quinta-feira, 29 de outubro de 2020

Ex 13.17-22 Riscos do caminho mais curto




“Tendo Faraó deixado ir o povo, Deus não o levou pelo caminho da terra dos filisteus,

posto que mais perto, mas disse: Para que, porventura, o povo não se arrependa,

vendo a guerra, e torne ao Egito”  (Ex 13.17).

 

 

 

Introdução 

 

Este texto nos relata que ao sair do Egito, Deus não levou seu povo pelo caminho mais perto, mas os conduziu pelo caminho mais longo. Isto suscita uma questão em nossa mente: Por que Deus nem sempre deseja que passemos pelo caminho mais curto? Parece mais lógico, a logística mais interessante, entretanto, Deus decidiu levar o povo pelo caminho mais longo.

 

Em outras palavras, eles poderiam ter ido pela rota mais utilizada. Ao sair de Goshem (ou Gosen), no Egito, o caminho mais direito era pela rota do Mediterrâneo, por onde os mercadores passavam. Era também o caminho que o exército do Egito tomava quando lutava contra as potências da Assíria que ficavam no Norte. Se fossem por Refidim, o caminho mais curto, mesmo com todos animais, crianças, e idosos, a viagem não duraria mais que seis meses, indo muito devagar. Mercadores podiam fazer este trajeto em 40 dias. Entretanto, Deus os conduziu para o Sul, chegando até o Monte Sinai, que fica entre o Canal de Suez e o Golfo de Acabã. A viagem, como sabemos, durou 40 anos...

 

Por que Deus não deixou seu povo ir pelo caminho mais curto? 

A mesma pergunta podemos fazer ainda hoje: Por que Deus muitas vezes, nos leva não pelo caminho mais simples e curto, mas nos leva a fazer longos percursos, na penosa rota do deserto?

 

Este texto nos aponta para três motivos:

 

1.     Deus os leva por caminhos mais longos, para que não caíssem em armadilhas. O que o povo enfrentaria, se fosse pelo caminho mais curto?

 

O texto sagrado afirma: “Tendo Faraó deixado ir o povo, Deus não o levou pelo caminho da terra dos filisteus, posto que mais perto...”

 

Era mais perto, mas teriam que enfrentar os filisteus.

Os filisteus habitavam ao Sul de Israel, exatamente no ponto em que deveriam atravessar. Como sabemos pelas Escrituras, passar pelos moabitas já foi um grande desafio (os moabitas não permitiram que eles atravessassem suas terras e Deus não permitiu que seu povo lutasse contra eles porque eram descendentes de Esaú), imagine então, enfrentar com crianças e animais, os filisteus, povo acostumado com guerrilha, saques e invasões? 

 

Muitas vezes caminhos curtos se transformam em cruéis armadilhas. Existe um blog preparado para caminhoneiros, que os orienta na escolha da rota que devem pegar. Uma das coisas que eles aconselham é que os caminhoneiros planejem a viagem com antecedência, mesmo quando a rota já é conhecida. Eles afirmam o seguinte: “O ideal é ir além e pensar no trajeto que será percorrido e a qualidade das vias que serão utilizadas, vale sempre lembrar que nem sempre o melhor caminho é o mais conhecido ou o mais confortável. Usar uma rota diferenciada pode ser sinônimo de evitar estradas muito afeitadas por ações de criminosos e diminuição de desvios”. 

 

Deus não levou o povo pelo caminho dos filisteus, posto que mais curto. Existe muito atalho na vida que nos leva para as mãos do inimigo. O caminho mais curto pode comprometer a saúde física, a integridade pessoal e a consciência. 

 

Esaú é um bom exemplo de como o caminho mais curto pode ser um desastre. Ele era um rapaz despreocupado com as coisas espirituais apesar de ter nascido num lar cristão. Um dia chega de viagem, cansado, faminto, vê seu irmão preparando sopa de lentilhas. Ele só tem um pensamento: mitigar sua fome. E nesta hora, Jacó ardilosamente diz: “Se você me der o seu direito de primogenitura, eu te dou a comida”. Ele respondeu: “de que me vale o direito de primogenitura se estou aqui morrendo de fome”, e assim, ele desprezou a sua honra e os direitos que possuía.

