Introdução:
Um dos graves problemas da nossa vida é
a ignorância e desconhecimento dos fatos, falta de compreensão de verdades e
princípios. Jesus disse: “Errais, não
conhecendo as Escrituras nem o poder de Deus” (Mt 22.29). Oséias afirma: “O meu povo está sendo destruído porque lhe
falta o conhecimento” (Os 4.6). Mesmo quando “sabemos”, ou temos
determinadas informações sobre a vida ou sobre Deus, ainda assim podemos ser incapazes
de trazer tais informações e aplicá-las à vida. Parece ter sido este o problema
de Jacó ao declarar: “O Senhor está neste
lugar, e eu não o sabia!” (Gn 28.16).
Jacó sai de sua casa numa complexa situação.
As coisas não estavam bem. Depois dos incidentes envolvendo Esaú, a situação se
torna tensa, incluindo ameaças de morte. Seus relacionamentos estavam estremecidos.
Esaú jurando vingança. Tanto Rebeca quanto Isaque se mostram preocupados (Gn
27.42-47). Ele sai de casa furtivamente, sabendo que provavelmente nunca mais
veria seus pais. O texto parece sugerir esta improvisação já que não há
registros de pessoas acompanhando-o, mesmo sabendo que tal viagem era sempre
arriscada.
Segue para o deserto em direção a
Mesopotâmia e no deserto, ao chegar à noite, para num ermo para dormir, e usa
uma pedra como travesseiro. Isto aponta para esta idéia de improvisação. Ali
Jacó tem um sonho, no qual o Senhor estava perto dele e havia uma escada cujo
topo atingia o céu; e os anjos de Deus subiam e desciam sobre ela. Deus
reafirma seu chamado para seu Pai Isaque e avô Abraão e que estaria com ele e o
guardaria por onde andassem e que aquela terra, seria dada á sua geração.
Ao acordar, Jacó faz uma maravilhosa
afirmação: “Na verdade, o Senhor está
neste lugar, e eu não o sabia” (Gn 28.16). Deus estava perto, sua presença
era real, mas Jacó ignorava esta realidade. A visão de Jacó mostra o interesse
de Deus por ele. “A condescendência da graça divina. Jacó não estava de coração
voltado para Deus, e sim Deus para Jacó” (Shedd). Aquele rapaz, vindo de um lar
cristão, com uma ética leniente e superficial, que sai corrido de casa por ter
se envolvido em atitudes pouco recomendáveis, agora faz uma descoberta
maravilhosa. O Senhor estava com ele. É o triunfo da graça! Deus o alcança de
forma inesperada.
Quão facilmente Deus pode estar perto
sem que tenhamos consciência de sua realidade. Deus estava perto de Abraão
quando ele levantou o cutelo para sacrificar seu filho: “Não estendas a mão sobre o rapaz, e nada lhe faças” (Gn 22.12).
Deus estava tão perto, embora provavelmente Abraão não tenha sido capaz de
percebê-lo... Deus estava por perto quando Hagar enfrenta o abandono, a
rejeição e a exclusão e sai desatinada para o deserto, sem rumo certo, tendo
que enfrentar a solidão terrível: “Que
tens Hagar? Não temas, porque Deus ouviu a voz do menino daí onde está” (Gn
21.17) e Hagar percebe que Deus “estava
com o rapaz” (Gn 21.20). Quantas vezes ignoramos a presença de Deus entre
nós, ou não a percebemos.
Num dos filmes da série Nárnia, Lucia
pergunta: “Vou vê-lo novamente?” e Aslam responde: “Eu sempre estarei por
perto, basta estarem atentos, vocês me perceberão”.
Quando Jacó diz: “O Senhor está neste lugar, e eu não o sabia” (Gn 28.16), ele usa
no hebraico o termo Iadá, que significa penetrar. Esta frase, então, poderia ser traduzida da seguinte
forma: “na verdade o Senhor está neste
lugar e eu não o penetrava” (Chouraqui). Não era que Deus estava ausente,
mas a percepção falha de Jacó o impedia de se conectar e se aprofundar nos
mistérios de Deus ao seu redor.
Esta é a nossa angustiante realidade –
Estamos desconectados do Eterno, e não o “penetramos”, nem o percebemos.
Falta-nos a capacidade de aprofundar na sacralidade de um Deus que sempre está
presente. “Invoca-me e te responderei,
anunciar-te-ei coisas grandes e ocultas, que não sabes” (Jr 33.3). Este é um
dos grandes problemas, a dificuldade de perceber Deus na história, no dia a
dia. Você tem percebido Deus em sua história?
A experiência de Jacó traz temor e gera
adoração (Gn 28.17). Ele constrói uma coluna e sobre ela derrama azeite.
Apesar desta grandiosa experiência, a
contraproposta de Jacó e os votos que passa a fazer revelam suas limitações. O
que ele propõe a Deus são grandes equívocos, marcados por condicionantes na
relação que ele julgava que deveria ter com o Senhor.
