quinta-feira, 22 de outubro de 2020

A Conspiração dos Ipês



 

O ipê é uma das árvores mais fascinantes que existe. Para quem mora no Centro Oeste do Brasil, ela se transforma em um símbolo de esperança. É conhecida por sua beleza e exuberância das folhas, que, quando caem, são gradualmente substituídas por cachos de flores de formato afunilado e cores intensas. 

Uma das características marcantes dos ipês é que gostam de calor e sol. Suas flores têm forma de funil e têm cores variadas: amarelo, roxo, roso, branco e até verde. Eles florescem entre junho e novembro e não duram muito. Caem no decorrer de uma semana, cobrindo o chão com sua cor, mas a beleza revelada neste curto espaço de tempo é suficiente para encantar a todos. 

As flores do ipê parecem conspirar contra a secura do cerrado. Curiosamente, elas escolhem mostrar-se em toda a sua exuberância exatamente na época mais feia do ano, no meio da seca que normalmente dura entre três e quatro meses. Quando tudo está sem verdor, quando a natureza se sente ameaçada pelas queimadas, nestas horas, de forma mágica, o ipê mostra a sua estonteante coloração para surpresa e admiração de todos os amantes da natureza. 

O ipê parece falar de pessoas que se recusam a reconhecer o calor e não deixam que a temperatura e as condições externas determinem suas vidas. Conheço pessoas assim! Parece que quanto mais são ameaçadas, quanto mais quente o solo, mais desabrocham para uma intensidade artística e de vida. 

Uma das mulheres cuja biografia me impressionou foi Cora Coralina. Seu pai não queria que ela estudasse, pois isso não era coisa de mulheres. Ela não apenas aprendeu a ler e a escrever, como aprendeu a fazer maravilhosas poesias. Decidiu casar cedo para fugir de casa e encontrou um marido igualmente severo no trato, que a proibia de escrever. Certa vez, ele chegou a rasgar um caderno de poesias, que se perdeu na história.

Proibida de escrever, decidiu fazer um jardim em casae toda sua arte foi deslocada para as suas flores. Fizeram um concurso na cidade de Goiás para escolher o jardim mais bonito e ela foi vencedora. Sabendo disso, seu marido disse que ela queria aparecer e então cortou todas as suas plantas. Aos 64 anos, viúva, finalmente pode dar ao mundo a sua riqueza literária que não poderia se esconder. 

A Bíblia fala daqueles que “ao passar pelo vale árido, faz dele um manancial, de bênçãos o cobre a primeira chuva” (Sl 84.6). Homens e mulheres que agem como o ipê recusam-se a permitir que a secura ao redor retire deles a beleza interior, notória no exterior; e por conta disso, brotam esplendorosos, belos e imponentes no meio da seca. É a conspiração do ipê!

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