 

Esta é a tentação do imediato, de atender a satisfação imediata dos desejos. Esaú está com fome, possui necessidades não satisfeitas, tem necessidades físicas. Jacó está com o prato pronto, um cozinhado de lentilha. Isto é sopa no mel. Jacó consegue fazê-lo jurar: Uma decisão que vai durar a vida inteira e Esaú, levianamente, não titubeia, esquece-se que opções erradas trazem implicações para toda vida.

 

Somos uma geração ansiosa por resultados imediatos. Queremos vitória sem esforço, queremos privilégios sem responsabilidade, vivemos no ápice da geração “fast-food”, geração micro-wave. Tudo tem que ser resolvido e rápido, não temos paciência com processos. Diante de tentações, o importante é satisfazer imediatamente os desejos, pois aprendemos a não esperar.

 

Somos a geração dos desejos imediatos: Queremos a benção sem pagar o preço. Vive-mos a atração irresistível em busca de homens e mulheres ungidos, que possam de uma forma imediata resolver problemas que foram construídos ao longo dos anos de resistência e rebeldia, queremos unção por osmose sem passar pela cruz. Considere as lutas de pessoas realmente santas: Horas de devoção, clamor, jejuns, noites passadas em claro em busca de graça, verdadeiras batalhas de intercessão. Somos uma geração buscando experiências novas e imediatas. 

 

Satanás sempre usa a estratégia do imediatismo e da satisfação imediata dos desejos. Ele usa conosco a mesma abordagem que usou com Jesus: “Se tem fome, coma! Manda que estas pedras se transformem em pães, absolutize seus desejos!

 

No texto que estamos estudando, Deus conduziu seu povo pelo caminho mais longo. Não o deixou seguir pela rota mais curta. Se lermos um pouquinho adiante, entrando no capitulo 14 de Êxodo, veremos algo ainda mais surpreendente: Deus faz o povo retroceder. “Disse o Senhor a Moisés: Fala aos filhos de Israel que retrocedam e se acampem defronte de Pi-Hairote” (Ex 14.1,2). Deus não apenas os leva pelo caminho mais longo, mas ainda os faz retroceder. 

 

Isto nos leva a considerar que Deus não se sente pressionado pelo senso de urgência que temos. Afinal, “quem tem pressa come cru”, como diz o ditado popular.  

 

Na Bíblia vemos como Deus nem sempre anda pelo caminho mais curto para realizar seu plano. Israel viveu 400 anos no Egito, antes de receber a herança da terra prometida. Moisés vive 40 anos no palácio, depois Deus o leva por 40 anos no deserto, e somente depois desta longa jornada é chamado por Deus para liderar o seu povo libertando-o do cativeiro.

 

Deus dá sonho para José quando ele é ainda um adolescente. Mas antes do sonho se cumprir, ele é enviado como escravo para o Egito, é obrigado a viver numa condição sub-humana, experimenta as agruras da escravidão, de não ter sem nome, direitos, família e identidade. Por longos 15 anos, no Egito ele ainda é traído, injustiçado, colocado em masmorras, esquecido, até que o projeto de Deus se cumpre na sua vida.

 

O mesmo se dá com Davi. Deus o unge rei sobre Israel na frente de seus irmãos. Sabe o que acontece depois disto? Ele volta para as mesmas funções que exercia anteriormente: cuidar das ovelhas nos desertos da Judeia. Trabalho irrelevante aparentemente para alguém que será um rei. Depois passa um perido ao lado de Saul, um rei paranóico e doente, atormentado por sentimentos persecutórios e por opressão maligna, obcecado pela ideia de que Davi era contra ele. Davi espera o tempo e os processos de Deus, não tem desejos de atropelar as oportunidades nem tomar atalhos. Aguardou a hora, sem quer pegar atalhos.

