terça-feira, 29 de maio de 2018

At 8.9-25 Dentro, mas ainda fora



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Introdução

Vivemos dias de muita movimentação na igreja evangélica brasileira: Shows gospels, igrejas lotadas e grandes eventos evangélicos. A igreja está na mídia, com pastores high-tech, programáticos e carismáticos, e isto dá ensejo para equivocadamente afirmar que o Brasil passa por um avivamento, mas o que acontece no Brasil, infelizmente, não pode ser definido desta forma, pelas menos por quatro razões:

è Avivamentos se caracterizam por um retorno profundo à Palavra de Deus – A Bíblia passa a ocupar o centro da igreja, as doutrinas essenciais do Evangelho são resgatadas, principalmente a doutrina da Justificação pela fé, um desejo mais profundo de conhecer a Palavra acontece na igreja de Cristo.

è Avivamentos são caracterizados por um grande desejo de santidade – Quando o Espírito Santo se manifesta com poder sobre uma determinada região ou nação, as pessoas anseiam por vida pura, se afastam do pecado e sentem tristeza em ferir o coração de Deus, abandonam pecados e vícios, experimentando um novo vigor espiritual.

è Avivamentos passam de uma para outra geração – Afetam consideravelmente as novas gerações, às vezes por séculos. A Reforma Protestante do Séc XVI, é um exemplo disto. Outros movimentos podem ser lembrados: Em 1734, Deus levantou Jonathan Edwards cuja simplicidade de vida e profunda intimidade com Deus, exerceu grande impacto na sua geração e por isto, na Nova Inglaterra (EUA), numa população de 300 mil habitantes, houve cerca de 40 mil conversões num curto espaço de tempo, fortalecimento moral na sociedade e criação de seminários e grandes obras sociais. O mesmo podemos ver no avivamento dos Morávios que se iniciou em 1727, com um profundo derramar do Espírito sobre a igreja e uma reunião de oração que durou ininterruptamente por 100 anos, com 24 horas de oração diária.

è Avivamentos causam profundos impactos sociais - Todo avivamento espiritual atinge de forma maravilhosa a sociedade não-cristã. A igreja é resgatada na conscientização de sua missão, seja evangelística ou social, e a sociedade pagã volta-se para Deus em resposta ao evangelho. O Dr. Héber de Campos afirma: "O reavivamento começa na igreja e termina na comunidade maior onde ela vive. Os efeitos do reavivamento são muito mais perceptíveis nas mudanças morais que acontecem na região ou num país onde ele acontece. Ele não se limita simplesmente aos membros das igrejas atingidas pela obra de Deus. Ele causa impacto em toda a comunidade onde a igreja de Deus está inserida".
Infelizmente igrejas evangélicas brasileiras não tem experimentado este doce e profundo derramar do Espírito e por isto precisamos orar como Habacuque: “Aviva Senhor a tua obra!” Lamentavelmente as igrejas revelam menos compromisso com Jesus e com o Reino, se contentam com um cristianismo nominal, pessoas são batizadas, mas pouco conhecem de Jesus, e seu compromisso espiritual é raso e superficial. É o discipulado barato no qual se referiu Dietrich Bonhoeffer.
O Pr. José Pereira, num tom sarcástico gosta de afirmar que “igreja grande é covil de malandro”, gente sem compromisso com a comunidade, que quer assistir um bom culto, participar de um bonito louvor, ouvir uma boa palavra, estar com pessoas interessantes, mas que não querem compromisso, não querem pagar o preço de seguir a Cristo.

Nos muitos anos de pastorado tenho chegado a umas conclusões interessantes sobre vir ou não às igrejas.

  1. Vir à igreja não diz muita coisa, mas não vir diz muito. Muitas pessoas freqüentam a igreja de forma religiosa e sistemática, mas será que realmente a Palavra de Deus está moldando suas vidas, caráter e ética? É possível frequentar a igreja por anos e não assumir compromisso algum com a fé – nem mesmo batizar. Por outro lado, se uma pessoa começa a se afastar da igreja, substituir as atividades de sua igreja local, desinteressar-se pela adoração, isto aponta para algo sério. A adoração, o culto ao Senhor, visivelmente não tem muita importância na sua história. Por isto, vir a igreja não diz muita coisa, mas não vir diz muito.