- Condiciona
sua fidelidade à benção – “Então Jacó fez um voto, dizendo: Se Deus estiver comigo,
cuidar de mim nesta viagem que estou fazendo, prover-me de comida e roupa,
e levar-me de volta em segurança à casa de meu pai, então o Senhor será o
meu Deus” (Gn 28.20-21). Sua atitude é completamente distinta da resposta de Abraão que “partiu sem saber aonde ia” (Hb
11.8).
O Senhor
será meu Deus se me abençoar. Muitos agem assim em relação a Deus. Julgam-se no
direito de estabelecer as condições do discipulado, e estabelecem
condicionantes. “Se Deus fizer isto, então agirei assim...” ou “se isto
acontecer, agirei desta forma”. Este relacionamento com base contratual não
compreende a graça de Deus e se torna um relacionamento no qual o Senhor
torna-se servo. As ofertas deixam de ser uma forma de adoração e louvor e
tornam-se barganha para conseguir de Deus bençãos e favores. No entanto, a
graça de Deus não é meritória, nem funciona à base de troca. O convite da fé é
para a rendição e confiança irrestrita no seu caráter.
- Relaciona
Deus com um local sagrado – Jacó afirma “Quão temível é este lugar! É
a casa de Deus, a porta dos céus" (Gn 28.17). Cerca de 30 anos depois, Jacó repete
este voto solene no mesmo lugar (Gn 35.14), mas Deus deixa claro que ele
queria que Jacó entendesse que ele seria o Deus por todos os lugares que
ele fosse. “Te guardarei onde quer
que fores” (Gn 28.15). Com isto Deus queria desvincular sua fé de um
lugar sagrado. Idéia bem diferente das divindades pagãs que sempre se
associaram a certas localidades.
Por causa de pensamentos que limitam
Deus a determinados símbolos, objetos e locais, existe uma tradição de que a
pedra de Jacó foi depois trazida para Jerusalém, mais tarde para a Espanha,
depois para a Irlanda e finalmente para a Escócia. Os reis da Escócia
costumavam se assentar nesta pedra. Eduardo I a levou para Londres, e a colocou
em Westminster sob o trono no qual os reis da Inglaterra eram coroados (Bíblia
anotada de Dake).
Posteriormente Deus se comunica com
Jacó, e se apresenta como “o Deus da casa de Deus” (Gn 31.13). Não o Deus de um
lugar, mas Deus.
- Condiciona
sua liberalidade no dízimo à prosperidade pessoal – “Se Deus for comigo, e me guardar nesta
jornada que empreendo e me der pão para comer e roupa que me vista (...)
de tudo quanto me concederes, certamente eu te darei o dízimo” (Gn
28.20,22). Sua oferta e liberalidade estavam condicionadas. “Se Deus...me der pão para comer e
roupa...darei o dízimo”.
Ingenuamente
pressupomos que podemos agora ter o controle de Deus. “Seremos... se”. A
verdade, porém, é que Deus não se submete a estes tipos de relacionamentos nos
quais acreditamos que somos credores e determinamos como ele fará. Muitos
acreditam que possuem credenciais para exigir de Deus. Seu dízimo torna-se
moeda de troca e garantia de que Deus agora não vai poder falhar.
Mas na
Bíblia, Deus não falha. Ele é fiel, bondoso, generoso, abundante nas suas
graças porque isto faz parte de sua natureza graciosa. Muitos “sequestram” o
texto de Malaquias 3.10 que fala do dízimo crendo que, fazendo assim, Deus não
vai poder “furar nem falhar” com eles. Na verdade Deus é fiel a ele mesmo,
antes de ser fiel a nós. “Se somos
infiéis, ele permanece fiel, pois de maneira nenhuma pode negar-se a si mesmo” (2
Tm 2.13).
Relacionamentos
meritórios, ou de pessoas que julgam ter “credenciais” para exigir de Deus, são
sempre falsos e anti-bíblicos, porque Deus “não
lançamos as nossas suplicas perante a tua face fiados em nossas justiças, mas
em tuas muitas misericórdias” (Dn 9.18).
Tais atitudes revelam profunda desconfiança sobre quem Deus é, e nos dão
uma falsa ideia de que podemos construir um portfólio de saldos espirituais e
performance religiosa. Esta é a ideia de religiões que se fundamentam na
bondade do homem e não na graça abundante e livre de um Deus misericordioso.
Conclusão:
“Na
verdade, o Senhor está neste lugar, e eu não o sabia” (Gn 28.16).
A
presença de Deus era real, mas Jacó ignorava sua realidade.
Precisamos reconhecer que Deus está
aqui!
Nem sempre estamos conscientes de sua
presença. Muitas vezes ele nos parece um Deus frio, silencioso e distante. Jacó
se surpreendeu quando percebeu quão próximo dele estava o Senhor. “Este lugar é
temível!”. A presença de Deus lhe causa assombro e perplexidade, e o motiva a
adorar, a construir altares, a derramar óleo sobre a pedra.
Talvez nossa atitude diária deveria ser:
“Na verdade, o Senhor está neste lugar, e
eu não sei” Ter consciência da presença de Deus é uma das descobertas mais
fascinantes que o ser humano pode fazer.
Nenhum comentário:
Postar um comentário