.21).
Ajoelhada ela faz um pedido, nada
pretencioso, não é...? Apenas um “pequeno pedido”.
Considere como nossos pedidos
podem estar profundamente contaminados. O que desejamos para nós e nossos filhos?
Podemos desejar coisas que fazem parte da nossa cobiça, motivos interesseiros,
orgulho, frutos da cobiça e anseios auto promocionais, que nos tragam glória
pessoal.
Tiago afirma:
“De onde procedem guerras e contendas que há entre vós? De onde, senão
dos prazeres que militam na vossa carne? Cobiçais e nada tendes; matais, e
invejais, e nada podeis obter, viveis a lutar e a fazer guerras. Nada tendes,
porque não pedis; pedis e não recebeis, porque pedis mal, para esbanjardes em
vossos prazeres” (Tg 4.1-3).
Nem todo desejo que temos é
legítimo! Alguns que desejos que temos podem nos levar à morte.
Uma das expressões mais pesadas
da Bíblia sobre o povo de Deus no Antigo Testamento se encontra no livro de
Salmos. Ali vemos o que Deus fez com o desejo pecaminoso do povo: “concedeu-lhes o que pediram, mas fez
definhar-lhes a alma” (Sl 106.15). Deus deu. Seus desejos foram atendidos.
Mas o resultado? O desejo deles foi a causa de sua morte. Eles queriam comer
carne, por isto murmuraram e blasfemaram contra Deus, e quando receberam o que
tanto ansiavam, estavam tão ávidos que morreram de gulodice.
Sua prosperidade financeira pode
ser um sinal da benção de Deus sobre sua vida, mas pode igualmente destruí-lo.
Seu desejo de aceitação humana, popularidade, glória pessoal, estas coisas que
aspiramos tanto, podem nos destruir.
Por outro lado, temos aqui um
desejo legítimo.
Dois homens cegos, vivendo numa
situação de pedintes, na beira da estrada. Retrato de homens e mulheres sem
condições de sobrevivência, que ao ouvirem falar de Jesus, clamam por ele.
Jesus lhes pergunta: “Que quereis que eu
vos faça?” (Mt 20.31), e eles dizem:
“Senhor, que se nos abram os olhos”.
Este desejo genuíno, profundo,
gera no coração de Deus uma sensibilidade maravilhosa: “Condoído, Jesus tocou-lhe os olhos” (Mt 21.34). Existem desejos
profundos em nossas almas, que precisam ser ditos a Jesus. Jesus tem interesse
real em nos atender e nos socorrer. Estes desejos geram sensibilidade no
coração de Deus.
Segundo, nem sempre o que você pede é o que realmente você quer
A pergunta de Jesus parece até
mesmo anacrônica, diante de dois cegos que clamam no meio da multidão. Que quereis que eu vos faça?” Não parecia óbvio demais que Jesus sabia o
que eles queriam? Por que Jesus faz questão de que eles expressem seus desejos?
Muitas vezes, estamos cegos, mas
queremos viver na situação de cegueira. Muitas vezes estamos doentes, mas
queremos continuar na realidade de doença. Muitas vezes estamos no pecado, e
não queremos sair do pecado. Por isto Jesus pergunta: O que você realmente
quer? É isto mesmo? Muitos dos nossos fracassos são marcados por nossa
impotência, mas muitas vezes, por nossa acomodação ao erro, repetição de
atitudes auto destrutivas. Você deseja ser curado? Esta foi a pergunta que
Jesus fez ao coxo, no tanque de Betesda.
Existe um comportamento humano
conhecido pelos terapeutas que se chama “cortina de fumaça”. As pessoas falam
das coisas superficiais, mas que encobrem o problema mais profundo. O que vem à
tona é o sintoma, mas o que está por detrás de tudo que está sendo dito?
Veja por exemplo o que acontece
com o nosso equivocado desejo de ser feliz “a todo custo”. Somos uma geração
que gosta de dizer que vai fazer determinada coisa, porque deseja ser feliz. Mesmo
quando tentamos mostrar que aquilo não será bom, a resposta mais simplista é:
“Eu tenho o direito de ser feliz”. Então, muitos se julgam no direito de viver
uma vida de pecado, “porque tenho o direito de ser feliz”. Desobedecem a Deus, porque
se julgam no direito de ser feliz”.
Este é o desejo do homem: ser
feliz.
Ele, porém, não entende que seu
maior desejo deveria ser a glória de Deus. Somente quando fazemos a vontade de
Deus podemos ser felizes. Como afirma o Catecismo Maior das igrejas reformadas:
“O fim principal do homem é glorificar a Deus e gozá-lo para sempre”. Seu fim
principal não é o seu prazer, nem mesmo a sua felicidade, mas a glória de Deus.
E quando você glorifica a Deus, você encontrará a felicidade.
O que acontece com nosso
equivocado desejo de ser feliz?
Interiormente acreditamos que
felicidade, e não santificação, deve ser o nosso alvo. O problema é que
felicidade não deve ser um fim em si mesmo, nem um alvo a ser conquistado.
Felicidade não é alvo, mas consequência.
É fácil entender isto quando comparamos
felicidade ao sono.
Se você tentar dormir pensando em
dormir, você não conseguirá dormir. Para dormir, você precisa esquecer que
precisa dormir, e quando isto acontece, você relaxa e dorme. Se tentar dormir
dizendo: “eu preciso dormir, eu preciso dormir”, o resultado será insônia.
Assim acontece com a felicidade.