  1. Entregar o dízimo não diz muita coisa, mas não entregar, diz muito. Uma pessoa pode trazer seus dízimos, porque aprendeu a fazer isto com os pais, por ter uma motivação de receber benção de Deus, porque acha interessante participar, mas o coração dela pode estar longe, sua alma distante do Senhor. Portanto, entregar, não diz nada. Por outro lado, não entregar, diz tudo. Demonstra como as coisas de Deus são desinteressantes, revela que qualquer sacrifício que Deus exigir, ou reivindicação da Palavra, não é levada a sério. Não dar demonstra que a autoridade da Palavra é irrelevante, que ele não confia nas promessas de provisão de Deus, e não tem qualquer responsabilidade pelo sustento da comunidade que frequenta e da qual faz parte, nem pelo avanço do reino. Não fazer, neste caso – é um fazer altamente revelador e nocivo.

Neste texto de Atos 8, nos deparamos com a história de Simão, o Mago. Um personagem enigmático. Ele anda com a igreja, tem simpatia pela comunidade, se batiza, vê os sinais da graça e do poder de Deus, entretanto, apesar de estar dentro, ainda encontra-se do lado de fora. Ele não é dominado pelas verdades que presencia.
Este texto nos revela algumas coisas:

A. O poder do engano. Toda Samaria, uma vasta região, vivia sob o domínio de uma pessoa, que tinha certo acesso aos poderes espirituais e era temido por todos. Era uma grande região, e todos foram absorvidos pelo temor a este grande vulto espiritualizado. Era um macumbeiro poderoso, feiticeiro com grande poder ilusionista, que mantinha as pessoas impressionadas pelos seus atos extravagantes. As pessoas viviam enganadas por este homem e por seus supostos poderes espirituais.
C.S. Lewis, no seu livro “A cadeira de prata” fala do poder da ilusão da rainha do submundo, que criava a impressão de que as coisas eram diferentes da realidade. Ela invertia os fatos, gerava impressões, criava sensações que enganavam as pessoas. Ainda hoje os poderes das trevas atraem e estão presentes em todas as culturas.

B. O poder do convencimento e da mentira.  Maus produtos podem ser vendidos caros por bons vendedores. Não é esta a ação dos marqueteiros políticos? Naqueles dias as pessoas criam ser verdadeiro o que não era, estavam convencidas e viviam debaixo deste espectro espiritual. Espiritualidade e filosofia falsa tem enorme poder de convencimento, desde que você creia neles. A questão não é se são verdadeiras ou não, mas quanto de poder de convencimento possuem. O apóstolo Paulo fala do mistério da iniqüidade, e que “o aparecimento do iníquo é segundo a eficácia de Satanás, com todo poder, e sinais, e prodígios da mentira” (2 Ts 2.9). O mal e a mentira são muitas vezes demasiadamente convincentes.
Todo o povo de Samaria estava rendido a este homem. A mentira e o engano davam a impressão de que Simão era uma pessoa realmente muito poderosa.
Simão começa a participar da comunidade recém surgida em Samaria, se insere nela sem ser dela, e sua participação tornou-se cada vez mais envolvente, ele convenceu os apóstolos de que tinha se convertido e talvez ele mesmo estivesse convencido de que era, de fato, um discípulo de Cristo. Desde então, circulava com desenvoltura na igreja, sem ser, de fato, uma pessoa convertida.

Quando estamos andando pelas praias do Brasil não é difícil encontrar algumas bandeiras vermelhas, trazendo alertas aos desavisados banhistas. Tais bandeiras servem de orientação, é uma forma de alertar sobre os riscos que a pessoa assume caso não considere tais sinais. assim acontece na vida cristã. A vida de Simão serve de alerta. A sua vida mostra sinais que revelam a sua falsa de relação com a fé cristã, e que também se aplicam à nossa vida ainda hoje. Quais são estes sinais?

1.     Simão interessa-se pouco por Deus e muito por prestígio pessoal: Suas motivações não eram corretas.

Havia um poder real naquela comunidade, não artificial, não fruto de ilusionismo, que o atraia, este era o poder do Espírito Santo, mas ele ainda estava preso por laços de iniqüidade e não conseguia romper com as estruturas do pecado que o mantinham escravizado. Ele saiu das trevas, mas as trevas não saíram dele. Ele estava altamente motivado por uma das coisas mais perigosas que existe: O poder. Seja ele de que natureza for: politico, financeiro, ou espiritual. Este ultimo, de longe, é o mais perigoso.