 

Então, a primeira razão porque Deus não deixou seu povo ir pelo caminho mais curto? É para que não caíamos em tentações e armadilhas. 

 

2.     Para proteger o seu povo. Esta é a segunda razão que encontramos para que tenhamos que andar um caminho mais longo.

 

““Tendo Faraó deixado ir o povo, Deus não o levou pelo caminho da terra dos filisteus, posto que mais perto...para que, porventura o povo não se arrependa, vendo a guerra, e torne ao Egito” (Ex 13.17).

 

O texto deixa claro o propósito de Deus. Veja a expressão “para que”. Este é o motivo. 

O caminho mais curto pode impedir que os grandes sonhos se cumpram. Existe um princípio em liderança que diz: “Pense grande, comece pequeno”; outro similar a este afirma: “Pense globalmente, aja localmente”. Muitas vezes perdemos a “big Picture”, a grande visão, porque esbarramos nos eventos imediatos. Deixamos de ver a longo prazo e nos assustamos a curto prazo.

 

Por exemplo, estatística simples, Jordan Peterson afirma que cada vez que lemos 600 páginas, acontece um gatilho na mente humano e ele dá um salto em termos de conhecimento. É necessário esforço, “não existe almoço grátis!”

 

Muitas vezes o caminho mais curto é uma grande ameaça. Pessoas que fazem sucesso rapidamente, ou ganham dinheiro rapidamente, ou se tornam famosos, sejam eles atletas, artistas. Como lidar com o poder? A fama?

 

Deus faz o seu povo caminhar um longo caminho, para protegê-los. Para que, porventura o povo não se arrependa, vendo a guerra, e torne ao Egito”(Ex 13.17). Se tivessem que lidar com grandes conflitos imediatamente, enfrentar grandes oposições de cara, eles não estavam preparados para isto, eles eram escravos, recém libertos. Precisam aprender a lidar com armas para obter vitórias. 

 

O mesmo acontece conosco. Deus dá tempo para que haja um amadurecimento para lidar com situações. Então, toda vez que você estiver impaciente com o processo, pergunte a Deus porque ele está interrompendo um projeto que você acha que poderia acontecer agora. Tente ouvir o sussurro de Deus na sua trajetória. Não faça atalhos, não se desespere com o processo. Deus a seu tempo, faz todas as coisas bonitas.

 

3.     Deus faz seu povo caminhar por uma estrada mais longa, mas sempre vai à frente. “O Senhor ia adiante deles, durante o dia, numa coluna de nuvem, para os guiar pelo caminho; durante a noite, numa coluna de fogo, para os alumiar” (Ex 13.21).

 

O texto afirma que Deus ia numa coluna de nuvem, para os proteger do sol do deserto, trazer conforto à viagem, e para guiá-los pelo caminho, e à noite, numa coluna de fogo para os alumiar.  Deus estava com eles todo o tempo, dia e noite. As pessoas olhavam para o céu e sabiam que Deus estava com eles. A viagem demorou, mas Deus nunca se ausentou. Portanto, não fique assustado se o caminho for mais longo, mas se assuste se, ao olhar adiante você não enxergar os sinais de Deus. 

 

O próprio Moisés teve uma experiência muito interessante com Deus. A ira de Deus veio sobre o povo de Israel depois de terem feito um bezerro de ouro para adorar enquanto Moisés estava no monte recebendo as tábuas da lei. Então Deus disse a Moisés que não iria mais com o povo, mas enviaria seu anjo com eles. Veja a resposta de Moisés. 

Disse Moisés ao Senhor: Tu me dizes: Faze subir este povo, porém não me deste saber a quem has de enviar comigo; contudo, disseste: conheço-te pelo teu nome, também achaste graça aos meus olhos... Se a tua presença não vai comigo, não nos faca subir deste lugar” (Ex 33.12-15). Então Deus lhe respondeu, e só então ele teve paz: “Respondeu-lhe: A minha presença irá contigo, e eu te darei descanso” (Ex 33.14).

