quarta-feira, 21 de junho de 2017

Sofonias: Quatro maneiras de se aproximar de Deus?




Sofonias foi um dos profetas que viveu quase nos dias em que Jerusalém foi tomada pela Babilônia. Apesar de não sabermos exatamente quando ele viveu, suas profecias rondam pelos anos 630-609 a.C., e Jerusalém foi invadida em 598 a.C., portanto, ele viveu cerca de 10-30 anos antes da queda. Ele deve ter ouvido os rumores de guerra que rondavam uma região quando algum grande exército estava se aproximando. A situação da cidade, certamente, se tornava quase impossível de se sustentar, de tanta tensão. Os babilônios, como geralmente acontecia com grandes impérios, faziam grandes arrastões, deixando atrás de si uma legião de órfãos e milhares de mortos.

Sofonias era homem de Deus. Ele percebia espiritualmente as causas de tamanho fracasso do povo de Deus. Apesar dos insistentes apelos de Deus ao arrependimento, o povo se recusava a mudar. a situacao espiritual do povo era lamentável, atingindo todos os setores da sociedade: Executivo, judiciário e religioso (Sf 3.3-4). Profetas e sacerdotes, pastores e padres, todos, estavam na mesma situação moral lamentável. 

A relação do povo com Deus estava profundamente abalada. Os profetas pré-exílicos estavam constantemente clamando ao povo para que voltasse a Deus, se arrependessem de sua idolatria e seus pecados, se convertessem. Entretanto, os clamores eram vazios. A rebeldia, obstinação, desobediência, marcavam aquela geração. Nada mudava.

Sofonias descreve em rápidas palavras, as quatro formas equivocadas do povo em relação a Deus:

1.     Espiritualidade sincrética – “Os que sobre os eirados adoram o exército do céu e os que adoram ao Senhor e juram por ele e também por Milcom” (Sf 1.5). A adoração a Deus era idolátrica e confusa. Adoravam o exército do céu, uma referência à adoração aos astros, aos ídolos babilônicos tão mesclados com misticismo relacionado aos astros. A astrologia era muito aceita entre estes povos do oriente.

É interessante observar, que entre a adoração eles mesclavam Yahweh e Milcom. O primeiro, o Deus das alianças no Antigo Testamento. O nome mais sagrado entre o povo judeu. O segundo, um deus canaanita. O texto afirma que adoravam ao Senhor e também Milcom. Uma enorme confusão de divindades.

O Deus das Escrituras Sagradas, porém, nao divide sua glória com ninguém. Por isto Elias exortava o povo de Israel no seu tempo: "Até quando coxeareis entre dois pensamentos? Se Baal é Deus, segui-o; se Yahweh é Deus, segui-o" (1 Rs 18.21). Jesus diz a mesma coisa: "Não podeis servir a dois senhores..." (Mt 6.24).

2.     Apostasia – “Os que deixam de seguir ao Senhor, e os que não buscam ao Senhor, nem perguntam por ele” (Sf 1.6). Se no primeiro cenário há um grupo sincrético, no segundo vemos um cenário de apostasia, pois eles “abandonaram a Deus e nem sequer perguntavam mais por ele”. Deus havia sido abandonado. O texto não afirma que deixaram de crer, eles ainda mantinham certos pressupostos sobre Deus. Eles, contudo, pararam de " seguir". Obedecer a Deus, fazer sua vontade, não cabia mais no estilo de vida que adotavam.


3.     Indiferença – O terceiro grupo é o dos “...que não buscam ao Senhor, nem perguntam por ele” (Sf 1.6). Isto é, Deus não fazia parte da cultura e da conversa daquele povo. Deus fora esquecido.

A indiferença e a frieza, são muito comuns aos nossos corações. Simplesmente esfriamos o coração e nos distanciamos da sua presença. Na maioria das vezes isto ocorre de forma paulatina e gradual. Esfriamos na comunhão, não lemos a Palavra, não temos mais desejo de orar, nos distanciamos do povo de Deus, a indiferença toma conta do nosso coração. Não o buscamos nem perguntamos por ele.

4.     Secularismo – “...dizem no seu coração: O Senhor não faz bem, nem faz mal” (Sf 1.12). Este é outro grupo igualmente complicado. Não é que eles questionassem a existência de Deus, antes criam que Deus era ausente da vida terrena. Deus não intervém na história.

Um exemplo clássico de secularismo pode ser encontrado no relato da destruição de Sodoma e Gomorra. Quando os anjos anunciam a Ló que Deus destruiria a cidade, ele logo procurou sua esposa, filhas e futuros genros para dizer o que estava para acontecer (Gn 19). Vocês acham que isto gerou quebrantamento e arrependimento no coração daqueles jovens? Pelo contrário, o texto afirma: “Acharam, porém, que ele gracejava com eles” (Gn 19.14). Eles acharam que era uma gozação, uma piada, ou uma brincadeira de mau gosto do sogro. Afinal, desde quando Deus intervém na história da humanidade?