Certa vez um grupo saiu da igreja que pastoreava em Boston, liderado por uma mulher extremamente mística da comunidade. Ela me procurou para explicar porque estava saindo: “Eu amo esta igreja, nunca encontrei uma comunidade tão amorosa na minha vida cristã, mas estou procurando uma igreja de poder”. Naquela ocasião eu tentei argumentar, em vão, que o amor era o caminho sobremodo excelente (1 Co 13.1), mas ela estava interessada no poder. Adverti que o poder é a coisa mais corruptível da alma humana. Em vão, ela queria poder. Nos dias em que estive em Boston, aquela comunidade para a qual ela se dirigiu, se dividiu três vezes. Duas delas por adultério dos pastores, entre os quais, um dos pastores, já divorciado, tentou seduzir sua própria enteada, já que sua esposa tinha uma filha adolescente de um casamento anterior.

Para avaliar a legitimidade de nossa espiritualidade devemos sempre indagar, numa corajosa auto análise, sobre os motivos da fé. Pergunte a si mesmo: “Tenho interesse pelas coisas de Deus? As coisas de Deus atraem meu coração?” Precisamos orar como Davi: “Cria em mim oh Deus, um coração puro, e renova dentro de mim um espirito inabalável

2.     Simão tem interesse pelo poder de Deus mas não pelo Deus do poder - Não existe nada mais perigoso e inescrupuloso que “poder” nas mãos de quem não sabe lidar com ele.

A raça humana é “power-centered”. Por isto o pecado sempre nos atrai para as propostas de Lúcifer. “Tudo isto te darei se prostrado me adorares”. A Bíblia afirma que Satanás se levantará nos últimos dias com muitos sinais de poder (Ap 13.13-15). O poder de Deus restaura, mas o de Satanás destrói. Devemos nos preocupar com a obsessão pelo status, reconhecimento e poder, que existem em nosso coração, sem indagarmos qual é a fonte de tal poder. Simão era chamado de “grande poder”. Sua relação com a feitiçaria o levava a impressionar as pessoas. João de Deus (Abadiânia), é também respeitado pelos seus sinais, e muitos deles autênticos. Isto não significa que sua fonte seja de Deus.

Quando Simão aderiu aos discípulos, ele viu que o que estava acontecendo era um poder maior  que o seu, e ele queria agora esta nova fonte de poder, mas seus motivos não eram puros. Ele ainda estava fascinado pelo poder. Ele queria um poder maior. Ele ansiava o poder pelo poder, ou para ser ainda mais admirado.
Seu interesse não era por Deus, mas pelo poder, assim como muitos estão sendo atraídos às coisas de Deus não por causa de Deus, mas pelas bençãos de Deus. Podemos desejar o poder de Deus sem nos interessarmos pelo Deus de poder. Podemos ansiar pelas bençãos de Deus sem desejarmos o Deus da benção.

3.     Simão estava tão acostumado a iludir, que tornou-se incapaz de perceber o Sagrado nos milagres que via:  Tudo para ele era business, técnica, método. A isto a Bíblia dá o nome de feitiçaria, uma das obras da carne (Gl 5.20). São pessoas que buscam meios de instrumentalizar e dominar o mundo espiritual através de rituais e artes mágicas.

Ricardo Barbosa fala de um homem que começou a freqüentar sua comunidade em Brasília, e que tinha muito prestigio financeiro, mas era autoritário, arrogante e insensível. Certo dia ele disse que estava buscando poder, e o Ricardo lhe perguntou para que ele queria este poder. Para continuar sendo autoritário e transformar Deus em seu aliado para mandar e dominar ainda mais? Não é muito difícil encontrar poder maligno travestido de espiritualidade cristã.

4.     Simão convive com o povo de Deus, mas nunca penetra na dimensão do Evangelho - Um líder de renomada instituição na América resolveu se aposentar, reuniu seu staff e apontou seu filho como seu sucessor no ministério, pedindo que orassem transferindo sua unção para ele. Um membro do staff ao ser indagado se isto de fato aconteceu, respondeu: “Que a unção saiu é fato, mas para onde ela foi ninguém sabe”.

Reino de Deus não é técnica, alguns se acostumaram a determinados jargões, cacoetes, e palavras mágicas que são bem recebidas no meio da comunidade crédula e impressionável. Paulo fala de pregadores que eram “mais amigos dos prazeres que de Deus, tendo forma de piedade, negando-lhes, entretanto, o poder. Foge também destes”(2 Tm 3.4,5). Não é interessante a advertência para que Timóteo fugisse de pessoas assim? Por que era importante esta advertência, senão porque tais movimentos são atraentes e geram atração em nossos corações incrédulos ansiosos por sinais e maravilhas? Como podemos ser atraídos às manifestações exteriores de poder e sinais...