 

Eu era ainda um jovem pastor, na Igreja Presbiteriana de Brasília, quando recebi o convite para ser pastor da Igreja da Gávea, no Rio. Eu era pastor auxiliar em Brasília, e era muito respeitado pelo Rev. Adail Sandoval e pelo conselho da igreja. Eu estava feliz na igreja, mas de repente este convite da Gávea começou a fazer um enorme sentido na minha vida. Quando eu tenho que tomar uma decisão como esta, eu experimento muita angústia. Não é fácil decidir. Meu organismo se desequilibra, e o que eu mais queria saber nesta hora era o seguinte: “O Senhor quer que eu saia de Brasília? O Senhor está orientando minha decisão para o Rio. Esta é a tua vontade”? Eu não queria saber nada além disto, porque nada realmente era mais importante que discernir a vontade de Deus. Nestes dias de intensa oração e angústia, eu li exatamente este texto. “Se a tua presença não vai comigo, não nos faca subir deste lugar”. Nada mais, realmente importava para mim.

 

A questão não é se o caminho adiante é longo ou curto. Cheio de percalços ou sereno, se tem precipícios ou não. A questão é saber: Deus vai adiante?

 

O Salmo 23 diz: “Ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte, não temerei mal algum, porque tu estás comigo. A tua vara e teu cajado me consolam”. Já pensaram seriamente neste texto? Vale da sombra da morte? Caminho das trevas e de angústias? Estas são rotas difíceis, são tempos de angústias. Entretanto, se o bom pastor vai conosco, ainda que eu ande pelo vale da sombra da morte, não temerei mal algum”. que nos faz andar seguro em tais situações? A presença do bom pastor. Sua vara e seu cajado nos consolam. 

 

Conclusão 

 

Deus sempre usa rotas alternativas, sempre que julgar que elas são necessárias para nossa proteção e direção. 

 

Um dos textos que me chama a atenção é o encontro de Jesus com a mulher samaritana. Quando Jesus saiu da Judeia em direção à Galileia, o texto afirma: “E era-lhe necessário atravessar a província da Samaria” (Jo 4.4). Quando estudamos a geografia da terra santa, observamos que geograficamente era possível fazer uma rota diferente. Não era “necessário” passar por Samaria. Por que então o texto diz que “era necessário?” Por uma razão simples. Deus tinha propósitos ao adentrar este território negligenciado pelos judeus, para se encontrar com uma mulher desorientada e que precisava de salvação. Era necessário não geograficamente, mas era necessário dentro dos propósitos divinos.

 

Jesus preferiu usar uma rota que os judeus quase nunca usavam, para se encontrar com aquela mulher e lhe oferecer a água da vida para sua salvação. 

 

Mas certamente, a rota mais longa que Deus resolveu fazer foi a rota do Calvário. Deus preferiu um longo caminho. Satanás ofereceu um caminho curto. “Tudo isto te darei, se prostrado me adorares”. Satanás oferece a Jesus o caminho mais curto. Da auto glorificação, auto promoção, um caminho que se esquivava da cruz, mas a cruz era necessária. 

 

Nos Evangelhos Jesus tenta comunicar o significado de sua morte na cruz aos seus discípulos, sabe o que Jesus lhes disse: “Desde esse tempo, começou Jesus Cristo a mostrar a seus discípulos, que lhe era necessário seguir para Jerusalém e sofrer muitas coisas dos anciãos, dos principais sacerdotes e dos escribas, ser morto e ressuscitado ao terceiro dia” (Mt 16.21)

 

O que vemos no texto? Era necessário!

A cruz era uma necessidade.

O caminho mais longo era necessário. Este penoso caminho do martírio, da solidão, do abandono de Deus e da morte cruel. O caminho mais longo ele percorreu por nós, ao levar sobre si toda ira de Deus pelos nossos pecados. Ao nos substituir.

 

Como respondemos a isto? Em arrependimento e fé.

O caminho mais longo ele percorreu por nós, para que nossa estrada pudesse nos levar livremente a Deus. 

Um comentário:

  1. Excelente. Já estava sentindo falta destes estudos. Jesus continue te abençoando Pastor

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