Muitos dizem: “eu preciso ser
feliz”, e saem em busca da felicidade, mas ela nunca é encontrada. Porquê?
Porque felicidade não é alvo, é consequência. Quando sua vida alinha com o
propósito de Deus na sua vida, você encontra alegria real e profunda.
Então, qual é o seu desejo? O que
você realmente quer?
Pv 1.18 afirma: “Tal é a sorte de todo ganancioso. E o
espírito de ganância tira a vida de quem o possui”. Seu desejo pode ser a
causa de sua destruição. Quando Caim entrou em conflito com Deus, ele ouve as
seguintes palavras: “Se procederes bem,
não é certo que serás aceito? Se, todavia, procederes mal, eis que o pecado jaz
à porta; o seu desejo será contra ti, mas a ti cumpre dominá-lo” (Gn 4.7).
Deus procura mostrar a Caim que
seu desejo seria a causa de sua morte. Nossos impulsos, desejos, nos destroem
se não prestarmos atenção. Para que lado tem se inclinado os seus desejos?
Então, neste sentido não podemos dizer: “Que tudo se realize no ano que vai
nascer”. Deveríamos dizer, “que algumas coisas não se realizem no ano que vai
nascer”.
Terceiro, nem sempre o que você quer, lhe dará satisfação.
O problema de nossa visão é que,
quase sempre achamos que Deus é contra nosso prazer e alegria, quando na
verdade é o contrário. O desejo de Deus é nos dar todo prazer, nele.
Por isto criamos ídolos, os
substitutos de Deus, em quem colocamos a esperança de encontrar felicidade e
satisfação, que suprirão nossos desejos. São coisas e pessoas que amamos,
desejamos e quase adoramos, considerando que podem nos fazer felizes. Mas na
verdade, o desejo do nosso coração é muito maior do que aquilo que nós,
externamente acreditamos e achamos que podem nos satisfazer.
C. S. Lewis, no seu livro, o peso
da glória afirma:
“Se eu encontro em mim um desejo
que nenhuma experiência desse mundo possa satisfazer, a explicação mais
provável é que eu fui feito para um outro mundo...Se nenhum dos meus prazeres
terrenos é capaz de satisfazê-lo, isso não prova que o universo é uma fraude.
Provavelmente os prazeres terrenos não têm o propósito de satisfazê-lo, mas
somente de despertá-lo, de sugerir a coisa real. Se for assim, tenho de tomar
cuidado para, por um lado, jamais desprezar ou ser ingrato em relação a essas
bênçãos terrenas, e, por outro jamais confundi-lo com outra coisa, da qual elas
não passam de um tipo de cópia, ou eco, ou miragem”.
Sobre a relação entre a glória
divina e a felicidade humana. Ele ainda afirma:
“Na realidade, se considerarmos
as promessas pouco modestas de galardão e a espantosa natureza das recompensas
prometidas nos evangelhos, diríamos que nosso Senhor considera nossos desejos
não demasiadamente grandes, mas demasiadamente pequenos. Somos criaturas
divididas, correndo atrás de álcool, sexo e ambições, desprezando a alegria
infinita que se nos oferece, como uma criança ignorante que prefere continuar
fazendo seus bolinhos de areia numa favela, porque não consegue imaginar o que
significa um convite para passar as férias na praia. Ficamos muito facilmente
satisfeitos”.
Traduzindo C. S, Lewis, John Piper
afirma: “O problema não é o desejo de felicidade, mas que nos contentamos com
bolinhos de areia quando nos é prometido o paraíso”.
Blaise Pascal, matemático e
filósofo cristão fez a seguinte afirmação:
“Todos os homens buscam a
felicidade. Isso não tem exceção. Seja qual forem os diferentes meios que
empreguem, todos eles tendem a esse fim. A causa de alguns irem à guerra e de
outros evitá-la está no mesmo desejo em ambos, com diferentes visões. A vontade
nunca dá o menor passo a não ser com esse objetivo. Esse é o motivo de toda
ação de todo homem, mesmo daqueles que se enforcam”. (Pensées, 45).
Então, como sabiamente afirmou C.
S. Lewis, nosso problema não é que queremos estar satisfeitos, mas nosso desejo
de estar satisfeito é muito fraco. Nem sempre o que você quer, e deseja
profundamente, é o que lhe dará satisfação.
Conclusão
Diante destas verdades, sugerimos
três aplicações:
1. Avalie o que você deseja. Se
Jesus perguntasse hoje: “O que queres que eu te faça”, o que você responderia?
Avalie seus desejos.
2. Seja claro no que você quer.
Quando Jesus pergunta aos cegos eles respondem: “Senhor, que se nos abram os olhos”. Diga a Deus. É este o desejo
mais profundo do seu coração?
3. Considere que seu desejo mais
profundo pode não ser o que você pede. Sua insatisfação e descontentamento pode
ter raízes mais profundas que precisam ser iluminadas por Jesus.
Por isto,
o pedido dos cegos é tão importante: ““Senhor,
que se nos abram os olhos”.
Este
pedido sugere que o desejo deles era de que uma nova e profunda compreensão da
vida e deles mesmo acontecesse, que seus corações saíssem das trevas, e percebessem
as coisas, que eles pudessem interagir com a luz e com as trevas e saber
discernir entre elas, que houvesse clareza e percepção nos seus julgamentos,
que pudessem andar livremente sem tropeçar, que pudessem ver a luz, que seus
olhos fossem abertos.
Que queres
que eu te faça?
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