5.     Simão participa da Igreja, mas seu coração nunca deixou as velhas motivações para trás - Onde estava sua motivação? “Observando extasiado os sinais” (At 8.13). 

Simão, o mágico ainda estava irresistivelmente atraído ao mágico.
Tinha especial interesse pelas manifestações, os sinais o deixavam impressionado, e diante disto faz uma oferta aos apóstolos para receber tais poderes.
Pedro o corrige severamente:
O teu dinheiro seja contigo para perdição, pois julgaste adquirir, por meio dele, o dom de Deus. Não tens parte nem sorte neste ministério, porque o teu coração não é reto diante de Deus. Arrepende-te, pois da tua maldade e roga ao Senhor; talvez te seja perdoado o intento do coração, pois vejo que estás em fel de amargura e laco de iniquidade” (At 8.20-23).

Como se voltar verdadeiramente para Deus?
Este texto é um desafio para todos nós, que andamos no meio do povo de Deus, vemos a graça de Deus se manifestando entre nós, que podemos nos perder naquilo que é essencial. Este texto nos ensina algumas verdades essenciais.

a)     Não simular conversão. Não dá para brincar com coisas espirituais. Precisamos de trazer o  coração diariamente diante de Deus, em sincera oração, com desejo de sermos transformados.

O que assusta nesta história é:
Simão muda externamente suas atitudes.  Anda com gente diferente, frequenta novos ambientes, vai para a igreja, cria hábitos diferentes, caminha com os apóstolos Pedro e João, age de forma diferente, mas não é diferente.
Ele dá impressão de conversão, já que “acompanhava a Filipe de perto” (At 8.13), literalmente ele “atendia constantemente”. Não era desligado das atividades da igreja. “O próprio Simão abraçou a fé, tendo sido batizado”(At 8.13). Torna sua ligação oficial com a igreja. Assume compromissos. A igreja é incapaz de perceber que nada interior tinha acontecido. Seu coração era ainda o mesmo, nenhum toque real de Deus. Filipe, que era o pastor não teve esta percepção, nem João e Pedro quando chegaram a Samaria, talvez estivessem até muito animados por saber que alguém tão influente havia se convertido a Cristo.

b)     Não assumir compromissos irresponsáveis – Simão se batizou, declarou sua fé, sem entender exatamente o que estava acontecendo.

Ele se batizou sem entender o custo e o significado de ser um discípulo de Cristo. Ele batizou sem a compreensão e seriedade necessário aliada ao rito. Batismo é sinal da ruptura com o passado e do ingresso na vida cristã. Batismo é um sacramento, “sinal visível de uma graça invisível”. Aquele que batiza precisa reconhecer seus pecados, saber que em Jesus morreu o antigo modo de viver e foi ressuscitado para uma nova vida, saber que foi perdoado, agraciado, revestido do Espírito Santo. Batismo deve ser algo cheio de temor, deve arrancar lágrimas e emoções na alma.

c)     Não se perder em sinais externos – “Simão acompanhava a Filipe de Perto, observando extasiado os sinais e grandes milagres praticados” (At 8.13).

Os sinais evangélicos não são simulações nem engodo. Os sinais da Bíblia são indicadores, apontam para algo, para a autoridade da mensagem, para o poder de Jesus, mas não são o alvo em si. Nosso foco  é Cristo: “Estes sinais foram feitos para que creiais no Filho de Deus” (Jo 20.30). Há pessoas que se perdem nos sinais. Precisamos entender que eles são importantes, necessários, mas não o alvo último da fé cristã. Falsos profetas, espíritos demoníacos, falsos obreiros e Lúcifer fazem sinais. Aderir aos sinais de Deus não é, necessariamente uma adesão ao Deus dos sinais. Jesus já alertava aqueles que o seguiam, não por causa da Palavra, mas dos sinais: motivação errada.
"E do modo porque Moisés levantou a serpente no deserto, assim importa que o Filho do Homem seja levantado, para que todo aquele que nele crê, não pereça, mas tenha a vida eterna" (Jo 3.14-15). 

d)     Entender o sentido real da fé cristã: Simão se perdeu nos sinais. Ficou encantado com os milagres, mas não estava entendendo o maior de todos milagres. Que Cristo Jesus morreu pelos seus pecados.