O secularismo, lamentavelmente, pode atingir efetivamente o coração do povo de Deus.
Creio que o fato de orarmos tão pouco, e das reuniões da igreja serem tão esvaziadas, se deve ao fato de não acreditarmos que Deus “realmente” ouve nossas orações e que elas gerem algum efeito na história humana e na nossa vida pessoal.

Não descremos de Deus, mas intimamente achamos que ele “não faz bem nem mal”. Curiosamente em nenhum destes cenários vemos pessoas negando a existência de Deus. Não existe um ateísmo conceitual, eles não negam a realidade de Deus, mas vivem como se ele não existisse.

Aplicações:
Diante deste cenário, o que Deus fala ao seu povo?

A.   Deus o convida a auto-reflexão: “Concentra-te e examina-te” (Sf 2.1). Deus convida o seu povo a pensar neste quadro, a repensar seus conceitos sobre Deus e sobre a sua forma de agir na história. Kierkegaard afirma que “uma vida não analisada não é uma vida digna de ser vivida”.

Precisamos considerar nossa história. Não nos descuidarmos de tudo isto que o povo de Israel estava vivendo. Infelizmente não há muita diferença entre a espiritualidade daquele povo e a nossa. Ou achamos que estamos em momento diferente?

B.    Deus chama seu povo a buscá-lo – “Buscai o Senhor, vós todos os mansos da terra, que cumpris o seu juízo; buscai a justiça, buscai a mansidão, porventura  lograreis esconder-vos no dia da ira do Senhor” (Sf 2.3).
Nossa espiritualidade é superficial, precisamos admitir que buscamos pouco a face de Deus, embora Deus constantemente desafie seu povo: “Buscar-me e me achareis quando me buscardes de todo coração”. “Buscai o Senhor enquanto se pode achar, invocai-o enquanto está perto” (Is 55.6).

Estranhamente o povo pagão e os místicos tem buscado recursos esotéricos. Não são poucos pagãos que consagram suas vidas a rituais e sacrifícios que requerem alto nível de consagração. Veja as exigências do paganismo, e como tais religiosos se consagram aos seus sacrifícios. Assim como nos dias de Jesus, os magos saem do Oriente para se encontrar com Jesus porque “viram uma estrela no Oriente”, enquanto os escribas e sacerdotes que lidam diariamente com a palavra de Deus, são indiferentes aos acontecimentos na pequena vila de Belém, que ficava a apenas 10 kms de Jerusalém. Nem sequer se dão o cuidado de verificar se aquilo que ouvem tem validade.

C.    Deus reafirma seu juízo – “Está perto o grande Dia do Senhor; está perto e muito se apressa. Atenção! O Dia do Senhor é amargo, e nele clama até o homem poderoso” (Sf 1.14). Sofonias está ouvindo o rufar dos tambores. Profeticamente anuncia uma tragédia que aconteceria 10-20 anos depois. O juízo de Deus estava chegando. “Atenção!”, não descuide! Não brinque! O Senhor vem.

O conceito do Dia do Senhor é declarado várias vezes em Sofonias, que é também chamado de “O profeta do Dia do Senhor”.  O juízo de Deus veio. A hora chegou. Mas apesar do anúncio profético, o povo de Deus não se arrependeu, nem lamentou sua situação e destruição.

D.   Deus reafirma sua misericórdia – Este é o outro aspecto dialético da mensagem de Sofonias. O dia do juízo é uma realidade, mas Deus deseja anunciar também o dia da redenção. A nota final do profeta do “Dia do Senhor”, é de júbilo e redenção.

Tanto o juízo quanto a misericórdia se deram.

O juízo veio cerca de 20 anos depois, quando Jerusalém foi saqueada e destruída. O juízo de Deus chegou sobre aqueles que achavam que “Deus não fazia bem nem mal”, e que haviam se esquecido de Deus.

A misericórdia foi anunciada pelo profeta, mas ele não viu seu cumprimento. Apenas 70 anos depois a palavra de Deus dita pelo profeta Jeremias se cumpriria. O povo de Deus retornaria do cativeiro. Mas aquela geração só viu o juízo, não viu a misericórdia.

Buscar ao Senhor, e voltar para ele, é uma forma de escaparmos do seu juízo iminente. É a única forma de vivenciarmos antecipadamente sua graça.

O Senhor, teu Deus, está no meio de ti, poderoso para salvar-te; ele se deleitará em ti com alegria; renovar-te-á no seu amor, regozijar-se-á em ti com jubilo” (Sf 3.17).

Conclusão:

O livro de Sofonias não termina com um lamento, mas com um louvor: “Naquele tempo, eu vos farei voltar e vos recolherei; certamente, farei de vós um nome e um louvor entre todos os povos da terra, quando eu vos mudar a sorte diante dos vossos olhos, diz o Senhor” (Sf 3.20). E isto de fato se deu. Mas infelizmente aqueles a quem esta mensagem do profeta Sofonias anunciou, só experimentaram o juízo. A misericórdia e glória só chegariam 70 anos depois. “A misericórdia prevalece sobre o juízo”, mas o juízo é duro. Não precisaríamos passar por ele se nos voltássemos a Deus e quebrantamento e humildade. 

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