O grande sinal é a obra de Cristo na cruz  (Jo 3.14-15). Simão se perdeu no meio do caminho, extasiado com os sinais, quando deveria estar extasiado com o perdão dos seus pecados. Por isto desejou adquirir o dom de Deus com dinheiro. Ele queria usar o poder como instrumento de auto-promoção.
O sentido real da fé cristã não é encontrado na adesão à igreja, como fez, nem ser batizado ritualisticamente, nem alcançar o poder, como desejou Simão.  Você não é convertido enquanto não recebe o Espírito Santo. Pode estar ligado à Igreja, andar próximo ao pastor, ser batizado, mas se não receber o dom do Espírito, não há vida. Tem que nascer de novo.

ü  Simão concordou intelectualmente com o discipulado - “Abraçou a fé” (At 8.13). Admitiu determinadas realidades cristãs, sem se converter de fato.

ü  Simão cumpriu um programa de discipulado. “Seguia a Filipe de perto” – (At 8.13). Que discipulado fabuloso, aos pés de Filipe, um homem cheio do Espírito Santo!  Não perdia um culto, participava dos programas de evangelização, estava próximo ao pastor.

ü  Simão percebeu fatos espirituais- Observou os sinais, andou perto dos acontecimentos, mas aquilo não foi capaz de torná-lo um homem consciente do que era vida cristã

e)     Desenvolver genuíno temor a Deus – (At 8.22-24). A exortação de Filipe é direta:  “arrepende-te”. Mude sua mente!

Conversão é antes de tudo uma mudança na forma de pensar, na visão das coisas de Deus, nas atitudes e na ética. Conversão é algo de dentro para fora, tem a ver com mudança de nossa mente e de valores.
O temor a Deus é essencial.
Brennan Manning afirma que foi visitar um velho sacerdote que lhe disse: “Nunca pedi riqueza, projeção, status, posição, aplausos, mas sempre orei a Deus para que eu jamais perdesse a capacidade de assombro”.
Em Atos lemos que na comunidade primitiva, em cada alma havia “temor”. Uma tradução mais antiga fala de “espanto”. A NIV (versão inglesa), afirma que em cada alma havia “awé”, uma interjeição que deve ser lida como “oh”. As pessoas percebiam que estavam diante do Sagrado, e esta espiritualidade contagiante os envolvia nos cultos, nos louvores, na celebração diária da vida.

Conclusão:

O tema que dei a este sermão foi: “Dentro, mas ainda do lado de fora”.

O tema de um sermão é certamente, uma das últimas coisas que brotam.

Simão estava dentro da igreja, conhecia o linguajar dos crentes, participava da vida comunitária, viu os sinais, mas ainda estava do lado de fora.

Pedro e João o exortam a se “arrependerem”. Quando estamos nesta condição, só existe uma forma de quebrar este “fel de amargura e laço de iniqüidade”. Precisamos entender que nossa situação é desesperadora, e a não ser que Deus tenha misericórdia de nós, ainda estamos perdidos em nosso engano e pecado. Arrependimento significa que entendemos a necessidade de mudar a trajetória da vida, o jeito com que temos agido e ir na direção de Deus.

Para Simão, o arrependimento era a última e única chance.

E para nós?


Rev. Samuel Vieira- 14.06.97
Refeito. Maio 2018

quinta-feira, 24 de maio de 2018

Rm 1 Cuidado! Antes de Ler a Carta aos Romanos



Introdução 

Se você deseja estudar a Carta de Paulo aos Romanos, é bom se prevenir. Mais do que qualquer outro texto das Escrituras Sagradas, seu conteúdo transformou a vida de muitos homens na história da igreja, trazendo grande impacto e profunda transformação nas gerações seguintes.
Se você deseja continuar, faça-o! Mas lembre-se, seu conteúdo é “perigosamente maravilhoso!”
Muitos líderes da igreja influentes, em diferentes séculos, dão testemunho do impacto produzido pela Epístola aos Romanos em suas vidas, tendo sido ela, em diversos casos, o instrumento para sua conversão.

Agostinho de Hipona (354-430)

No verão do ano 386, Santo Agostinho, então professor de retórica em Milão, ainda não convertido, Ali adquiriu o costume de ouvir, as pregações do Bispo Ambrósio. A mensagem atingia cada vez mais o seu coração. Começou a  apreciar a Bíblia e a entender que todo o Antigo Testamento é um caminho rumo a Jesus Cristo. Começou, então, a ler a Bíblia e sobretudo as Cartas de São Paulo e narra que, no tormento das suas reflexões, tendo-se retirado num jardim, ouviu uma voz infantil repetindo uma cantiga que nunca tinha ouvido: tolle, lege, tolle, lege, "toma e lê, toma e lê" (Confissões VIII, 12).
Ao tomar o manuscrito que estava ao lado do amigo, seus olhos caíram nestas palavras de Paulo: “A noite é passada, e o dia é chegado. Rejeitemos, pois, as obras das trevas, e vistamo-nos das armas da luz. Andemos honestamente, como de dia; não em glutonarias, nem em bebedeiras, nem em desonestidades, nem em dissoluções, nem em contendas e inveja. Mas revesti-vos do Senhor Jesus Cristo, e não tenhais cuidado da carne em suas concupiscências” (Rm 13.13,14).
Entendeu que esta palavra se dirigia a ele, e assim ele registra:

“Não li mais nada, e não precisei de coisa alguma. Instantaneamente, ao terminar a sentença uma clara luz inundou meu coração e todas as trevas da dúvida se desvaneceram” (Confissões VIII.29). Sentiu assim dissipar-se as trevas da dúvida e encontrou-se enfim livre para se doar totalmente a Cristo: "Tinhas convertido a ti o meu ser" (Confissões, VIII, 12).


Martinho Lutero (1483-1546)

Em Novembro de 1515, este monge agostiniano e professor de teologia, começou a expor a Epístola de Paulo aos romanos aos seus alunos, até setembro de 1516. Conforme preparava as lições, apreciava cada vez mais a doutrina da justificação pela fé: “Ansiava muito por compreender a Epístola de Paulo aos Romanos, e nada me impedia o caminho, senão a expressão: ‘a justiça de Deus’, por que a entendia como se referindo àquela justiça pela qual Deus é justo e age com justiça quando pune os injustos... Noite e dia refleti até que... captei a verdade de que a justiça de Deus é aquela justiça pela qual, mediante a graça e a pura misericórdia, Ele nos justifica pela fé. Daí por diante, senti-me renascer e atravessar os portais abertos do paraíso. Toda a Escritura ganhou novo significado e, ao passo que antes ‘a justiça de Deus’ me enchia de ódio, agora se me tornava indizivelmente bela e me enchia de maior amor. Esta passagem veio a ser para mim uma porta para o céu.” (Luther’s Work, edição de Weimar, vol. 54)

Esta Epístola é o mais importante documento do Novo Testamento, o evangelho na sua expressão mais pura”. Aos olhos de numerosos historiadores, o comentário à Epístola aos Romanos por Lutero, em 1516, foi o verdadeiro ponto de partida da Reforma. O momento decisivo na vida de Lutero foi a descoberta que a justiça de Deus, não como julgamento e exigências, mas dada por Deus através de sua graça. A justiça de Deus revelada em Cristo. As consequências desta nova compreensão tiveram grande repercussão na história.

Philip Melanchthon (1497-1560).

Foi um dos maiores colaboradores de Lutero e redigiu a “Confissão de Augsburgo” (1530). Em 1521 concluiu sua famosa obra Loci Communes (“Tópicos comuns” da Teologia), que é de fato uma explicação da Epístola aos Romanos que na sua visão fornecia o sumário da doutrina cristã. A dogmática luterana primitiva confundiu-se, na realidade, com uma dogmática da Epístola aos Romanos. Melanchton converteu-se no principal líder do luteranismo após a morte de Lutero e é considerado o primeiro sistemático da Reforma.

William Tyndale (1484-1536)

Este pastor protestante e acadêmico inglês, mestre em Artes na Universidade de Oxford foi profundamente influenciado pela carta de Paulo ao Romanos. Traduziu a Bíblia para uma versão inicial do moderno inglês. Seu objetivo era fazer o Novo Testamento um livro tal que "todo menino de arado" pudesse lê-lo e se tornasse mais conhecedor das Escrituras que o próprio clero. Apesar de numerosas traduções para inglês, parciais ou completas, terem sido feitas a partir do século VII, a Bíblia de Tyndale foi a primeira a beneficiar da imprensa, o que permitiu uma ampla distribuição.
Tyndale estudou as escrituras e começou a defender as teses da Reforma Protestante, muitas das quais eram consideradas heréticas, primeiro pela Igreja Católica que o perseguira e depois pela Igreja Anglicana. As traduções de Tyndale foram banidas pelas autoridades e o próprio Tyndale foi queimado na fogueira em 1536 em Vilvoorde (10Km a nordeste de Bruxelas), na atual Bélgica, sob a instigação de agentes de Henrique VIII e a Igreja Anglicana. Suas últimas palavras foram, "Senhor, abre os olhos ao rei da Inglaterra", o que de fato aconteceu anos depois.
Ele fez a seguinte declaração sobre Romanos:

“Visto que esta epístola é a principal e a mais excelente parte do Novo Testamento, e o mais puro Euangelion, quer dizer, boas novas e aquilo que chamamos de Evangelho, como também luz e caminho, que penetra o conjunto da Escritura, creio que convém que todo cristão não somente a conheça de cor, mas também se exercite nela sempre e sem cessar, como se fosse o pão cotidiano da alma. Na verdade, ninguém pode lê-la demasiadas vezes nem estudá-la suficientemente bem. Sim, pois, quanto mais é estudada, mais fácil fica; quanto mais é meditada, mais agradável se torna, e quanto mais profundamente é pesquisada, mais coisas preciosas se encontram nela, tão grande é o tesouro de bens espirituais que nela jaz oculto”.

João Calvino (1509-1564)

Teólogo francês, influenciou profundamente a Reforma Protestante. Foi inicialmente um humanista, e depois do seu afastamento da Igreja Católica, começou a ser visto, como uma das vozes mais influentes do movimento protestante. Vítima das perseguições aos huguenotes na França, fugiu para Genebra em 1536, onde faleceu em 1564. Genebra tornou-se definitivamente num centro do protestantismo europeu e João Calvino permanece até hoje uma figura central da história da cidade e da Suíça. Para muitos historiadores, ele foi para o povo de língua francesa aquilo que Lutero foi para o povo de língua alemã.
Calvino também foi profundamente influenciado pela Carta de Paulo aos Romanos, em 1539 escreveu:

“Se... conseguirmos atingir uma genuína compreensão desta Epístola, teremos aberto uma amplissíssima porta de acesso aos mais profundos tesouros das Escrituras”.

Foi explicando a Epístola aos Romanos, seu primeiro comentário bíblico (publicado somente em 1540), que Calvino preparou a segunda edição das Institutas da religião cristã (1539), formulando as principais teses da doutrina calvinista”.

John Wesley (1703-1791)

O coração de Wesley foi tomado por um fogo ao ouvir um estudo sobre a Carta aos Romanos. No dia 24 Maio de 1738, Wesley visitou a sociedade moraviana perto da Rua Aldersgate.  Ali experimentou a sua conversão, que ele descreveu no seu diário:

“Ao entardecer eu fui sem grande vontade a uma sociedade na Rua de Aldersgate, onde alguém estava a ler o prefácio de Lutero à Epístola aos Romanos. Cerca de um quarto para as nove, enquanto ele estava a descrever a mudança que Deus opera no coração através da fé em Cristo, eu senti o meu coração estranhamente aquecido. Eu senti que confiava em Cristo, somente em Cristo para a salvação; e uma certeza foi-me dada que Ele havia retirado os meus pecados, mesmo os meus, e me havia salva da lei do pecado e da morte.” (Works [1872], vol. 1)

Este momento crítico da vida de João Wesley, para muitos historiadores, foi o acontecimento que mais que todos os outros, deu início ao Avivamento Evangélico do Século XVIII.

Karl Barth – (1886-1968)

Teólogo reformado suíço considerado por alguns como o maior teólogo protestante do século 20. Sua influência expandiu-se muito além do domínio acadêmico, chegando a incorporar a cultura,  o que levou a Barth ser apresentado na capa da revista TIME em 20 de abril de 1962.
Barth rejeitou sua formação na teologia liberal predominante típica do protestantismo europeu do século XIX, bem como as tendências mais conservadoras do cristianismo, assumindo  teologia dialética chamada posteriormente de neo-ortodoxia - um termo que rejeitou enfaticamente.
Barth enfatizou a soberania de Deus, particularmente através da reinterpretação da doutrina calvinista das eleições, do pecado da humanidade e da "distinção qualitativa infinita entre Deus e a humanidade". Suas obras mais famosas são a sua Epístola aos Romanos, que marcou um recorte claro de seu pensamento anterior, e seu enorme trabalho de treze volumes, a Igreja Dogmática, uma das maiores obras de teologia sistemática já escritas. O Papa Pio XII disse que Karl Barth foi “o melhor teólogo desde Tomás de Aquino”.
Em Agosto de 1918, publicou sua exposição da Epístola aos Romanos, e logo no prefácio escreveu:

“O leitor perceberá por si mesmo que este comentário foi escrito comum jubiloso sentimento de descoberta. A poderosa voz de Paulo era nova para mim e se o era para mim, certamente o será para muitos. Entretanto, agora que terminei minha obra, vejo que resta muita coisa que ainda ouvi”.

Alguém teceu a seguinte comentário: “Sua análise caiu como uma granada no pátio de recreio dos teólogos”.

Charles E. B. Cranfield (1915-2015)

Considerados um dos maiores professores de NT em todo mundo, serviu como Capelão do exército na Segunda Guerra Mundial, como pastor para prisioneiros de guerra antes de ensinar por 30 anos como professor emérito de teologia da Universidade de Durham, no Reino Unido.
É autor do famoso Comentário de Romanos “A Critical and Exegetical Commentary on the Epistle to the Romans”, e “On Romans and Other New Testament Essayscujos dois volumes integram a impressionante série mundialmente conhecida como International Critical Commentary (Icc, com 52 volumes), da qual é um dos editores.
Em 1985 fez a seguinte declaração:

“Tendo-me empenhado muito seriamente com a epístola aos Romanos durante mais de um quarto de século, ainda a encontro sempre nova e não posso lê-la sem prazer. Minha mais séria esperança é que cada vez mais pessoas se comprometam seriamente com ela, e, ouvindo o que ela tem a dizer, encontrem no Deus fiel, compassivo e Todo-Poderoso, como que ela se preocupa, alegria e esperança, bem como força até nestes sombrios, ameaçadores e – para muitos – dias carregados de angustia, através dos quais temos que viver”.


John R. W. Stott (1921-2011)

Pastor e teólogo anglicano britânico, conhecido como um dos grandes nomes mundiais evangélicos. Foi um dos principais autores do pacto de Lausanne, em 1974. Em 2005, a revista Time o colocou entre as 100 pessoas mais influentes do mundo.
Durante muitos anos foi reitor da Igreja anglicana de All Souls, em Londres. Em  1994 escreveu um dos seus grandes trabalhos acadêmicos que foi o comentário da  Carta de Paulo aos Romanos. Ele afirma o seguinte sobre esta carta: “Ela é a mais completa, a mais pura e a mais grandiosa declaração do evangelho encontrada no Novo Testamento”.

Conclusão:
F. F. Bruce afirmou:

“Não é possível predizer o que pode acontecer quando as pessoas começam a estudar a Epístola aos Romanos. O que sucedeu com Agostinho, Lutero, Wesley e Barth acionou grandes movimentos espirituais que deixaram sua marca na história do mundo. Mas coisas parecidas com essas aconteceram muito mais vezes com pessoas bem comuns, quando as palavras desta epístola penetraram nelas com poder. Assim, aqueles que a lerem até esse ponto, estejam preparados para as consequências de prosseguirem na leitura. O leitor está avisado!”

Do ponto de vista doutrinário, é uma das mais ricas e a mais notavelmente estruturada. Calvino afirma “Esta epístola toda inteira é disposta metodicamente...  entre as muitas e notáveis virtudes, a epístola possui uma em particular, a qual nunca é suficientemente apreciada, a saber: se porventura conseguirmos atingir a genuína compreensão desta epístola, teremos aberto uma amplíssima porta de acesso aos mais profundos tesouros da escritura”.

Historicamente nenhuma carta exerceu igual influência; um teólogo protestante chegou a dizer que a história da Igreja se confundia com a da interpretação desta epístola. Não há como negar que este texto sempre ocupou um lugar privilegiado na história da exegese.

Sua interpretação desempenhou papel decisivo na vida destes grandes homens, conforme descrevemos acima, e particularmente em dois momentos cruciais da história da Igreja: No século V, quando Pelágio criou uma das grandes controvérsias sobre a gratuidade da salvação e no século XVI, quando se redescobriu a doutrina da Justificação pela graça.

O estudo desta carta é vital para a saúde teológica da igreja de Cristo. Todos os reformadores da igreja viam Romanos como sendo a chave divina para o entendimento de toda a Escritura.
Então, caso você decida estudar esta carta, esteja alerta, como nos adverte F. F. Bruce.